Caruru de São Cosme e Damião: entenda a tradição religiosa que movimenta a Bahia
A tradição mobiliza os baianos a comemorarem o prato feito com quiabo, em homenagem aos santos e divindades da religião católica e do candomblé
Créditos da foto: Foto: Divulgação/ Gov Ba
Salvador e a chegada do mês de setembro já são sinônimo de convites para um Caruru. A tradição mobiliza os baianos a comemorarem o prato feito com quiabo, em homenagem aos santos e divindades da religião católica e do candomblé.
Angela Costa, devota dos erês - espíritos ou entidades associadas à infância na crença iorubá e no candomblé - oferece o caruru há quatro anos, para pagar a promessa que fez às entidades. A primeira vez que comemorou a tradição foi no dia 26 de setembro de 2020.
"Estava recém-separada e, no momento em que precisei, eles (as entidades) me ajudaram. Consegui um emprego e um novo apartamento. Não fico sem fazer o caruru para pagar minha promessa", conta.
Angela segue as tradições do candomblé e conta ainda que, graças aos êres, foi abençoada com o casamento de sua filha. "Ganhei um genro maravilhoso. E minha filha se casou dia 26 de setembro de 2023", acrescenta.
[caption id="attachment_382229" align="alignnone" width="712"] Foto: Arquivo pessoal/ Angela Costa[/caption]
Para os católicos, 26 de setembro é o dia dos santos gêmeos médicos, Cosme e Damião, popularmente conhecidos como padroeiros das crianças, devido às curas feitas na Ásia Menor, atual Egeia na Síria, que foram consideradas "milagrosas".
Já para as religiões afro-brasileiras, como a Umbanda e o Candomblé, o dia dos santos gêmeos, conhecidos como ibejis, é comemorado no dia 27 de setembro, quando o caruru é ofertado primeiramente para as crianças, que representam os erês.
Ibeji é um termo de origem iorubá que se refere a gêmeos ou à divindade associada a eles. Na cultura africana, ibeji é venerado como um orixá que representa a dualidade, a fertilidade e a proteção. Os gêmeos são considerados sagrados e possuem uma forte ligação com a espiritualidade.
CARURU DE SÃO COSME E DAMIÃO - OU DE "SETE MENINOS"
A tradição do caruru de São Cosme e Damião ou de sete meninos, é oferecido primeiramente aos orixás ibejis e aos erês e depois a sete (ou mútiplos de sete) crianças, que representam os irmãos: Cosme, Damião, Doum, Alabá, Crispim, Crispiniano e Talabi.
Também são oferecidos doces, como pé-de-moloque, balas e chicletes. A cerimônia costuma incluir danças, cantos e rezas, além de um ambiente festivo que celebra a alegria e a proteção aos pequenos.
O historiador Rafael Passos explica que Cosme e Damião eram médicos pela tradição católica e que foram perseguidos, torturados e mortos como bruxos durante o império romano, no fim do ano 300.
"O culto desses santos chega ao Brasil entre 1530 e 1540, através dos portugueses, mas com o tempo sofre alterações devido à sua relação com os povos que eram escravizados. O culto a eles então ganha um terceiro membro (Doum, irmão mais novo) e alteração em suas cores de origem (indo para o azul e rosa claro)", acrescenta Rafael.
[caption id="attachment_382253" align="alignnone" width="807"] Arte: Engelis de Oliveira/ Pintura em aquarela e bico de pena sobre papel aquarelável.
Cosme, Damião e Doum. 2019[/caption]
O historiador também explica que, por se tratar de uma tradição de região periférica, existia um encanto e também uma repulsa por parte das pessoas. Ele afirma que essa cultura vem sendo diminuída devido ao avanço dos evangélicos. "Há 10, 15 anos, todo mundo tinha um caruru. Hoje em dia, as pessoas correm atrás de um que mantenha a tradição, em especial fora dos terreiros. Antigamente, diversas famílias mantinham a tradição viva", explica Rafael.
PATRIMÔNIO HISTÓRICO CULTURAL
O caruru, que é ofertado durante todo o mês de setembro e se repete todos os anos, agora é patrimônio imaterial da Bahia. O título do prato, feito com quiabo, camarão seco e muito azeite de dendê, foi aprovado por unanimidade pelo pleno do Conselho Estadual de Cultura (CEC). O registro será publicado no Diário Oficial da Bahia nesta sexta-feira (27 de setembro), dia da celebração.
Para o professor de História da Arte e artes plásticas, Engelis de Oliveira, a festividade une elementos de devoção aos santos gêmeos, com práticas culinárias e rituais que homenageiam orixás, tornando o prato uma verdadeira celebração da diversidade religiosa do país. "Dentro dessa síntese, essa simbiose entre as religiões, tanto europeias quanto africanas, a gente tem essa dimensão sincrética, que foi introduzida na nossa cultura de maneira muito orgânica", explica Engelis.
Ele também afirma que comer o caruru no dia de São Cosme e Damião, que para alguns é dia 26 e para outros 27 de setembro, é um ato não necessariamente religioso, mas cultural.
CARURU EM SALVADOR E REGIÃO METROPOLITANA (RMS)
Para uma tradição se manter viva, é necessário mantê-la ativa. Algumas figuras, como a família de Cira do Acarajé, que pratica a festividade há 85 anos, distribuem todos os anos o prato religioso. Confira alguns locais que irão oferecer caruru em Salvador:
01. Barraca do Chapéu de Couro
Data e Horário: Sexta-feira (27/9) - 12h
Local: Mercado das Sete Portas - Praça 1º de Maio, Box 82, Barbalho, Salvador.
02. Terreiro Ilê Axé Omim Odô
Data e Horário: 12/10 - 17h
Local: Rua Alto do Caji, 5, Quilombo Quingoma de Fora, Lauro de Freitas
03. Terreiro Onzo Kawungemy
Data e Horário: Sexta-feira (27/9)- 17h
Local: Estrada da Liberdade, 554, Liberdade, Salvador
04. Galo de Diumbanda
Data e Horário: Sexta-feira (27/9)- 18h
Local: Comunidade Pela Porco, Sete Portas
05. Clube dos Oficiais da Polícia Militar e Bombeiros
Data e Horário: Sexta-feira (27/9) - 18h30
Local: Av. Dendezeiros, S/N, Bonfim.
LEIA MAIS: Caruru de São Cosme e São Damião é oficializado como Patrimônio Cultural da Bahia
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Angela Costa, devota dos erês - espíritos ou entidades associadas à infância na crença iorubá e no candomblé - oferece o caruru há quatro anos, para pagar a promessa que fez às entidades. A primeira vez que comemorou a tradição foi no dia 26 de setembro de 2020.
"Estava recém-separada e, no momento em que precisei, eles (as entidades) me ajudaram. Consegui um emprego e um novo apartamento. Não fico sem fazer o caruru para pagar minha promessa", conta.
Angela segue as tradições do candomblé e conta ainda que, graças aos êres, foi abençoada com o casamento de sua filha. "Ganhei um genro maravilhoso. E minha filha se casou dia 26 de setembro de 2023", acrescenta.
[caption id="attachment_382229" align="alignnone" width="712"] Foto: Arquivo pessoal/ Angela Costa[/caption]
Para os católicos, 26 de setembro é o dia dos santos gêmeos médicos, Cosme e Damião, popularmente conhecidos como padroeiros das crianças, devido às curas feitas na Ásia Menor, atual Egeia na Síria, que foram consideradas "milagrosas".
Já para as religiões afro-brasileiras, como a Umbanda e o Candomblé, o dia dos santos gêmeos, conhecidos como ibejis, é comemorado no dia 27 de setembro, quando o caruru é ofertado primeiramente para as crianças, que representam os erês.
Ibeji é um termo de origem iorubá que se refere a gêmeos ou à divindade associada a eles. Na cultura africana, ibeji é venerado como um orixá que representa a dualidade, a fertilidade e a proteção. Os gêmeos são considerados sagrados e possuem uma forte ligação com a espiritualidade.
CARURU DE SÃO COSME E DAMIÃO - OU DE "SETE MENINOS"
A tradição do caruru de São Cosme e Damião ou de sete meninos, é oferecido primeiramente aos orixás ibejis e aos erês e depois a sete (ou mútiplos de sete) crianças, que representam os irmãos: Cosme, Damião, Doum, Alabá, Crispim, Crispiniano e Talabi.
Também são oferecidos doces, como pé-de-moloque, balas e chicletes. A cerimônia costuma incluir danças, cantos e rezas, além de um ambiente festivo que celebra a alegria e a proteção aos pequenos.
O historiador Rafael Passos explica que Cosme e Damião eram médicos pela tradição católica e que foram perseguidos, torturados e mortos como bruxos durante o império romano, no fim do ano 300.
"O culto desses santos chega ao Brasil entre 1530 e 1540, através dos portugueses, mas com o tempo sofre alterações devido à sua relação com os povos que eram escravizados. O culto a eles então ganha um terceiro membro (Doum, irmão mais novo) e alteração em suas cores de origem (indo para o azul e rosa claro)", acrescenta Rafael.
[caption id="attachment_382253" align="alignnone" width="807"] Arte: Engelis de Oliveira/ Pintura em aquarela e bico de pena sobre papel aquarelável.
Cosme, Damião e Doum. 2019[/caption]
O historiador também explica que, por se tratar de uma tradição de região periférica, existia um encanto e também uma repulsa por parte das pessoas. Ele afirma que essa cultura vem sendo diminuída devido ao avanço dos evangélicos. "Há 10, 15 anos, todo mundo tinha um caruru. Hoje em dia, as pessoas correm atrás de um que mantenha a tradição, em especial fora dos terreiros. Antigamente, diversas famílias mantinham a tradição viva", explica Rafael.
PATRIMÔNIO HISTÓRICO CULTURAL
O caruru, que é ofertado durante todo o mês de setembro e se repete todos os anos, agora é patrimônio imaterial da Bahia. O título do prato, feito com quiabo, camarão seco e muito azeite de dendê, foi aprovado por unanimidade pelo pleno do Conselho Estadual de Cultura (CEC). O registro será publicado no Diário Oficial da Bahia nesta sexta-feira (27 de setembro), dia da celebração.
Para o professor de História da Arte e artes plásticas, Engelis de Oliveira, a festividade une elementos de devoção aos santos gêmeos, com práticas culinárias e rituais que homenageiam orixás, tornando o prato uma verdadeira celebração da diversidade religiosa do país. "Dentro dessa síntese, essa simbiose entre as religiões, tanto europeias quanto africanas, a gente tem essa dimensão sincrética, que foi introduzida na nossa cultura de maneira muito orgânica", explica Engelis.
Ele também afirma que comer o caruru no dia de São Cosme e Damião, que para alguns é dia 26 e para outros 27 de setembro, é um ato não necessariamente religioso, mas cultural.
CARURU EM SALVADOR E REGIÃO METROPOLITANA (RMS)
Para uma tradição se manter viva, é necessário mantê-la ativa. Algumas figuras, como a família de Cira do Acarajé, que pratica a festividade há 85 anos, distribuem todos os anos o prato religioso. Confira alguns locais que irão oferecer caruru em Salvador:
01. Barraca do Chapéu de Couro
Data e Horário: Sexta-feira (27/9) - 12h
Local: Mercado das Sete Portas - Praça 1º de Maio, Box 82, Barbalho, Salvador.
02. Terreiro Ilê Axé Omim Odô
Data e Horário: 12/10 - 17h
Local: Rua Alto do Caji, 5, Quilombo Quingoma de Fora, Lauro de Freitas
03. Terreiro Onzo Kawungemy
Data e Horário: Sexta-feira (27/9)- 17h
Local: Estrada da Liberdade, 554, Liberdade, Salvador
04. Galo de Diumbanda
Data e Horário: Sexta-feira (27/9)- 18h
Local: Comunidade Pela Porco, Sete Portas
05. Clube dos Oficiais da Polícia Militar e Bombeiros
Data e Horário: Sexta-feira (27/9) - 18h30
Local: Av. Dendezeiros, S/N, Bonfim.
LEIA MAIS: Caruru de São Cosme e São Damião é oficializado como Patrimônio Cultural da Bahia
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