Política

PGE pede ao TCE sigilo sobre acordo com Ocean para ressarcimento de R$ 45,5 milhões por respiradores não entregues à Bahia

Segundo a PGE, o acordo culminou com o acordo pelo ressarcimento de valores de cerca de R$ 45,5 milhões com a empresa norte-americana. O Governo não detalha se o dinheiro será integralmente recebido de volta.

Por Matheus Caldas

PGE pede ao TCE sigilo sobre acordo com Ocean para ressarcimento de R$ 45,5 milhões por respiradores não entregues à Bahiadivulgação / Polícia Civil DF

A Procuradoria-Geral do Estado (PGE), por meio do procurador Ubenilson Colombiano, pediu na última terça-feira (1/2) que o Tribunal de Contas do Estado (TCE) dê caráter sigiloso aos detalhes de um acordo firmado entre o Governo da Bahia e a empresa Ocean, que culminou no ressarcimento aos cofres públicos de US$ 8,6 milhões (cerca de R$ 45,5 milhões na cotação atual) usados na compra de 600 ventiladores pulmonares junto à Ocean e que nunca foram entregues. O documento não indica se a verba será integralmente devolvida.


O pedido consta em documento entregue ao TCE. De acordo com o procurador, a solicitação se dá porque “há vedação à divulgação pública do acordo, sob pena de responsabilização daquele que der causa ao vazamento, bem como há cláusula de indenização caso haja violação aos termos do acordo, dentre elas”.


A PGE indica que a confidencialidade é resguardada perante o Juízo da Califórnia no item 9 do acordo. “Considerando a dificuldade na recuperação dos valores, a possibilidade que tinha a empresa de pedir concordata no juízo americano, o que inviabilizaria a recuperação dos valores pagos, foi firmado acordo, por meio do qual a empresa devolveu valores ao Estado”, diz a Procuradoria, em trecho do documento. 


A compra com a Ocean é uma das duas frustradas durante a pandemia que suscitaram investigação e contestações de deputados estaduais de oposição. A segunda delas envolve a empresa Hempcare, cuja sócia, Cristiana Taddeo, foi presa durante operação para investigar o desvio de recursos públicos que deveriam ser utilizados para conter a pandemia da Covid-19. 


Em julho do ano passado, o TCE chegou a notificar o governador Rui Costa (PT) para que, no prazo de 20 dias, apresentasse os esclarecimentos ou documentos pertinentes ao assunto. Ele, no entanto, não se pronunciou.


De acordo com as informações disponibilizadas pelo Palácio de Ondina, foram pagos R$ 48.748.575,82 pelo Consórcio Nordeste por 300 respiradores – à época presidido por Rui –, dos quais R$ 9.749.715,16 foram desembolsados pelo governo baiano, que encomendou 60 destes aparelhos, que nunca foram recebidos.


As compras foram analisadas por técnicos do TCE que, em 15 de junho de 2020, emitiram um relatório preliminar sugerindo que a Corte determinasse aos gestores do estado “que toda e qualquer aquisição para o enfrentamento da pandemia se faça acompanhada da transparência devida”, e também opinando pela instauração  de “procedimentos apuratórios no âmbito da Administração, para investigar as atuações daqueles que deram causa à situação relatada, assim como sejam empregados todos os meios para os ressarcimentos dos valores despendidos sem as correspondentes entregas dos produtos”.


Os auditores da Corte de Contas ainda sugeriram a emissão de um alerta à Bahia e ao Consórcio Nordeste para que ambos “se abstenham de realizar compras fundamentadas em dispensas de licitação sem a estrita observância ao regramento legal”. 


O relatório gerou reações do PGE, que, no mesmo documento, solicitou a nulidade da auditoria realizada pelo TCE, entendendo que a Corte não possui competência para julgar o mérito, uma vez que, na visão do Estado, isto caberia ao tribunal do Piauí, estado do atual presidente do Consórcio Nordeste, o governador Wellington Dias (PT).


Diante deste contexto, segundo palavras da Procuradoria, “na extrema hipótese de a preliminar não ser acolhida”, há o pedido para declaração de incompetência da Corte de Contas baiana de julgar os fatos relacionados ao Consórcio. 


“Diante do exposto, a PGE Bahia requer que a análise das contratações e achados não alcance o Consórcio Nordeste, tendo em vista a competência do Tribunal de Contas do Estado do Piauí para julgar o feito e da PGE Piauí para exercer a defesa do Consórcio Nordeste”, justifica a PGE.


O procurador Ubenilson Colombiano ainda defende o estado do entendimento dos auditores de que o Governo “deveria ter sido ainda mais prudente e cercada de todas as salvaguardas legalmente previstas”. 


“No entanto, é preciso destacar que o Estado da Bahia realizou inúmeros procedimentos licitatórios e dispensas de licitação vocacionados ao enfrentamento da pandemia”, argumenta. 


“Acerca da contratação de respiradores, estamos falando de um equipamento essencial, pois um dos principais sintomas da Covid-19 é a insuficiência respiratória, sendo o respirador um equipamento de vida ou morte. (...) A disponibilidade de respiradores pulmonares para instalação da ventilação mecânica como uma abordagem terapêutica de suporte avançado de vida é, portanto, imprescindível para evitar óbitos”, acrescenta. 


No final de novembro, um parecer recomendou abertura de processo administrativo de apuração de responsabilidade decorrentes de danos ao erário por servidores ou agentes políticos, com objetivo de “ressarcir o erário estadual dos prejuízos ocorridos diante do descuido frente a não exigência da necessária garantia, ante o risco iminente da contratação em tela, que envolvia o pagamento antecipado de grande monta, destinado à empresa com capital social baixo, o que culminou com um dano ao erário substancial de difícil recuperação”. 


No mesmo parecer, ainda há a recomendação do auditor para que o processo seja encaminhado ao Ministério Público do Estado da Bahia (MP-BA). 


COMPRA FRUSTRADA


Em 2020, quando era presidido pelo por Rui, o Consórcio comprou um lote de 300 respiradores por R$ 48 milhões. O portal Bahia Notícias trouxe à tona os depoimentos da sócia da Hempcare, Cristiana Taddeo, e do CEO da BioGeoenergy, Paulo de Tarso, representantes das empresas envolvidas na operação. 


De acordo com a matéria, Tarso indicou, em depoimento à polícia, que Carlos Gabas, secretário-executivo do grupo, juntamente ao vice-governador João Leão (PP) e o ex-secretário Bruno Dauster (Casa Civil) – exonerado após o escândalo –, “tutelaram” no negócio o suposto intermediário do governo baiano, Cleber Isaac


Segundo Cristiana Taddeo, Isaac teria recebido uma comissão de R$ 3 milhões por ter facilitado a negociação com o Consórcio Nordeste. A relação entre ambos teria acontecido após uma ponte feita por um homem chamado Fernando Galante. Para isto, Cristiana teria pago o montante de R$ 9 milhões pela facilitação no contato.  O trio possuía um grupo no WhatsApp.


O depoimento da empresária cita que Gabas, quando entrou em contato com ela, se identificou como “irmão de alma” do prefeito de Araraquara (SP), Edinho Silva (PT), e pontuou que a cidade paulista precisaria de 30 respiradores, mas que não teria verba e o pedido teria vindo implícito.


Reportagem da Veja diz que o Ministério Público apontou que o caso se tratava de propina disfarçada. Gabas negou em julho qualquer irregularidade e chamou a empresária de criminosa. 


No início de outubro, ele foi convocado pela CPI da Covid do Rio Grande do Norte, mas permaneceu em silêncio durante o depoimento. Isto foi possível após a Justiça do estado conceder habeas corpus para que o ex-ministro não precisasse responder aos questionamentos dos deputados.


Em junho do ano passado, Gabas ele teve convocação negada para depor na CPI da Covid, no Congresso. Três requerimentos com o mesmo conteúdo foram apresentados pelos senadores governistas Eduardo Girão (Podemos-CE), Marcos Rogério (DEM-RO) e Ciro Nogueira (PP-PI) – atual ministro-chefe da Casa Civil do governo Bolsonaro. 


Em dezembro do ano passado, a CPI potiguar pediu o indiciamento de Rui Costa, Dauster e da governadora do RN, Fátima Bezerra (PT), pela compra frustrada de 30 respiradores pelo Rio Grande do Norte junto à Hempcare. 


Em território baiano, não há investigações no Legislativo contra Rui. Contudo, o grupo de oposição tenta levantar assinaturas para formar uma comissão semelhante à do Rio Grande do Norte. No estado, apurações são comandadas no âmbito da Polícia Civil pela delegada Fernanda Maria Ásfora. 


“Os trabalhos vão voltar e nós vamos finalizar a coleta das assinaturas. Hoje, não termos assinaturas com o número regimental previsto para abrir uma CPI, mas estamos atentos e tentando convencer os colegas a assinar a peça para formação”, explicou o líder da oposição na Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), Sandro Régis, ao Aratu On. 


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