Tylenol e autismo? Médica fala sobre uso de paracetamol na gravidez

Tema veio à tona após Donald Trump relacionar uso de paracetamol na gestação a suposto risco maior de autismo em crianças

Por, Juana Castro e Ananda Costa.

O autismo pode estar relacionado ao uso de Tylenol? Nesta segunda-feira (22), o presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, viralizou ao afirmar que gestantes não deveriam tomar o medicamento. Ele relacionou o uso na gestação a um suposto risco maior de autismo em crianças.

Não há comprovação científica de que o paracetamol aumente o risco de autismo | Foto: Daniel Reche/Pexels

Para esclarecer possíveis dúvidas sobre o assunto, o Aratu On entrevistou a ginecologista e especialista em reprodução assistida Graziele Reis. Ela também é mãe de uma criança dentro do transtorno do espectro autista (TEA) e se dedica ao estudo do tema.

Segundo a médica, “com base nas evidências mais recentes, não há comprovação científica de que o paracetamol aumente o risco de autismo quando usado de forma adequada”. Ela reforçou ainda que o medicamento segue sendo considerado seguro por órgãos de saúde, como a Anvisa e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

Na entrevista, Dra. Graziele detalhou as situações em que o uso é indicado, os riscos da automedicação e alternativas para gestantes. Confira abaixo:

Aratu On: Existe evidência científica sólida que comprove uma ligação entre o uso de paracetamol na gravidez e o aumento do risco de autismo em crianças?

Dra. Graziele: Esse é um tema discutido há bastante tempo na literatura científica. Alguns estudos antigos sugeriram um risco aumentado, mas não tinham metodologia robusta. Em 2024, um estudo publicado na revista JAMA acompanhou cerca de 185 mil crianças expostas ao paracetamol. Houve associação inicial com maior risco de autismo e TDAH [Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade], mas, quando comparados irmãos — com os mesmos fatores genéticos e ambientais — esse risco deixou de existir. A conclusão foi que o paracetamol, por si só, não aumenta o risco de autismo.

O autismo é multifatorial, com base genética central, mas influenciado por fatores ambientais, como infecções na gestação, deficiências nutricionais, diabetes materna e exposição a substâncias tóxicas. O aumento de diagnósticos também reflete maior conscientização. Assim, quando usado adequadamente e sob orientação médica, o paracetamol continua sendo considerado seguro na gravidez.

Aratu On: Em quais situações o uso de paracetamol é considerado seguro durante a gestação?

Dra. Graziele: Atualmente, o paracetamol é classificado como categoria B. Isso significa que estudos em animais não mostraram efeitos prejudiciais para o feto, embora não existam estudos controlados em humanos. Por isso, deve ser utilizado apenas quando houver indicação clara e sempre com orientação médica. Quando necessário, pode ser prescrito com segurança.

Aratu On: Quais são os riscos reais de automedicação com analgésicos durante a gravidez?

Dra. Graziele: A automedicação é sempre um risco. Nem todas as medicações são seguras para o feto, e até as consideradas seguras precisam ser usadas na dose correta e pelo menor tempo possível. O uso inadequado pode mascarar sintomas de doenças que precisam de diagnóstico, além de expor a gestante e o bebê a efeitos colaterais. Anti-inflamatórios, por exemplo, podem causar alterações no desenvolvimento renal e cardíaco do feto, especialmente em fases avançadas da gestação. Por isso, nunca se deve automedicar.

Aratu On: Quais alternativas seguras ao paracetamol podem ser indicadas para gestantes com dor ou febre?

Dra. Graziele: O paracetamol continua sendo a opção mais segura. A dipirona é classificada como categoria C, podendo ser usada em situações específicas com orientação médica. Já o ácido acetilsalicílico (AAS) é categoria D e não é recomendado, sobretudo no primeiro trimestre. Anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) não são aconselhados, pois trazem riscos importantes para mãe e bebê.

Aratu On: Que orientações a senhora daria às gestantes que estão preocupadas com essa possível associação entre paracetamol e autismo?

Dra. Graziele: A orientação é tranquilidade: até agora não existe evidência científica robusta que comprove essa relação. A medicina está sempre evoluindo, e o tema segue em estudo, mas, com base nos dados atuais, não há justificativa para evitar o paracetamol quando realmente necessário. Tanto a Anvisa quanto a OMS seguem considerando o medicamento como a opção mais segura durante a gestação.

Médica ginecologista Graziele Reis falou sobre uso de paracetamol durante a gestação | Foto: Arquivo pessoal

Estudos relacionados ao autismo

Em 2015, um estudo realizado nos Estados Unidos, no Journal of the American Medical Association, Pediatrics, informou que o uso de antidepressivos durante a gravidez aumenta em 87% o risco de autismo para a criança.

As conclusões do trabalho são importantes, já que de 6% a 10% das mulheres recebem a prescrição de antidepressivos, destacam os pesquisadores que analisaram os dados médicos de 145.456 grávidas na província de Quebec.

“As diversas causas do autismo continuam a ser pesquisadas, mas os trabalhos demonstram que a genética e o ambiente podem ser fatores de risco?, explica a professora Anick Bérard. 

"A nossa investigação permite observar que tomar antidepressivos, sobretudo os que atuam sobre a serotonina (um neurotransformador), durante o segundo ou o terceiro trimestre da gravidez, quase duplica o risco de autismo no bebê", acrescentou.

Bérard e sua equipe acompanharam 145.456 crianças desde a gestação até os 10 anos.

Remédios essenciais para autistas

Em maio deste ano, a Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência da Câmara dos Deputados aprovou proposta que inclui, no programa Farmácia Popular do Brasil, os medicamentos de uso contínuo e essenciais ao tratamento do transtorno do espectro autista (TEA).

O Projeto de Lei 4436/24, do deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), estabelece que os estabelecimentos credenciados ao Farmácia Popular deverão oferecer: medicamentos para comorbidades associadas ao TEA, como insônia, hiperatividade, ansiedade e agressividade; e outros medicamentos recomendados por médicos especialistas no tratamento do transtorno.

O projeto prevê que a lista de medicamentos deverá ser constantemente revisada para incluir novas terapias mais eficazes, cabendo ao Ministério da Saúde regulamentar a atualização dos remédios conforme a comprovação de necessidade.

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