Não se faz segurança pública com propaganda
É sentimento comum entre nós, baianos, o medo que nos faz pensar duas vezes antes de sair de casa para qualquer atividade de lazer, ou mesmo para as obrigações do dia a dia. Pode parecer algo sutil, mas esse é um violento reflexo da insegurança generalizada que atormenta o nosso estado. Deixar de ir a algum lugar pelo mero receio de acontecer algo ruim é, no fim das contas, uma privação da nossa liberdade. E uma gestão que não combate à criminalidade é cúmplice desse medo que nos imobiliza.
Obviamente, deixar de sair de casa é apenas a ponta do iceberg. Os mais diferentes retratos do caos que toma conta da (in)segurança pública do nosso estado são visíveis todos os dias, basta ler o noticiário. No último feriadão, uma onda de violência tomou conta da Bahia, e atingiu até mesmo quem não é daqui. A brutalidade contra os turistas romenos, além de chocante, mancha a nossa imagem diante de pessoas de todo o mundo, que agora também pensarão duas vezes antes de vir pra cá.
Para o governador, no entanto, quem critica o cenário em que se encontra a segurança pública do nosso estado está agindo de “má-fé”, como afirmou em entrevista dada em fevereiro. Como se não bastasse essa declaração lamentável,
nesta semana o Governo do Estado lançou uma campanha publicitária tão tosca que nos remete a uma esquete do Porta dos Fundos. A tentativa de parodiar um noticiário policial, exaltando supostos avanços na área da segurança, é mais um retrato de uma inversão de prioridades: lembrando daquela máxima que diz que “não é importante apenas ser, mas também parecer ser”, o que vimos até agora é uma gestão que se preocupa apenas com as aparências, com o "parecer ser".
Em uma pesquisa que fiz para escrever esta coluna, encontrei um infográfico do Poder360 que mostra a remuneração inicial das PMs de cada estado brasileiro. Os dados são de 2019, não muito recentes, mas sem dúvidas nos ajudam a entender como chegamos na situação atual: entre todas as 27 unidades da Federação, a Bahia fornecia o menor salário para policiais em início de carreira. Enquanto o nosso vizinho Sergipe, cujo PIB é muito menor, pagava R$ 3.370 aos ingressantes, o nosso estado oferecia R$ 2.585. Agora, pergunto: como esperar melhoria na segurança se não há valorização dos profissionais que estão na linha de frente?
A coisa ficou ainda mais estranha quando eu tentei encontrar dados mais recentes sobre a remuneração dos nossos policiais. Foi então que cheguei ao último Anuário Brasileiro de Segurança Pública e, pasmem, descobri que a Bahia não disponibilizou os dados. Fomos um dos poucos estados que ficaram com um vácuo vergonhoso na tabela de remuneração dos agentes de segurança. Qual o interesse em ocultar esses dados? A população não tem o direito de saber se os nossos policiais têm sido valorizados?
Também precisamos pensar sobre o peso que a falência da nossa educação estadual exerce na equação que amplia o ciclo da violência. Em todas as categorias do índice que avalia a qualidade da educação básica nos estados do país, o Ideb, figuramos nas últimas posições. Somos o estado com a terceira pior taxa de aprendizado no ensino médio, por exemplo. Se educação e segurança são áreas que se complementam, visto que um ensino de qualidade promove maior inclusão social e insere as pessoas no mercado de trabalho, a Bahia hoje dá um exemplo negativo aos demais estados do que não deve ser feito em nenhuma das duas áreas.
Todos esses fatores, evidentemente, só poderiam descambar em um cenário: o da violência generalizada. Em 2022, o nosso estado liderou, pelo quarto ano consecutivo, o ranking de mortes violentas no país. Foram 5.124 baianos assassinados ao longo do ano. Também estamos entre os estados com uma das polícias que mais morre e mata em serviço, o que provoca uma reflexão sobre as políticas de segurança pública que precisam ser elaboradas para que o crime seja combatido com inteligência, de modo a preservar vidas.
Para finalizar, lembro do ranking divulgado recentemente pelo Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça Penal do México, que listou três cidades baianas entre as 50 mais perigosas do mundo (Salvador, Feira de Santana e Vitória da Conquista). A Bahia foi o único estado brasileiro com três municípios presentes.
E, se a ideia do governador for continuar fazendo propaganda ao invés de trabalhar para resolver o problema, infelizmente a nossa lista pode ficar ainda maior.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.