Socorro acessível? Entenda sobre os canais de emergência para PcD

Entenda sobre como os canais de emergência funcionam para pessoas com deficiência (PcD) e suas barreiras invisíveis para uma acessibilidade eficaz

Por Laraelen Oliveira.

Apesar dos avanços em políticas públicas e tecnológicas, para garantir uma maior acessibilidade ao estado da Bahia, pessoas com deficiência (PcD) ainda enfrentam obstáculos significativos para pedir socorro em situações emergenciais, como em casos de violência, abusos ou acidentes. 

Com a criação da Central de Intérpretes de Libras (CILBA) e a Central de Acessibilidade (CACS) os métodos de denúncia se tornaram mais eficazes, porém ainda existem diversas barreiras tecnológicas que impedem um atendimento prático e rápido pelos meios de segurança convencionais. Pessoas surdas não conseguem ligar diretamente para o 190 assim como pessoas cegas não conseguem utilizar os aplicativos e plataformas devido a falta de compatibilidade com os leitores de tela. Nessa matéria iremos analisar e informar como os meios de denúncia podem ser eficazes para fugir de situações de perigo e analisar as barreiras invisíveis que ainda existem no sistema de segurança pública do estado.

Preciso de ajuda, o que eu faço? 

Quando se está em uma situação de risco, o socorro precisa ser imediato, canais telefônicos como o 190, para a Polícia Militar, e 193, para as ações do Corpo de Bombeiros, são essenciais para situações de violência, assaltos, incêndios, acidentes de trânsito, desastres naturais, etc. Eles funcionam como uma linha direta de socorro, permitindo que o cidadão acione rapidamente equipes treinadas para agir em questão de minutos.  

Esses canais atuam como porta de entrada para o sistema de segurança e justiça, muitas das vezes a denúncia é o primeiro passo para a abertura de inquéritos, aplicação de medidas protetivas, como a Lei Maria da Penha, ou, ações legais contra agressores. São serviços nacionais, gratuitos e acessíveis para qualquer telefone, além de estarem disponíveis para situações em que a vítima não tem condições de se deslocar até uma delegacia, hospital ou posto de bombeiros

O Disque 100 funciona 24 horas, com atendimento remoto em Libras, e recebe denúncias de violência contra crianças, mulheres, idosos e pessoas com deficiência/Foto: Freepik

Apesar da Bahia contar com diversos canais de emergência e denúncia, como o Disque 100, a Guarda Municipal de Salvador e as Centrais de Interpretação de Libras (CILs), a acessibilidade plena ainda é um desafio. Esses serviços são fundamentais para que a população possa pedir socorro em casos de violência, acidentes ou outras situações de risco imediato. O Disque 100 funciona 24 horas e oferece atendimento remoto em Libras, enquanto a Guarda Municipal disponibiliza atendimento em Libras e via WhatsApp. Já os CILs têm horários limitados e não estão presentes em todos os municípios, o que restringe o acesso de pessoas surdas em localidades fora de Salvador ou fora do horário comercial.

Além das limitações de horário e cobertura, muitas barreiras de comunicação ainda persistem. Pessoas surdas enfrentam dificuldades quando não há intérpretes disponíveis, pessoas cegas encontram obstáculos em aplicativos que não são compatíveis com leitores de tela, e pessoas com deficiência intelectual podem se perder em sistemas complexos sem linguagem simplificada. Essa realidade evidencia que, embora existam canais de denúncia, nem todos os cidadãos conseguem acessá-los de maneira rápida e eficiente, especialmente em situações de emergência, colocando em risco a proteção, à integridade física e os direitos das pessoas com deficiência.

Principais dificuldades enfrentadas por PcD

A principal dificuldade enfrentada por pessoas com deficiência (PcD) é a falta de intermediação entre os canais de denúncia e a vítima, pessoas surdas não conseguem ligar diretamente para o 190 ou 193 por não ter um intermediário durante a ligação. Já as pessoas cegas muitas das vezes são incompatíveis com os leitores de tela de aplicativos ou plataformas que prestam atendimento essencial. 

O professor João Ricardo, coordenador do projeto Vozes do Silêncio, destaca que a tecnologia é uma grande aliada na autonomia das pessoas com deficiência, mas sozinha não é suficiente. Em situações emergenciais, ferramentas digitais podem facilitar o pedido de socorro, porém a resposta só é efetiva quando há interação humana capacitada para atender a demanda. Nesse ponto, ele alerta para uma das principais barreiras enfrentadas: a ausência de profissionais que dominem a Língua Brasileira de Sinais (Libras) em serviços essenciais, como delegacias, hospitais e órgãos de segurança.

O professor João Ricardo defende a inclusão da Libras na educação básica e a cooperação técnica entre Estado, associações e comunidade surda/Foto: Divulgação/Vozes do Silêncio 

A falta dessa acessibilidade, segundo o professor, resulta em casos subnotificados, principalmente de violência contra mulheres e crianças surdas. Muitas vítimas não conseguem registrar denúncias ou relatar situações de abuso por não terem canais adequados para se comunicar. “É uma barreira não apenas tecnológica, mas também linguística. Se o delegado, o médico ou o policial não sabe Libras, a demanda do surdo não é atendida de forma completa”, pontua João Ricardo.

Como proposta, ele defende uma cooperação técnica entre Estado, associações e comunidade surda para ampliar a acessibilidade nos serviços de emergência. Além disso, sugere uma política social de longo prazo: a inclusão da Libras como disciplina na educação básica. Para ele, essa medida traria ganhos duplos, garantindo a expressão linguística da comunidade surda e, ao mesmo tempo, permitindo que a população ouvinte aprendesse uma nova língua, criando uma sociedade mais inclusiva e preparada para responder a situações de urgência.

Serviços disponíveis

Na Bahia, um dos principais canais de apoio para a comunidade surda é a CILBA (Central de Intérpretes de Libras da SUDEF/SJDHDS). Trata-se de um serviço público estadual que oferece atendimento remoto e presencial com intérpretes de Libras. O objetivo é garantir a comunicação entre pessoas surdas e profissionais de áreas essenciais, como saúde, educação, assistência social, segurança pública e serviços gerais. Esse suporte pode ser decisivo em situações de emergência, pois permite que o cidadão surdo consiga relatar sua demanda de forma clara e compreensível para quem está do outro lado do atendimento.

A CILBA oferece atendimento remoto e presencial em saúde, educação, assistência social e segurança, garantindo que pessoas surdas possam se comunicar com profissionais de diferentes áreas/Foto: Imagem gerada pelo Chat GPT

Já no âmbito municipal, a Prefeitura de Salvador disponibiliza dois serviços: a Central de Acessibilidade (CACS) e a Central de Libras. Esses canais funcionam como pontos de mediação linguística para que pessoas surdas tenham acesso a serviços públicos com maior autonomia. Além disso, a Prefeitura investiu na capacitação de mais de 3 mil servidores em Libras, abrangendo setores estratégicos como saúde, mobilidade urbana, Prefeitura-Bairro e até o serviço de salvamento marítimo (SALVAMAR). A expectativa é ampliar ainda mais esse alcance, com novas turmas previstas para agentes da Guarda Municipal e da Transalvador, fortalecendo a acessibilidade em áreas ligadas diretamente à segurança e ao atendimento emergencial.

Por fim, os avanços conquistados com o uso da tecnologia e a implementação de políticas públicas voltadas para a acessibilidade ainda são um marco para a comunidade e coloca em destaque o acolhimento de PcD que necessitam de serviços básicos de segurança e saúde como qualquer outro cidadão baiano. Porém as barreiras estruturais, linguísticas e sociais continuam a comprometer o direito básico ao socorro de pessoas com deficiência. 

É necessária a presença humana qualificada, combinando inovação digital com profissionais capacitados em Libras e em atendimento inclusivo, garantindo uma resposta rápida e eficaz em emergências/Foto: Imagem gerada por chat GPT

A ausência de profissionais capacitados em Libras nos serviços de segurança, saúde e atendimento emergencial, a falta de canais plenamente acessíveis e as dificuldades em sistemas complexos evidenciam que o caminho para a inclusão plena ainda é longo. Como destacou o professor João Ricardo, do projeto Vozes do Silêncio, a tecnologia é essencial, mas não resolve sozinha. 

“A gente encontra hoje várias pessoas com deficiência com muita autonomia por conta da tecnologia, mas sempre vai ter a presença do humano para que esse processo tenha um resultado melhor”. O professor evidencia que a verdadeira inclusão não depende apenas de recursos digitais, mas da união entre inovação tecnológica e presença humana qualificada, garantindo que nenhuma pessoa seja deixada sem resposta em momentos de urgência.

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