Vereadoras dizem que alterações em áreas de proteção ambiental foram aprovadas sem discussão na Câmara de Salvador
As mudanças promovidas pela Prefeitura divergem das ações apresentadas pelo prefeito Bruno Reis (DEM) durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças no Clima, a Cop26, em Glasgow, na Escócia
Vereadoras de oposição na Câmara de Salvador, Maria Marighella (PT) e Laina Crisóstomo, do mandato coletivo Pretas por Salvador, reclamam da tramitação no Legislativo do projeto que culminou com a sanção da lei de número 9.603/2021, que promove alterações em poligonais e em áreas de proteção ambiental na capital (leia na íntegra).
O texto foi sancionado pelo prefeito Bruno Reis (DEM) no dia 8 de novembro deste ano, com a publicação no Diário Oficial, que contou também com as assinaturas da vice-prefeita Ana Paula Matos (PDT) e do secretário João Xavier Filho (Sedur). O gestor promoveu vetos, que foram enviados à Casa na última terça-feira (16/11), e aguardam a passagem pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) para votação em plenário.
Presidente da Frente Parlamentar Mista Ambientalista da Casa, Maria Marighella disse que só soube do projeto após a sanção de Bruno. “Voltamos ao processo legislativo e identificamos que o Projeto de Lei correspondente foi aprovado em 4 de maio, mas sem ter constado na ordem do dia ordinária ou na de acordo. Identificamos, ainda, que esse PL possuía apenas um artigo , enquanto a lei sancionada tem mais de 34 artigos. Estamos apurando todos os passos desta tramitação - que nos chama atenção - por estar fora dos ritos da Câmara Municipal de Salvador”, disse em mensagem enviada à reportagem do Aratu On.
De acordo com Laina Crisóstomo, a questão foi levada à oposição, que convocou uma reunião que deveria ter acontecido na última terça, dia em que os vetos foram enviados para nova votação na Casa. O encontro foi desmarcado e ainda não tem data para ser realizado.
"Ficamos muito surpresas com a sanção da Lei 9.603/2021, quando tomamos ciência pelo Diário Oficial. Vamos apurar e fazer os enfrentamentos necessários, enquanto oposição e também como atuantes pelo Direito à Cidade”, declarou a parlamentar, que também é membro da frente parlamentar, que possui representantes do Legislativo e da sociedade civil.
A reportagem tentou contato com a líder da oposição, Marta Rodrigues (PT), para repercutir sobre o tema e saber quando deve ocorrer a reunião. Contudo, até a publicação desta matéria, o Aratu On não conseguiu conversar com a parlamentar.
Presidente da CCJ, principal comissão da Casa, o vereador Alexandre Aleluia (DEM) também foi questionado sobre as críticas de Marighella e Laina. Até a publicação desta matéria, ele não manifestou.
TRAMITAÇÃO DISCRETA
O desenrolar do texto no Legislativo, questionado pelas vereadoras, ocorreu sem maiores discussões e a aprovação da matéria aconteceu em menos de cinco segundos, sem maiores debates – pelo menos é o que mostra o vídeo da sessão do dia 4 de maio, data em que o projeto foi aprovado pela Câmara.
O presidente da Casa, Geraldo Jr. (MDB), anuncia a aprovação “em única discussão” (veja no vídeo abaixo a partir de 46:36 a votação do PL de numero 26/2021).
O PL foi protocolado no sistema do Legislativo em 4 de fevereiro deste ano. Após três meses, foi votado de maneira rápida, com um parecer conjunto entre as comissões de Constituição e Justiça, Finanças e Orçamento, e de Planejamento Urbano e Meio Ambiente.
Chama atenção o fato de o documento só ter sido disponibilizado no sistema da Câmara no dia 11 deste mês, dois dias após a reportagem iniciar a apuração do tema. O texto final também foi disponibilizado nesta data – portanto, três dias após a sanção de Bruno Reis.
A convocação para votação do texto também não foi publicada na ordem do dia (veja aqui) correspondente à sessão de 4 de maio, tampouco foi pautada em Diário Oficial.
A ata da sessão disponibilizada no Diário do dia seguinte, 5 de maio, também não consta a aprovação do projeto – embora tenha sido anunciada por Geraldo em plenário (veja aqui). Já na ata completa, publicada em separado (veja abaixo), confirma que houve o “ok” dos parlamentares mediante “discussão e votação de acordo com a ordem do dia”.
VEJA ATA COMPLETA DA SESSÃO:
Coordenador executivo do Grupo Ambientalista da Bahia (Gambá) – que também faz parte da frente parlamentar na Câmara –. Renato Cunha criticou a lei, e diz que não houve audiências públicas para debater o tema.
“A gente acabou surpreendido com isso. Ninguém ficou sabendo. Foi uma surpresa geral. São temas importantes para cidade. A gente acompanha a Câmara, participamos da Frente Parlamentar Mista Ambientalista da Câmara, e não tivemos informação nenhuma sobre isso, nem com os vereadores. São questões importantes para cidade”, lamentou.
“Vemos que muita coisa na Câmara acaba sendo atropelada sem ninguém consegue discutir direito”, emendou.
Ambientalistas consultados em anonimato pela reportagem também criticam a disponibilização das informações na lei sancionada pela Prefeitura, que, na visão deles, é difícil de ser lida. Para os especialistas, é difícil ter uma dimensão do que realmente é alterado com a assinatura do texto. Os mapas propostos nas emendas dos vereadores não foram disponibilizados pela Câmara no processo de tramitação, inclusive nos projetos iniciais divulgados publicamente.
A LEI
Segundo matéria disponibilizada pela Prefeitura, há alterações em poligonais na Ilha de Bom Jesus dos Passos e modificações na Área de Proteção de Recursos Naturais do Jaguaribe, no Manguezal do Rio Passa Vaca e também trata sobre as normas para supressão em áreas em que há mata atlântica.
Nos vetos encaminhados à Câmara, a Prefeitura admite a falta de audiências públicas para alguns temas. É o caso do artigo 2º, que alterariam áreas de proteção ambiental no Parque de Pituaçu.
“A proposta de alteração do art. 2º da Lei nº 8.164, de 16 de janeiro de 2012 trata de inserção de Zonas de Uso Especial (ZUE) cuja previsão se encontra no PDDU e na LOUOS, tema que requer estudos técnicos e audiências públicas. Assim, a regra não atende às normas do ordenamento pátrio, cabendo o veto ao dispositivo por ilegalidade”, diz trecho da justificativa do Palácio Thomé de Souza, assinada por Bruno Reis.
Outros artigos, na visão do município, demandariam mais discussões em audiências, como os artigos 4, 11, 16, 17, 18, 25, 26, 27, 28 e 29.
O projeto aprovado pela Câmara ainda autorizava a construção de uma avenida dentro de Pituaçu, o que foi vetado por Bruno, por “não atender ao interesse público” e impactar no Plano de Mobilidade do Município (Planmob).
A votação dos vetos ainda não foi incluída na ordem do dia. Segundo última atualização no sistema da Casa, protocolado na última sexta-feira (19/11), ainda falta ser escolhido o relator. A matéria encontra-se na CCJ.
A lei foi sancionada três dias antes de outro texto também polêmico: o Plano Integrado de Concessões e Parcerias do Salvador (Pics). Enviado à Câmara pelo próprio Executivo, o projeto continha uma série de “jabutis”, a exemplo da retirada da proteção ambiental de uma área na Avenida Orlando Gomes.
As mudanças promovidas pela Prefeitura divergem das ações apresentadas por Bruno Reis durante a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças no Clima, a Cop26, em Glasgow, na Escócia, realizada este mês.
O chefe do Palácio Thomé de Souza apresentou ações para Salvador combater as mudanças climáticas – em especial o Plano de Ação Climática, que deverá se tornar uma lei municipal – e se comprometeu a adotar ações em Salvador para mitigar os impactos ambientais nas mudanças climáticas.
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