Cidadania

O assédio não não deu trégua nem mesmo na final da Copa Feminina

Colunista On: Isabela SousaAtivista pela redução das desigualdades e fundadora do Move Bahia
O assédio não não deu trégua nem mesmo na final da Copa Femininareprodução/redes sociais

Neste ano, achei extremamente simbólico que grande parte da Copa do Mundo de Futebol Feminino tenha sido realizada ao longo do mês de agosto. Aqui no nosso país, este é o mês em que celebramos a campanha do Agosto Lilás, de promoção de ações que conscientizem a sociedade contra a violência de gênero.


Uma coisa pode não ter relação direta com a outra, já que o Agosto Lilás é uma campanha apenas nacional, mas não tenho dúvidas de que o fato de vermos jogadoras brilhando no esporte mais popular do planeta ampliou o debate sobre as questões que ainda nos afetam. Acontece, no entanto, que as mulheres não têm paz nem na final de um torneio que deveria marcar a luta pela igualdade de gênero.


No último final de semana, a Espanha venceu a Inglaterra e se tornou campeã mundial pela primeira vez. Na premiação após o jogo, porém, o que era para ser um momento inteiramente alegre acabou marcado por uma cena, no mínimo, esdrúxula.


Na cerimônia de entrega das medalhas, o dirigente da Federação Espanhola, Luis Rubiales, deu um beijo forçado na boca da jogadora Jennifer Hermoso. O episódio, imediatamente, tomou grandes proporções e manchou a festa espanhola. Ainda no vestiário, a atleta apareceu em um vídeo no qual claramente demonstrava a sua insatisfação, mas ao mesmo tempo foi possível sentir o seu constrangimento ao tentar minimizar o ocorrido para não acabar com o clima alegre da equipe. “É… eu não gostei. Mas o que eu poderia fazer ali?”, disse.


Essa postura me faz pensar em como as mulheres, muitas vezes, são violentadas duplamente quando sofrem algum tipo de abuso. São violentadas, em um primeiro momento, a partir do próprio ato. Já em um segundo momento, sofrem a violência simbólica de serem submetidas ao constrangimento, às tentativas de minimização, ao receio de não “prejudicar” a vida de outra pessoa, etc.


Passado o fim da Copa, o caso continuou com tanta repercussão que levou o ministro da Cultura e do Esporte da Espanha, Miquel Iceta, a se pronunciar repudiando a postura do presidente da federação. E, dias depois, Hermoso se
pronunciou em uma nota publicada pelo sindicato das jogadoras, que irá representá-la a respeito do assunto. No texto, ela revela toda a repulsa que sentiu naquele momento e pede punições exemplares contra o dirigente.


“Pedimos à RFEF (Federação Espanhola de Futebol) que implemente os protocolos necessários, garanta os direitos das nossas jogadoras e adote medidas exemplares. É fundamental que a nossa equipe, atual campeã do mundo, seja sempre representada por figuras que projetam valores de igualdade e respeito em todas as áreas”.


Assim como o beijo forçado contrasta com todo o simbolismo positivo da Copa do Mundo Feminina, o mês do Agosto Lilás também foi manchado por episódios de violência contra a mulher aqui no Brasil. Basta uma breve pesquisa para identificar que, assim como em outros meses, agosto foi repleto de notícias que nos fazem perceber como a luta pela igualdade de gênero ainda está no começo.


No dia em que escrevo esta coluna, inclusive, li a notícia do bárbaro assassinato da personal trainer Andreia Maria Pinto da Costa, de 42 anos, na cidade de Porto Seguro. No momento, a principal linha de investigação da polícia aponta para mais um caso de feminicídio em nosso estado. Infelizmente, ela pode ser mais uma baiana vítima desse tipo de crime. Nos últimos cinco anos, foram 564.


Comecei este mês escrevendo sobre o Agosto Lilás e não poderia encerrar de outra forma, já que sinto na pele as dificuldades de ser mulher e estar na política. Cada uma de nós, seja a nível estrutural ou a nível pessoal, sofre por viver em uma sociedade cujo machismo está enraizado. Cabe a todos nós, mulheres e homens, estarmos cada vez mais engajados nesta luta, para que o mundo seja um lugar em que ninguém tolere qualquer tipo de violação, do beijo forçado ao feminicídio.


Merecemos viver em uma sociedade na qual possamos celebrar a força, a coragem e a dedicação de uma mulher que chegou ao topo do mundo. Merecemos viver em uma sociedade na qual não precisemos temer pela violência que bate à nossa porta a todo momento. Merecemos, enfim, viver em uma sociedade na qual a gente tenha mais a celebrar e menos a temer. Merecemos, e viveremos! Nossa luta segue!


*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.

Importante: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Aratu On.

Isabela Sousa

Isabela Sousa

Ativista pela redução das desigualdades, filha mais velha de quatro irmãos e fundadora do Move Bahia. Essa é Isabela Sousa, uma jovem de Campinas de Pirajá que cresceu sentindo na pele as dificuldades de uma realidade periférica de Salvador. Hoje, é uma formanda em Direito que sonha pela igualdade de oportunidades e tem a educação como pilar das transformações que a sociedade precisa. Aos 25 anos, Isabela já foi embaixadora do movimento Mapa Educação, é Líder Estadual do Movimento Acredito e representou o Brasil no maior congresso de jovens líderes do mundo, o One Young World, em Londres.

Instagram: @isabelasousaba

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