Criada há um ano, banda ÀTTØØXXÁ tenta reescrever história da música baiana
Criada há um ano, banda ÀTTØØXXÁ tenta reescrever história da música baiana
A cena se passa diante do Palácio Rio Branco, antiga sede do governo baiano, na Praça Tomé de Souza, Centro Antigo de Salvador. No pequeno palco, os meninos suam como se estivessem sob um sol escaldante, mas já passam das dez da noite. Diante deles, a multidão não se aguenta e uma onda humana se forma e desforma sob o som de uma peculiar mistura de pagode com música eletrônica. As músicas ordenam que o público bote a mão no paredão, que balance seu corpo pra lá e pra cá e que não se importe em causar com seu shortinho — mesmo que um ou outro ache vulgar esse perfil.
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Isso aconteceu durante o festival SSA Mapping, no dia 25 de março deste ano, que reuniu artistas visuais para colorir a tradicional mansão de Salvador. A banda ÀTTØØXXÁ, que tocou ao final do evento, tornaria a movimentar a música baiana em muitas outras ocasiões antes e depois daquele show. “É a música de uma negritude jovem super moderna”, define a produtora do festival Lívia Cunha, que foi quem pensou na banda para fechar o evento.
Especulada como o “pagode do futuro” por veículos de imprensa, o grupo composto por quatro cabeças (Rafa Dias, Osmar Oz, Raoni Knalha e Wallace Chibata) tem percorrido um caminho de pesquisa, estudo e suingue na escrita de uma nova página da história do ritmo baiano. Toda terça-feira, os meninos se reúnem na casa de Rafa, o ‘rasta da Graça’ que há pouco mais de ano deu o pontapé inicial no projeto, para pensar o que mais podem fazer para levar sua música para além do pagodão.
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“O pagode não é o que a gente faz em si. A gente faz música pop, com referência de tudo o que é lugar”, destrincha Rafa Dias. Não à toa, quando se fala em ÀTTØØXXÁ quase sempre se fala de BaianaSystem, banda que, sob o comando de Russo Passapusso, desde 2009 ajuda a desestabilizar os gêneros musicais baianos. “Rola esse link porque o Baiana é uma das únicas coisas novas que surgiram na Bahia recentemente. Não dá pra colocar eles num gênero definido. Com a gente é parecido, mas nossa proposta é outra coisa”, explica Raoni, que divide com Oz (nascido do pagodão raiz, com Oz Bambaz e Leva Noiz) a tarefa de escrever as letras e assumir alguns vocais.
Num mundo onde gêneros, rótulos e classificações são tão importantes — de que outra forma, afinal, o Spotify separaria suas canções? –, a jovem banda se esgueira em diferentes facetas musicais para se fazer entender. Com dois discos já lançados (ÀTTØØXXÁ É F*DA P*R e #BLVCKBVNG), o grupo mistura mil referências numa fórmula quase inédita no cancioneiro baiano. Tá tudo lá: do pop de Major Laser à percussão herdada por Harmonia do Samba. “É um trabalho de pesquisa, de estudo de frequência muito intenso”, orgulha-se Rafa.
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De experimentações em experimentações, a banda tem se empenhado em fazer música para o mundo, chegando a bares em Cajazeiras e em festivais no Rio de Janeiro. A popularização do som dos meninos se deve em muito a ajudinha de Márcio Victor, autoridade do pagode baiano, que se apaixonou pela música £LV$ GØ$T?M antes mesmo dela ser disponibilizada oficialmente e propôs uma parceria com a banda para reviver a canção com o nome “Popa da Bunda (Elas Gostam)”. O vídeo no qual o FitDance ensina a coreografia da música, lançado no começo do mês, já tem mais de 1,5 milhão de visualizações no YouTube.
O vocalista do Psirico definiu a parceria como ?uma mistura cheia de novidades com nossa sonoridade diferenciada e nossa diversidade percussiva?, em publicação no seu Instagram. A expectativa é que a canção dispute espaço com os tradicionais hits durante o Carnaval.
“A turma do ÀTTØØXXÁ tem aquela coisa que você escuta e fica anestesiado, né?”, justifica o líder do Psirico em entrevista ao Aratu Online. “Muita gente não entende esse som agora, mas lá na frente vão entender. É uma usina de informações musicais que vai sacudir o Brasil.” A parceria rendeu bons frutos. Um deles é que até Léo Santana embarcou no refrão ousado (“Não tô nem aí / Tô a fim de olhar / Polpa da bunda / Olha a polpa da bunda”) e tem incluído a suingueira nos seus shows, atraindo visibilidade para o jovem grupo.
O aumento no público da banda tem exigido dos meninos um maior rigor na escrita das letras. Se até La Fúria tem anunciado mudanças em suas composições para se adequar ao espírito do tempo, não há por que resistir à maré politizada. Em suas canções, os rapazes do ÀTTØØXXÁ tem tomado cuidado para não derrapar na baixaria, facilmente encontrável no pagodão que ganhou a Bahia na última década. Nada de pau, água e três reais de mototáxi. “Mas ainda tem aquela mística do duplo sentido”, alivia Raoni.
É difícil conciliar as exigências do mercado e a preservação da identidade. Após anos de estudo sobre a música pop, porém, a saga do ÀTTØØXXÁ para quebrar o mainstream e ser ouvido em tudo o que é lugar parece estar só começando. “As bandas da Bahia se prendem à Bahia”, dispara Rafa. “A gente quer ser escutado pelo mundo inteiro.”
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*Publicada originalmente às 10h39