Júri popular: entenda como funciona e quando é aplicado

Aratu On conversou com as advogadas Daniela Portugal e Mayana Sales para entender quais etapas são necessárias para condenar ou inocentar alguém

Por Anna Caroline Santiago.

“Mas quem sou eu para julgar?”

Essa frase surge em meio a conversas e fofocas, mas você sabia que, de forma legal, é possível julgar alguém próximo a você? É o que acontece no júri popular, onde cidadãos comuns se tornam “juízes leigos” e decidem o destino de um acusado.

Para explicar como funciona esse processo, quem pode participar e quais etapas são necessárias para condenar ou inocentar alguém, o Aratu On conversou com a advogada criminalista Daniela Portugal.

Júri popular: entenda como funciona e quando é aplicado.Foto: Rosinei Coutinho | STF

Tribunal do Júri: a sociedade na Justiça

O Tribunal do Júri é um dos pilares do sistema judiciário brasileiro quando se trata de crimes dolosos contra a vida. É nele que cidadãos comuns podem decidir sobre a culpa ou inocência de um réu, garantindo que a sociedade participe diretamente dos rumos da Justiça.

“Esses jurados são cidadãos comuns que, de forma democrática, ajudam a construir a justiça penal ao decidir crimes dolosos contra a vida”, explica Daniela. Ela ressalta, porém, que por serem leigos, os jurados não têm formação técnica suficiente para aplicar a lei como um juiz profissional.

Crimes julgados pelo júri popular

O júri popular lida com crimes dolosos contra a vida, ou seja, aqueles cometidos com intenção consciente. Entre eles:

  • Homicídio

  • Infanticídio – quando a mãe mata o próprio filho durante o parto ou logo após

  • Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio

  • Aborto – provocado pela gestante ou por terceiros

O Tribunal do Júri avalia tanto os crimes consumados quanto os tentados.

Etapas de preparação do júri

 Júri popular lida com crimes dolosos contra a vida, ou seja, aqueles cometidos com intenção consciente.Foto: Reprodução

Antes do julgamento, o processo passa por investigação e instrução:

  1. Pré-processual: coleta de provas, oitivas de testemunhas e perícias, normalmente por meio de inquérito policial.

  2. Fase processual: dividida em duas etapas:

    • Judicium Accusationis (juízo de acusação): instrução e produção de provas.

    • Judicium Causae (juízo da causa): julgamento em plenário pelos jurados, analisando materialidade, autoria e circunstâncias, decidindo sobre condenação ou absolvição.

Além disso, há decisões intermediárias que podem ocorrer antes do júri:

  • Pronúncia: o réu vai a julgamento, pois há provas suficientes.

  • Impronúncia: a acusação é afastada por falta de provas.

  • Absolvição sumária: o réu é absolvido sem ir a julgamento.

  • Desclassificação: o crime não é doloso contra a vida e é julgado por um juiz singular.

Seleção dos jurados

O júri popular começa com 25 cidadãos sorteados, mas apenas 7 compõem o conselho de sentença. Para se tornar jurado, é preciso:

  • Ter mais de 18 anos

  • Ser eleitor

  • Não ter antecedentes criminais

  • Concordar em prestar o serviço voluntariamente

Algumas condições impedem a participação, como deficiências auditivas, visuais ou doenças neurodivergentes.

Os candidatos se alistam no Tribunal do Júri da cidade, apresentando documentos como identidade, CPF, certidão negativa criminal e atestado de bons antecedentes.

“Juízes leigos”: experiência e julgamento

Daniela Portugal lembra que todos julgamos, de alguma forma, a partir de nossas experiências pessoais e sociais. “Isso vale tanto para jurados leigos quanto para juízes togados. O que muda é a profundidade técnica, mas o julgamento humano tem sempre um componente social”, afirma.

No júri, os jurados votam em urna secreta. A decisão da maioria, ou seja, 4 de 7 votos, define o destino do réu.

Desafios do júri popular

Segundo a advogada Mayana Sales, especialista em Direito Penal, o júri popular apresenta desafios específicos:

  • Produção e valoração de provas: a defesa não tem o mesmo aparato investigativo do Estado.

  • Inquirição de testemunhas: é preciso explorar contradições sem perder credibilidade.

  • Convencimento dos jurados: traduzir argumentos jurídicos complexos em linguagem clara, acessível e impactante.

  • Compreensão sociocultural: conhecer a realidade e perfil dos jurados ajuda na comunicação.

A decisão da maioria, ou seja, 4 de 7 votos, define o destino do réu.Foto: Imagem Ilustrativa | Freepik

Sanidade mental do réu

Quando há dúvida sobre a integridade psíquica do acusado, o processo é suspenso para análise de inimputabilidade. Se declarado inimputável, o caso não vai ao júri popular, e aplica-se medida de segurança.

Estratégias de defesa e qualificadoras do crime

Mayana explica que cada qualificadora gera estratégias específicas para reduzir a pena:

  • Motivo torpe: humanizar o réu, mostrando que não agiu por perversidade.

  • Meio cruel: demonstrar ausência de sofrimento especial da vítima.

  • Recurso que dificultou defesa da vítima: provar que houve confronto ou resistência.

Papel do juiz e dos jurados

No júri:

  • Conselho de sentença (7 jurados): decide sobre materialidade, autoria e qualificadoras, acolhendo ou não teses defensivas.

  • Juiz-presidente: fixa a pena concreta em caso de condenação, seguindo critérios legais (art. 68 do Código Penal).

Ou seja, os jurados julgam os fatos, enquanto o juiz aplica a pena.

Casos recentes que foram a júri popular

Iuri Sheik

O influenciador Iuri Sheik foi submetido a júri popular em maio deste ano e deu detalhes sobre o episódio que resultou na morte do empresário William Oliveira, durante uma festa em 2019. Em depoimento no Fórum de Santo Antônio de Jesus, no Recôncavo da Bahia, cidade onde o crime ocorreu, Iuri negou ter assassinado o empresário.

Antes do início da sessão, em entrevista à imprensa, o réu voltou a negar responsabilidade pela morte de William, que na época tinha 27 anos e era empresário da banda Black Style. A declaração contrasta com o depoimento prestado por ele em 2019, quando confessou o crime.

Em vídeos que circulam nas redes sociais, Iuri Sheik apresenta sua versão sobre a briga que teria ocorrido em uma festa do tipo “paredão”, durante o São João de 2019.

"Eu não atirei nas costas dele. Dei o primeiro disparo, que pegou nele e ele girou. Quando ele girou, pode ser que o segundo tenha sido [nas costas]", disse Iuri Sheik. O réu alegou que era perseguido por William por conta de ciúmes envolvendo uma ex-companheira da vítima.

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