Nikolas Ferreira leva o cinturão e resta a Sidônio o trabalho de Sísifo pra salvar o governo
Sidônio é chamado, no círculo mais íntimo de amigos e familiares, de Sissí. Mais um pouco e seria o próprio Sísifo, o personagem do mito que repete incessantemente o mesmo trabalho
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Pense um pouco na figura caricata do cartola do futebol que tem um time que não consegue sair da zona de rebaixamento. O dirigente passa a apontar as razões: a culpa é do gramado, a responsabilidade é da arbitragem vil, ou do excesso de jogos, ou da iluminação do estádio. Ele fala sobre isso tudo, mas esquece de pagar os jogadores em dia.
A culpa está sempre no outro, na desfaçatez, na má-fé, ou na canalhice… do OUTRO.
Agora, imagine ser um atleta nessa equipe. Praticamente se sentindo derrotado por antecipação. Preferindo até não entrar em campo e perder por WO, que equivale a uma derrota por 1x0, e não uma goleada.
Não estamos falando de futebol, estamos no campo da metáfora sobre a política nacional. Não apenas o governo, mas toda a esquerda ficou nas cordas pela sequência de jab, direto, upper do pugilista Nikolas Ferreira - sem aplicar qualquer golpe abaixo da linha da cintura. Quando o vídeo dele ultrapassou 200 milhões de visualizações, dois marcos se estabeleceram: um novo recorde no Instagram do Brasil e a contagem do juiz para anunciar um nocaute.
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O mineiro, que se tornou o deputado mais votado do país pelo PL, com 1,47 milhão de votos e apenas 26 anos, rompeu, com larga vantagem a bolha da direita conservadora, fez uma mensagem chegar virtualmente a praticamente todos os brasileiros, alcançou mais seguidores que o próprio presidente Lula, alugou alguns triplex na cabeça do governo federal.
Na manhã seguinte, grande parte da militância acorda em modo full pistola com… o governo do PT. | Foto: Instagram/Nikolas Ferreira
O vídeo é um espetáculo de comunicação, no estilo menos é mais. É uma peça Bauhaus. Deveria ser emoldurado e pregado no Louvre.
O carrapato maior que o boi
É muito simples: na forma e no conteúdo. A linguagem é direta, sem metáforas, sem firula. É desempenhado por um jovem, barbeado e com camiseta lisa (alguma alusão a Zuckerberg?). É voltado para o público de qualquer idade e de qualquer região do Brasil. Passeia por histórias reais, de brasileiros reais, e não por alegorias e simbolismos. Por fim, fala o que muita gente gostaria de verbalizar - e nem sabia disso. Nikolas não inventa, não discursa, ele apenas canaliza o sentimento de dezenas, talvez, centenas de milhões. Ao falar sobre impostos e como eles são “devolvidos” ao contribuinte, e, sobretudo, comparar com regalias oficiais, o vídeo estoura o sinal de Eureka na cabeça de todos: o carrapato está maior do que o boi. É aí que a magia acontece.
De zero a cem, sabe o potencial destrutivo disso? Uma hecatombe, ataque a Pearl Harbor, do qual se esperavam reações como em Hiroshima e Nagasaki. A medida de recuar na instrução normativa do Pix equivale ao resultado da Batalha de Dunkirk: confissão de derrota, incerteza sobre o futuro, preocupação a respeito do resultado desta guerra.
No tabuleiro do WAR da vida real, está marcado, com um pin azul bem grande: em 15 de janeiro de 2025, um garoto com menos de 30 anos, colocou uma equipe econômica inteira, e por tabela, todo Executivo federal, para dar aqueles três tapinhas de socorro no octógono.
Paciência zero
Na manhã seguinte, grande parte da militância acorda em modo full pistola com… o governo do PT. “Não me venham com “bom dia”, a situação é péssima! Acordei tão nervoso, que meu café foi diferente, joguei o pó na boca e toquei água quente para dentro, paciência zero, em especial com nosso governo.” Quem publica isso não é um vereador do partido em Xique-Xique. É Zeca Dirceu, deputado influente do PT, filho de ninguém menos que o ideólogo do Partido dos Trabalhadores Zé Dirceu.
Não me venham com “Bom dia”, situação é péssima!
Acordei tão nervoso, que meu café foi diferente, joguei o pó na boca e toquei água quente pra dentro, paciência zero, em especial com nosso governo.
Meu único alento é seguir na defesa da educação, o Mais Professores está ON.
— Zeca Dirceu (@zeca_dirceu) January 16, 2025
É também reflexo da forma passivo-agressiva como o petista raiz Paulo Pimenta passou o cargo de Ministro da Secretaria de Comunicação Social. Eu estava lá, eu vi a cantilena de ressentimentos: a longa rememoração, em discurso, sobre os primórdios do partido no Rio Grande do Sul, sobre o orgulho pela estrela vermelha, sobre encontrar Lula no começo, enquanto era vereador, e o hoje presidente não tinha cargo executivo. Muita mágoa colocando ainda mais peso na responsabilidade de Sidônio Palmeira.
Na sequência, o baiano conseguiu ocupar, por três dias seguidos, o posto de ser a primeira audiência na agenda oficial do presidente a cada manhã, dada a magnitude de sua missão. Lula, num gesto que o otimista poderia identificar como altruísmo, não foi buscar Sidônio (apenas) para salvar o governo de uma morte horrível. Ele está apostando no baiano para resgatar todo o segmento de esquerda, que está na lona.
Só que não se trata de comunicação, menos ainda da habilidade da equipe de redes sociais de um deputado. Senão, vejamos. O excelente vídeo não segue nenhum manual de sucesso digital. Tem 4 minutos (considerado longo), a música é meio sombria (o algoritmo odeia), não há imagem apelativa, não apresenta meme (ao contrário do vexatório vídeo do Banco Central). Há algumas hipérboles, exageros, ilações, que não caberiam num discurso jornalístico, mas aquilo ali é política. Sem crimes envolvidos.
O fato é que comunicou bem porque teve caixa de ressonância com o que as pessoas estão sentido: uma medida ruim para quem está no corre do dia a dia - não na fartura de Brasília. Mais de 150 milhões de brasileiros utilizam o Pix. Após o anúncio, foi quase imediato: as operações se reduziram em 10%. Isso não é fruto de “desinformação”
Bem-vindo, Sidônio
Sidônio é chamado, no círculo mais íntimo de amigos e familiares, de Sissí. Mais um pouco e seria o próprio Sísifo, o personagem do mito de um sofrimento eterno, do trabalho que se repete, sem conseguir o êxito. Era ele o condenado a empurrar uma pedra até o lugar mais alto da montanha para, depois, ver o mármore rolar ladeira abaixo. E repetir isso no dia seguinte, em um ciclo interminável de tarefas fadadas ao fracasso. O talento comprovado de Sidônio para a comunicação (atividade em que mereceu o título de Mago) consegue atenuar o apetite para arrecadar mais e gastar mais às custas do suor alheio?
Nikolas, o jovem histriônico e articulado, que parece não se importar em ser odiado pela esquerda, está no auge. Sidônio, o profissional amadurecido e discreto, parece ser o nome mais odiado pela direita no momento.
O mineiro Nikolas, por outro lado, até valorizando o adversário, depois de todo o estrago feito, mandou uma provocação ao: “Seja bem-vindo, Sidônio”.
Seja bem vindo, Sidônio.
— Nikolas Ferreira (@nikolas_dm) January 15, 2025
Vitória de Pix ou vitória de Pirro? O tempo dirá.
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