Lobo-terrível: empresa diz ter recriado animal extinto há 12 mil anos
Empresa americana afirma ter criado híbridos do lobo-terrível, extinto há mais de 10 mil anos; três filhotes já nasceram
Por Da Redação.
Já viu aquele lobo branco na série - e fenômeno mundial - "Game of Thrones"? Trata-se do "lobo-terrível (Aenocyon dirus), espécie extinta há cerca de 12 mil anos. E se você descobrisse que nasceram três filhotinhos recentemente? É o que afirma a empresa norte-americana "Colossal Biosciences".
Nessa segunda-feira (7), a empresa anunciou o nascimento de três filhotes geneticamente modificados com características do lobo-terrível, o que seria a primeira tentativa bem-sucedida de "desextinção" de um animal.
“Pela primeira vez, a Colossal restaurou com sucesso uma espécie outrora erradicada”, declarou a companhia em publicação na rede social X. Os animais foram batizados de Rômulo, Remo e Khaleesi e vivem atualmente em uma reserva ambiental nos Estados Unidos. Segundo a empresa, os dois primeiros nasceram em outubro de 2024, e o terceiro, em janeiro de 2025.
Como foi feita a recriação genética do lobo-terrível, segundo a Colossal Biosciences
A Colossal Biosciences divulgou, por meio de vídeos nas redes sociais, detalhes sobre a técnica utilizada para recriar exemplares do lobo-terrível (Aenocyon dirus), espécie extinta há mais de 10 mil anos. Os cientistas envolvidos no projeto explicam passo a passo o processo que resultou no nascimento de três filhotes com características do animal ancestral.
O trabalho começou com a coleta de DNA do lobo-terrível a partir de duas amostras fósseis: um dente de aproximadamente 13 mil anos, encontrado em Ohio, e um fragmento de crânio datado de 72 mil anos, descoberto em Idaho, ambos nos Estados Unidos.
Com o material genético em mãos, os pesquisadores sequenciaram os genes da espécie extinta e iniciaram a comparação com o genoma de animais ainda existentes. A espécie mais próxima identificada foi o lobo-cinzento (Canis lupus), que habita principalmente regiões frias do Hemisfério Norte, como Canadá e Rússia.
A partir dessa análise, os cientistas identificaram quais genes eram compartilhados e quais diferiam entre os dois animais, além de determinar quais trechos do DNA estavam associados a traços físicos como porte, pelagem, formato da cabeça e vocalizações.
Em vez de utilizar tecidos diretamente fossilizados, a equipe optou por uma abordagem menos invasiva. Eles coletaram células progenitoras endoteliais - que revestem os vasos sanguíneos - do lobo-cinzento, que serviram como base para o processo de edição genética.
Utilizando a técnica Crispr, uma ferramenta de precisão para alterações no DNA, os cientistas editaram 14 genes em 20 pontos específicos, ajustando-os para refletir as características genéticas do lobo-terrível. A meta era recuperar traços como pelagem branca, corpo mais robusto, ombros largos, cabeça ampla, pernas musculosas e vocalizações típicas da espécie extinta.
Com as alterações concluídas, o núcleo dessas células modificadas foi inserido em óvulos previamente desnucleados. Esses óvulos foram cultivados em laboratório até se tornarem embriões, que, posteriormente, foram implantados no útero de cadelas domésticas de grande porte.
A gestação ocorreu de forma natural e, em 1º de outubro de 2024, nasceram os dois primeiros filhotes, batizados de Rômulo e Remo - referência à lenda romana dos irmãos criados por uma loba. A terceira filhote, Khaleesi, nasceu em janeiro de 2025. O nome homenageia a personagem Daenerys Targaryen, da série Game of Thrones.
Os três animais vivem atualmente em uma reserva privada nos Estados Unidos, cuja localização não foi divulgada por razões de segurança. Por ora, não há previsão de soltura na natureza nem de reprodução para formar novas gerações.
Cientistas questionam classificação dos lobos-terríveis
Apesar da divulgação, cientistas questionam a classificação dos animais como lobos-terríveis genuínos. Reportagem da revista "Time" esclarece que o processo não envolveu a recriação completa do genoma do lobo extinto, mas a edição genética de lobos-cinzentos modernos. Foram realizadas alterações em cerca de 20 regiões do DNA, com foco em características como estrutura corporal robusta, mandíbulas maiores e vocalização específica da espécie ancestral.
“Este momento marca não apenas um marco para nós como empresa, mas também um salto para a ciência, a conservação e a humanidade”, afirmou a Colossal.
Para Corey Bradshaw, professor de Ecologia Global na Universidade Flinders, na Austrália, os filhotes não podem ser considerados verdadeiros lobos-terríveis. “Essas modificações parecem ter sido derivadas do material genético recuperado do lobo-terrível. Isso faz deles lobos-terríveis? Não. Faz deles lobos-cinzentos ligeiramente modificados? Sim”, afirmou à Reuters.
Bradshaw também apontou que a degradação do DNA ao longo de milhares de anos torna inviável a reconstrução completa do genoma de espécies extintas, o que limita as possibilidades reais de uma desextinção. “Quando se fazem grandes afirmações e não se fornecem evidências associadas, especialmente em algo tão controverso, isso é uma bandeira vermelha gigantesca”, disse.
O paleogeneticista Nic Rawlence, da Universidade de Otago, na Nova Zelândia, classificou os animais como híbridos. “O lobo-terrível está em um gênero completamente diferente dos lobos-cinzentos”, afirmou. “De cerca de 19 mil genes, eles determinaram que 20 mudanças em 14 genes deram a eles um lobo-terrível”, criticou.
O artigo científico detalhando o experimento ainda não foi publicado nem revisado por pares, o que reforça a cautela entre os pesquisadores.
Sobre a Colossal Biosciences e trabalho com a desextinção
A Colossal foi fundada em 2021 com o objetivo de aplicar tecnologias de edição genética para reviver espécies extintas. A empresa afirma que esse trabalho pode contribuir para restaurar o equilíbrio ecológico em determinadas regiões do planeta. Um dos principais projetos envolve a reintrodução de mamutes-lanosos em áreas da tundra, com o objetivo de transformar paisagens dominadas por musgo em pastagens, reduzindo assim a liberação de dióxido de carbono no solo congelado.
Em março, a empresa já havia anunciado a criação de camundongos geneticamente modificados com pelos semelhantes aos dos mamutes-lanosos. À época, o anúncio também foi recebido com ceticismo. “Temos alguns camundongos peludos e fofos, sem nenhuma compreensão de sua fisiologia ou comportamento”, afirmou Robin Lovell-Badge, do Instituto Francis Crick, em Londres.
Stephan Riesenberg, engenheiro de genoma do Instituto Max Planck de Antropologia Evolucionária, também comentou os limites da iniciativa. “Está longe de fazer um mamute ou um 'camundongo mamute'. É apenas um camundongo que tem alguns genes especiais”, disse à revista "Nature".
A Colossal afirma que pretende se tornar a primeira empresa a usar a tecnologia Crispr para reconstituir espécies extintas. A técnica funciona como uma espécie de "tesoura genética", permitindo alterar trechos específicos do DNA celular.
Desde sua fundação, a startup já levantou bilhões de dólares em investimentos e hoje é avaliada em cerca de US$ 10 bilhões. Ainda assim, o consenso científico é de que os desafios para a chamada "desextinção" continuam consideráveis, tanto do ponto de vista técnico quanto ético.
Com informções da BBC e da Reuters
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