Pedófilos usam emojis para se identificarem na internet; veja cuidados
Proteção de crianças contra atuação de pedófilos na internet depende da vigilância e conscientização de todos
Por Júlia Naomi.
O uso de emojis é uma forma de comunicação comum, mas nem sempre é feito de maneira literal. Nas redes sociais, pedófilos se apropriam desta linguagem e utilizam códigos para se reconhecerem, facilitarem contatos entre si e fortalecerem redes criminosas. Em um vídeo publicado no Instagram, a escritora e ativista pela erradicação da violência sexual e online, Sheylli Caleffi, chama atenção para a quantidade de perfis que se associam dessa forma e utilizam hashtags para alimentar seus bancos de imagens.
No vídeo, publicado em junho de 2023, a palestrante mostra como perfis no Instagram reúnem fotos de pais e filhos juntos, com legendas que simulam um contexto sexual, usam imagens de crianças e adolescentes criadas por inteligência artificial e, muitas vezes, encaminham usuários para canais de vendas de conteúdo ilícito no Telegram. Ela destaca que as redes sociais não são seguras e é preciso pensar antes de expor fotos e vídeos de crianças na internet.
Usar as redes sociais para compartilhar momentos felizes entre amigos e família é uma prática comum. Pais e mães, por exemplo, costumam considerar a publicação de fotos dos filhos como uma demonstração de amor. Alguns ainda utilizam hashtags relacionadas à experiência da maternidade, da paternidade, à infância e ao gênero da criança, sem saber que se tratam de instrumentos de busca que potencializam as visualizações - inclusive, de criminosos.
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“O que as pessoas não entendem é que a hashtag é um agregador de conteúdos pela semelhança, que todo mundo que usar a hashtag ‘menina’, vai aparecer na busca. Isso vira um cardápio para pedófilos”, lamenta Sheylli Caleffi, à reportagem do Aratu ON, ao ressaltar o uso comercial das redes sociais.
A autora dos livros Respire Fundo e Famílias e Internet também explica que a violência contra crianças e adolescentes na internet é intensificada por criminosos que agem como intermediadores na aquisição de imagens, mesmo sem ter interesse sexual pelas vítimas. “Não há só o interessado na violência sexual, como aquele que vai agredir uma criança no mundo presencial. No online há o atravessador, o intermediador, alguém que está criando um banco de imagens para vender”, detalha Caleffi.
Pedófilos usam emojis como códigos para atuar na internet
No vídeo motivador da reportagem, Sheylli Caleffi, que trabalha no combate à violência sexual há mais de 10 anos, ela aborda o uso associado de emojis em perfis que promovem conteúdo criminoso. Espiral azul, bola de futebol americano e pizza, são alguns dos códigos usados por predadores que desejam avisar outros sobre seu interesse em crianças. Estes símbolos não são os mesmos empregados para aliciá-las. “Nesse caso, eles vão usar os emojis para se disfarçar de criança, para usar a mesma linguagem”, explica Caleffi.
Um exemplo de emoji código em redes de pedofilia na internet é a espiral azul. Ela remete a um triângulo em espiral, símbolo de reconhecimento entre pedófilos identificado pelo serviço de inteligência dos Estados Unidos (FBI), em 2007. Já a pizza de queijo, é traduzida para o inglês como “cheese pizza”, que tem as mesmas iniciais de “child porn”, ou seja, pornografia infantil (termo que, segundo o Miniguia para comunicadores e jornalistas feito pela SaferNet, deve cair em desuso, por minimizar a gravidade do estupro de vulnerável).
Nos últimos dois anos, a situação denunciada no vídeo de Caleffi se tornou ainda pior. De acordo com um levantamento da ONG SaferNet, feito em redes sociais e aplicativos de mensagem, houve aumento de 35% no número de emojis, palavras, siglas e hashtags em português relacionados à incitação ao ódio e conotação sexual. Em 2023 eram 963. Até o primeiro quadrimestre de 2024, a ONG já havia identificado 1,3 mil.
De acordo com a SaferNet, a criação de novos significados para emojis comuns tem o objetivo de dificultar que autoridades, pais e responsáveis reconheçam o que está sendo dito, prejudicando investigações e a identificação de abusos. Atualmente, a empresa Meta, por exemplo, reconhece que há emojis e termos associados à atividade criminosa, de modo que limita buscas no Instagram.
Sheylli Caleffi adverte que os emojis são usados por criminosos sexuais de maneira contextualizada e associada, de forma que não é preciso desconfiar de pessoas que os utilizam isoladamente, porque provavelmente nem sabem que possuem um significado paralelo. “Em minhas aulas, eu nunca falo de símbolos. Eu fiz esse vídeo porque está muito escancarada a forma que eles colocam para se identificar. [...] Certamente, assim que a gente decorar os emojis, eles vão mudar”, acrescenta.
O intuito da especialista com o vídeo, não é fazer com que as pessoas decorem emojis, mas sim, alertar sobre os riscos da exposição de menores na internet. “Para mim, as pessoas não deveriam mostrar fotos das crianças na internet. Eu entendo que dá vontade, que as pessoas acham que é um álbum de fotos. Mas na prática, todo mundo que para, não sente falta”, assegura.
Vigilância e cuidado: saiba como proteger crianças e adolescentes
Proteger a vida, o bem estar e a dignidade de crianças e adolescentes é um dever de todos. Com a internet, esse cuidado exige ainda mais atenção, uma vez que os meios digitais possibilitam a entrada do mundo externo nos lares de cada um. Para Sheylli Caleffi, manter as contas em redes sociais privadas, não usar hashtags e não acessar solicitações de amizade de desconhecidos é uma postura que pode deixar as redes sociais dos pais mais seguras para os filhos.
A autora e palestrante alerta que é preciso reflexão até mesmo antes de enviar fotos de crianças em aplicativos de mensagens para pessoas próximas à família, devido à facilidade de compartilhamento. “Agora eu recebo uma foto do seu filho. Aí eu acho lindo e envio para minha irmã, que manda para nossa prima, dizendo que seu filho está lindo. Quando você vê, não sabe mais onde está a foto. O grupo do Whatsapp é terra de ninguém”, descreve.
Segundo a pesquisa Tic Kids Online 2024, ligada ao Comitê Gestor da Internet, 30% das crianças e adolescentes já tiveram contato virtual com desconhecidos na rede. Por isso, além do cuidado dos pais com as próprias redes sociais, é preciso estar atento ao uso da internet por crianças e adolescentes, que têm sido expostos cada vez mais cedo aos riscos do mundo virtual. “O que a gente precisa é retardar o acesso e, quando eles acessam, estar junto o tempo inteiro. Pra dar um celular, você tem que ter disponibilidade de acompanhar”, orienta Sheylli Caleffi.
De acordo com o Mapeamento dos Fatores de Vulnerabilidade de Adolescentes Brasileiros na Internet, feito pela ChildFund Brasil, 54% dos adolescentes brasileiros já sofreram violência sexual na internet, o que corresponde a 9,2 milhões. Por isso, a necessidade de supervisão e cuidado não se estende apenas às crianças.
Com adolescentes que já têm redes sociais, é possível encontrar soluções para melhorar a qualidade do uso, por meio do diálogo. “Os adolescentes mesmos percebem e comentam dos malefícios de ficar o tempo todo no celular. Quando você traz os dados para eles ou traz casos de cyberbullying, de alterações no sono, de pessoas que não sabem quanto tempo ficam na rede social, eles mesmos conseguem desenvolver pensamento crítico a partir disso.”
Saiba como denunciar situações de abuso
A segurança das crianças depende da vigilância constante e da mobilização de todos. Conscientizar outros pais e cuidadores é uma forma de evitar que as crianças se tornem vítimas. Caso identifique situações de abuso, denuncie.
Disque 100
O Disque 100 é um serviço de utilidade pública do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. O serviço funciona diariamente, 24 horas, por dia, incluindo sábados, domingos e feriados.
O Disque 100 também pode ser acionado através do WhatsApp, utilizando o número (61) 99611-0100
Safernet
É possível denunciar no site da Safernet, que é entidade de referência nacional no enfrentamento aos crimes e violações aos Direitos Humanos na Internet. Basta acessar o site: https://new.safernet.org.br/denuncie
Polícia
Você pode levar prints das atividades criminosas diretamente a uma delegacia.
Na Plataforma
Denuncie na própria plataforma. Em cada uma existe um jeito de denunciar. No Instagram e no Facebook, por exemplo, é preciso tocar nos três pontos no canto superior direito da publicação.
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