Chapa puro-sangue é xeque-mate para 2026: resta saber em quem

O “Bruxo” não está como peça no tabuleiro. Ele é o próprio enxadrista. E os próximos meses vão dizer se a jogada foi ou não de grande mestre. Resta saber se o adversário vai aceitar o xeque e colocar o rei de lado, ou se tem uma dama escondida no bolso

Por Pablo Reis.

Chapa puro-sangue é xeque-mate para 2026: resta saber em quemFoto: Divulgação/PT Bahia

Segunda-feira, 26 de maio. O recado não poderia ser mais contundente para começar uma semana. Para Mario Kertész, na Rádio Metrópole, o líder do governo no Senado, Jaques Wagner, confirma sua candidatura à reeleição. Não muito de surpresa, como cereja do bolo, o ministro da Casa Civil, Rui Costa liga de Brasília para reforçar a preferência por Jerônimo Rodrigues para o governo e para defender que a terceira vaga da chapa majoritária fique... com ele mesmo. 

Quem acompanha um pouco de política sabe que a mensagem não precisa de tradutor. Em bom baianês: já é. 

Faltando pouco mais de dez meses da data-limite para filiações aos partidos de quem vai concorrer em outubro de 2026, o núcleo duro do grupo governista se articula para consolidar uma chapa puro-sangue.

São três governadores, isso tem um peso institucional, administrativo. O trio já colocou os rostos naquelas molduras presentes em todas as repartições públicas do estado. São três dos cinco nomes mais conhecidos e lembrados por votantes na Bahia. Isso tem um peso eleitoral sem precedentes. 

Mas política não é álgebra. Nada é tão aritmético como colocar Messi, Cristiano Ronaldo e Mbappé, os três com a mesma camisa, para enfrentar um time cuja principal estrela seja Neymar. Futebol também tem VAR, escanteio e torcedor irritado. Política, então, nem se fala. 

Arte: Matheus Carvalho/TV Aratu

O PT parece antecipar a aliança nacional do PSD, com o presidente Gilberto Kassab articulado para tentar eleger Tarcísio de Freitas como presidente de centro-direita. A costura desse flerte redunda para uma versão paulista do centrão reloaded. Apesar da Bahia ter um peso na sigla, desde as origens (por ter sido o primeiro estado a viabilizar a ideia), a perspectiva de abocanhar uma fatia saborosa do governo federal mexe mais com o apetite de Kassab. Ele quer mais Brasília do que Salvador.

Nesse movimento, Angelo Coronel perde o protagonismo do seu próprio teatro: meses de blefes, recados enigmáticos, reuniões que vazam por conveniência e um jogo de cena que chegou ao fim. Tiraram-lhe o palco, acenderam as luzes e anunciaram outro espetáculo. 

Os oposicionistas querem que uma parte da opinião pública acredite que isso é suicídio político. Algumas vezes, em entrevistas ou postagens em redes sociais, o ex-prefeito de Salvador, ACM Neto, classificou a possibilidade como "arrogante" (ou outras derivações). O vice-presidente do União Brasil sugere que fechar o time em torno da estrela vermelha pode ser erro estratégico. Tenta colar a narrativa de que chapa sectária é harakiri. E esse discurso é seguido por quem está no time como um mantra de comício.

Em se tratando de políticos experientes e, sobretudo, de Jaques Wagner, apontado por grandes nomes no Congresso como o mais hábil agente público do momento, é difícil acreditar em uma simples falha de análise - ou em mera gulodice. É legítimo repensar quando o truque parece simples demais. Essa proposta já tinha sido defendida publicamente por Jaques Wagner em entrevista ao jornal A Tarde em janeiro de 2025, onde chamou a chapa de "natural" e "trio do sucesso".

Classificar isso como simplesmente excesso de confiança pode ser a leitura de um jogo, a partir de peças erradas.

Tampouco fica razoável comprar a ideia de que se trata de uma pá de cal nas ambições da oposição de, vinte anos depois, voltar a habitar o Palácio de Ondina. Por dois motivos, uma chapa raiz, sem aliados na majoritária, potencializa tudo o que o PT representa para os eleitores: de bom e de ruim - não tem meio-termo, não tem matiz. Sem zona cinzenta. Sem meio-termo. Quem ama vota. Quem odeia reage.

E como estiver o temperamento dos cidadãos no momento, isso também vai ser exacerbado. 

No momento, o humor medido em pesquisa vai contra o PT. Além das avaliações nacionais do governo Lula serem preocupantes, existem as consultas locais. Uma pesquisa do Instituto Paraná, divulgada em março de 2025, indicou que, em um cenário hipotético para governador, ACM Neto (União Brasil) lidera com 52% das intenções de voto, contra 27,4% de Jerônimo Rodrigues, 8,1% de João Roma (PL) e 1,5% de Kleber Rosa (PSOL).

O dado é bruto. E assusta. Esse resultado sugere que a oposição, liderada por ACM Neto, pode ser um obstáculo significativo. Ou seja, o xeque-mate reverso. Será que o PT baiano, modelo para a sigla no país, prepara um xeque-mate... contra si mesmo?

Arte: Matheus Carvalho/TV Aratu

Outra questão é que a “rifada oficial” também tende a colocar no colo de ACM Neto os insatisfeitos do PSD. O cálculo interno da cúpula do PT parece ser de que Ângelo Coronel, pessoa física, pode não ter tantos votos como quer fazer acreditar. Mas o PSD e Otto Alencar, estes, sim, dominam grande parte do eleitorado baiano. 

A posição de vice-governador deve continuar acomodando uma liderança do MDB. Além disso, a “carne” sugerida por Wagner (“não matar o boi e não deixar o freguês sem carne”) também tem presidência da ALBA, suplência nas vagas do senado e cadeiras no Tribunal de Contas do Estado e dos Municípios. Tem miolo, tem cupim, tem entranhas — o banquete está servido.

Durante o final de semana, tentaram vender a ideia de que Wagner abdicaria do que ele mesmo já tinha chamado de último mandato como senador. Chegaram a mencionar uma suposta semelhança com o movimento que tirou de Lídice da Mata a possibilidade de se candidatar à reeleição ao Senado, sete anos atrás. Nada mais distante da realidade. Na época, a primeira baiana a assumir a cadeira no Senado foi retirada contra a vontade. 

Líder no Senado, Jaques Wagner continua comandando o xadrez político na Bahia. Promptgrafismo de Matheus Carvalho

Dessa vez, o “Bruxo” não está como peça no tabuleiro. Ele é o próprio enxadrista, de uma manobra com várias camadas. E os próximos meses vão dizer se a jogada foi ou não de grande mestre. Resta saber se o adversário vai aceitar o xeque e colocar o rei de lado... ou se ainda tem uma dama escondida no bolso.

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