Verão

Gerônimo reflete sobre a música atual: 'Depois da bunda, vamos pra onde?'

Em papo com o Aratu On, cantor e compositor fala sobre os desafios do axé music, críticas à cena atual e polêmicas do Carnaval

Fonte: Murillo Motta

Em 2025, o axé music celebra seus 40 anos como um dos gêneros mais originais da música brasileira. E poucos nomes são tão representativos dessa história quanto Gerônimo, cantor, compositor e uma das vozes mais autênticas do movimento. Aos 71 anos, ele segue fiel às matrizes africanas que sempre nortearam suas composições, como “É d’Oxum”, “Eu Sou Negão” e “Lambada da Delícia”. Em entrevista ao Aratu On, o artista abriu o coração para falar do passado, presente e futuro do axé — sem fugir das polêmicas.


Gerônimo teceu críticas à qualidade da música atual e ao fenômeno da “supersexualização”: “Hoje, a música baiana tem bons artistas, mas também tem compositores que precisavam pelo menos ter o primeiro grau para discernir a linguagem poética. A cultura da bunda é predominante. O que me preocupa é: depois da bunda, vamos pra onde?”


Sobre a evolução do pagode, ele destacou sua popularidade, mas alertou para seus desafios: “O que me preocupa nessa comemoração de 40 anos do axé, é ele se transformar num wreck, ser uma coisa... Por exemplo, aqui o ano todo na Bahia o axé music não é mais propagado como era antes, pelo abandono das rádios, de tocar os artistas de axé. Muitos deles se "bandaram" para os ritmos do pagode, porque o pagode é uma aceitação pública, é um ritmo sedutor. O que não é sedutor do pagode é o vernáculo, do que se fala... Mas o que se fala também é tão interessante para esse povo que curte demais isso. É um comportamento estratégico de protesto contra a sociedade dominante.”


Questionado sobre os planos para o Carnaval de 2025, Gerônimo não escondeu sua insatisfação com a falta de convites formais para se apresentar: “Eu não sou artista independente, sou totalmente dependente, contratado pelos órgãos da prefeitura e governo do estado. Enquanto não sou convidado, estou focado nos meus shows. Um deles, inclusive, foi cancelado pela prefeitura sem nenhuma satisfação, estilo Donald Trump”, declarou, rindo.


Sobre o cancelamento do show na terça-feira (28), o Matinê, o cantor lamentou: “Era um projeto meu, que a prefeitura pegou pra si depois de mais de 10 anos. Mas sabe como é, quando as coisas são muito boas, tendem a terminar. O outro lado pensante acha que vai fazer alguma coisa diferente e vira ‘merda’”. O Aratu On entrou em contato com a assessoria da prefeitura de Salvador, mas não obteve resposta. 


O evento foi cancelado na Escadaria do Passo. | Foto: Aratu On

O evento foi cancelado na Escadaria do Passo. | Foto: Aratu On




Reflexões sobre os circuitos do carnaval


Gerônimo trouxe à tona uma questão estrutural do Carnaval de Salvador: a logística dos trios elétricos. “Olha, eu vou lhe falar uma coisa que não sei se tá todo mundo prestando atenção. Antigamente, os trios elétricos ficavam antenados num terreno grande que tinha ali na entrada da Graça. Hoje, eles não vão poder entrar mais porque está tendo construção de alguma coisa. Aí eu pergunto a você, onde vão ficar estacionados os trios elétricos monstruosos que tocam no circuito Barra/Ondina e Centro da cidade? Vão ficar no corredor da Vitória? Sei lá... na Ladeira da Barra? É um problema que a prefeitura vai ter que pensar.”


Mesmo sem uma opinião definitiva sobre a possibilidade de um novo circuito para o Carnaval, o artista ponderou: “Será que vai dar certo? Pode até dar... Rapaz, eu sou uma pessoa que estou questionando, mas não sei se sou a favor ou não. Mas vamos dizer que eu seja a favor, mas daqui a pouco o Carnaval vai ser do Porto da Barra até o Farol de Itapuã.”


Sobre os 40 anos do axé, Gerônimo ressaltou que o gênero tem suas raízes muito antes dos anos 80: “O axé sempre existiu, até antes de Assis Valente. Todos nós temos no sangue o DNA de matrizes africanas, mas na década de 1980 ele ganhou projeção. O axé conquistou o mundo, mas na Bahia ele só é frequente no verão. Durante o ano, os artistas se apresentam fora do estado e voltam como andorinhas voando, quando chega o verão. O povo baiano é fiel e honesto, então não deixam de ver o artista.”


Gerônimo, ícone do axé, segue fiel às raízes que marcaram sua trajetória. | Foto: Rede Sociais

Gerônimo, ícone do axé, segue fiel às raízes que marcaram sua trajetória. | Foto: Rede Sociais




Quando perguntado sobre artistas de outros gêneros no Carnaval de Salvador, Gerônimo foi direto: “Eu sou do ‘se saia’. Muitas vezes, pegam um artista global, que não sabe nada de trio elétrico. Ele canta o sucesso dele e vira viral, mas e as outras músicas? E a experiência de conduzir o trio?” Ele ainda elogiou o modelo do Carnaval de Recife, que valoriza seus artistas locais e preserva a tradição.


Ao final, Gerônimo se definiu com sua marca registrada: “Um cara meio doido, que fala o que não deve e muitas vezes é retalhado por isso”. Mas é justamente essa autenticidade que faz dele um dos grandes ícones do axé music e da cultura baiana.


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