Entenda como funcionam os símbolos usados por facções criminosas na Bahia

Advogado criminalista analisa como gestos, emojis e referências da cultura pop se transformam em símbolos usados por facções criminosas na Bahia

Por Da redação.

Os símbolos usados por facções criminosas na Bahia têm se espalhado dos muros de bairros populares para as redes sociais, criando códigos visuais que funcionam como marca de território e instrumento de intimidação.

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Na Pituba, em Salvador, os riscos associados ao uso de uma marca famosa supostamente chamaram a atenção de comerciantes, que teriam relatado ter recebido advertências ao usar roupas com referências ao grupo, como, por exemplo, peças da marca Adidas. Isto porque os acessórios teriam sido adotados pela facção Bonde do Maluco (BDM), enquanto que, na região, o Comando Vermelho controla o tráfico de drogas, com forte influência na região do Nordeste de Amaralina, que fica próxima ao bairro. 

O advogado criminalista Luiz Henrique Requião explica que a adoção de símbolos por facções segue uma lógica semelhante à de grupos históricos e movimentos políticos.

“Facções criminosas se apropriam de elementos da cultura pop, como o gesto ‘tudo 2’ (Comando Vermelho) ou o ‘tudo 3’ (Primeiro Comando da Capital), e os disseminam rapidamente através de redes sociais, clipes de funk e grupos de mensagens. Essa viralização cimenta a nova associação na consciência coletiva de forma muito mais rápida do que em qualquer outro período da história”, observa Requião, ao analisar a questão no âmbito nacional. 

O advogado cita exemplos históricos para ilustrar o fenômeno: a suástica, que era um símbolo de paz, foi corrompida pelo nazismo; a cruz em chamas foi transformada pela Ku Klux Klan em instrumento de terror racial; e o peixe (Ichthys) foi usado pelos primeiros cristãos como um sinal secreto para evitar perseguição.

Símbolos usados por facções criminosas na Bahia

Símbloso usados por facções  na Bahia. Foto: reprodução

Os símbolos funcionam também como um “uniforme” não oficial, reforçando coesão e pertencimento do grupo. Requião explica que, assim como o triângulo rosa foi ressignificado pela comunidade LGBTQIA+ como símbolo de orgulho, gestos, emojis e estilos de fotos se tornam marcadores de identificação entre integrantes de facções, reconhecíveis por aliados e rivais. 

"A internet e os memes criam um senso de comunidade e pertencimento quase instantâneo. Quando um grupo adota um símbolo, como um emoji específico ou um estilo de foto, ele se espalha viralmente. Seus membros passam a usá-lo para se identificar publicamente em perfis de redes sociais, criando um “uniforme digital” que é facilmente reconhecível por aliados e rivais". 

Além de identidade, os símbolos são uma ferramenta de comunicação codificada. Emojis aparentemente inofensivos, como bandeiras vermelhas (🚩), sinais de paz (✌️) e o yin-yang (☯️), são utilizados por facções para marcar território, enviar ordens e intimidar rivais. 

Em Salvador, alguns exemplos são: o número dois, usado pela facção criminosa Comando Vermelho (CV) e o número três, utilizado pelo Bonde do Maluco (BDM). Esses sinais aparecem em fotos ou até pichados nos muros das ruas.

No entanto, outros códigos também são usados pelos criminosos para identificar pessoas do grupo rival. Como por exemplo acessórios ou tatuagens com o personagem Mickey, da Disney, que representa o CV, ou a Adidas, que representa o BDM.

Cuidados

Facções usam símbolos como códigos de identificação / Foto: Redes sociais

O especialista alerta para os riscos do uso desses símbolos por quem não pertence aos grupos. Ele lembra casos em que jovens foram executados por serem confundidos com membros de facções rivais devido a gestos ou postagens nas redes sociais, como por exemplo o trágico assassinato dos irmãos Daniel Natividade, de 24 anos, e Gustavo Natividade, de 15, percussionistas do bloco afro Malê Debalê.

“Em áreas conflagradas, o uso de um símbolo associado a um grupo rival pode colocar uma pessoa em situação de risco extremo, limitando severamente sua liberdade.”, afirma. 

Além do perigo físico, há consequências jurídicas. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já anulou condenações baseadas apenas em reconhecimentos frágeis ligados a símbolos.

Do ponto de vista legal, a legislação brasileira enfrenta desafios. A única exceção criminalizada é a suástica, quando usada para divulgar o nazismo. Para outros símbolos, a lei pune a organização criminosa ou a apologia ao crime, mas não o uso isolado do símbolo.

“A cultura de memes e a comunicação online tornam a aplicação da lei ainda mais complexa. É difícil provar a intenção criminosa por trás do uso de um emoji ou meme, que por natureza são ambíguos e contextuais. As autoridades focam em monitorar essa comunicação para fins de inteligência, mas a criminalização do símbolo em si permanece juridicamente impraticável e perigosa.”, explica Requião.

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