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NÃO SE VÁ: Messi não existe. É um personagem de uma das histórias mais tristes e belas da literatura mundial

NÃO SE VÁ: Messi não existe. É um personagem de uma das histórias mais tristes e belas da literatura mundial

Por André Uzêda

NÃO SE VÁ: Messi não existe. É um personagem de uma das histórias mais tristes e belas da literatura mundial

À medida que umedecia a barba, as lágrimas de desolação de Lionel Messi, salpicadas por entre seus olhos juntos após a derrota na Copa América Centenário, entregaram um truque póstumo até então mantido em absoluto segredo.


Eureka! O pequeno craque é, sem sombra de dúvidas, um personagem de Jorge Luis Borges ? escritor também argentino, em tese, falecido um ano e dez dias antes do nascimento do camisa 10 da Albiceleste.


(Nota: Borges morreu em 14 de junho de 1986, em Buenos Aires. Lionel Andres Messi nasceu em 24 de junho de 1987, em Rosário).


Entre seus escritos, Borges parece ter deixado um último rabisco como espólio. Um conto final para sintetizar sua obra. Uma assinatura dissimulada pelo mistério para tornar a narrativa mais sedutora.


Com a bola nos pés, Messi já havia dado pistas da paternidade literária. Suas estripulias são afeitas ao realismo fantástico, mas obedecem a simplicidade que apenas os grandes gênios alcançam: o poder de transformar coisas extremamente difíceis em veredas de fácil trânsito.


Em sua tragédia ufanista, transformada em Cruzada patriótica após a terceira derrota consecutiva, o craque entregou por definitivo a charada. Ficamos na cara do gol. E, longe do faro imperfeito do centroavante Hiaguín, arrematamos, convictos: Messi está contido na obra de Borges.


As evidências são agora tão irrefutáveis, meu caro Watson, que recai sobre nós o peso da burrice retórica: ?Como não pensamos nisso antes??


Messi é uma figura reconhecida em todo mundo. Figura no panteão dos grandes craques mundiais. Com 29 anos recém-completos amealhou 28 títulos na carreira, entre eles 5 prêmios de ‘Melhor Jogador’ do planeta, 4 Liga dos Campeões da Europa e 3 Mundiais de Clubes.


Todas estas façanhas foram com a camisa azul e grená do Barcelona ? uma das cidades mais cosmopolitas da Europa, que, inclusive, reivindica identidade própria fora do poder central da Espanha.


Dito de outra forma: Messi é um homem internacionalmente bem sucedido. Mas que, por uma trama engenhosamente bem articulada, não consegue vingar e ser reconhecido em seu próprio torrão de terra. Acumula fracassos em seu quintal. Repete a desgraça do astronauta Buzz Aldrin, tornado alcoólatra após o regresso da Apolo 11.


?Andou sobre a Lua, tropeçou na Terra?.


Após a derrota na Copa de 2014, ante os alemães, parecia só uma questão de tempo para Messi reunir forças e findar o jejum de títulos da Argentina. Seria a consagração do herói em uma jornada de persistência e dor. Após os dois fracassos sucessivos contra o Chile, ambos nos pênaltis, não parece mais uma questão de entrega e coroação final.


Messi está fadado ao paradoxo territorial. É um homem do mundo, mas não conseguirá chegar em casa. Ulisses vence a Guerra de Tróia e jamais regressa a Ítaca para ser celebrado com as honrarias que merece.


Borges, no entanto, não sonegaria a este tão dramático ? ao passo que igualmente belo — enredo uma motivação suficiente para sustentá-lo.


Na infância, esse período de vida responsável por quase todos nossos traumas e medos (alô Freud), o menino Messi tinha um problema de crescimento. Os clubes argentinos rejeitaram bancar a medicação enxergando ali um custo extra sem a certeza que viria qualquer tipo de compensação. O Barcelona o acolheu. O menino cresceu. E vingou.


O último passo seria voltar, tal qual uma Tieta na pele e sotaque de Betty Faria, para esfregar sua vingança na cara daqueles que o rejeitaram.


Isso ele fez. Mas, no chumbo trocado, foi ferido por uma adaga venenosa e incurável.  Messi e o povo argentino estão fadados a combater pelo resto da vida, sem sucesso, para nenhum dos dois lados.


Ele subverteu o dilema de outro escritor, o russo Leon Tolstoi. ?Se quer ser universal começa por pintar paredes da tua aldeia?, diz o literato. Messi jamais terá seu rosto pintado nos muros da Plaza de Mayo. Seu nome não será falado em alto e bom tom entre as tabernas de San Telmo, nos parques de Palermo ou nos arredores do Obelisco.


Esta é sua desgraça. E também o charme que o fará ser eternamente lembrado. Não cabe entender. Cabe resignar-se, apenas.


?A realidade é ilusão e a ficção é o real?, Jorge Luís Borges.


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