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Copa 2023: Na despedida de Marta e chegada de nova geração, Brasil quer honrar passado de luta com título inédito

País tem histórico de perseguições e descaso ao futebol feminino, mas usa de perseverança e talento para seguir como um dos países com mais presenças no Mundial

Por Da Redação

Copa 2023: Na despedida de Marta e chegada de nova geração, Brasil quer honrar passado de luta com título inédito

Até o dia 20 de julho, Aratu On traz perfis especiais sobre todas as seleções que disputarão a Copa do Mundo de Futebol Feminino 2023, sediada nos países da Austrália e Nova Zelândia. Será uma equipe por dia, seguindo o ranking feminino da FIFA em ordem decrescente, com exceção do Brasil que será o último perfil. Confira aqui as publicações anteriores desse especial.


Conhecido como País do Futebol, o Brasil tem uma ampla dominância em títulos masculinos, além do grande número de atletas que atuam em todos os campeonatos de importância do planeta. Entretanto, esta não é a mesma realidade da versão feminina do mesmo esporte. Perseguida e proibida por mais de 40 anos, a modalidade vive sob a realidade de díficil reconhecimento e pouco apoio, brilhando pelo talento e perseverança das atletas que vestem a camisa da Seleção durante sua história.


Primeiros registros, primeiras dificuldades


O futebo chegou ao Brasil no final do século XIX e rapidamente se popularizou pelo país. Naquele momento, a organização do esporte se restringia em termos oficiais a uma elite que atrelava o jogo a uma convenção social quase cavalheresca. Entretanto, classes menos favorecidas também passaram a criar seus próprios clubes e campeonatos, enfurecendo as autoridades que tentatam restringir os locais e as agremiações que pudessem praticar o desporto bretão.


Dentro disso, as mulheres estiveram presentes em polêmicas envolvendo o futebol. Por ser praticado muito mais nas periferias, era combatido não só por conta dos equivocos cientificos que existiam na época, como também pela opinião pública que induzia a mulher para uma posição de servidão e apoio nas arquibancadas.


Oficialmente, a primeira partida de futebol feminino no Brasil ocorreu em 1921 entre dois grupos de mulheres dos bairros paulistas de Tremenbé e Cantareira, noticiado pela imprensa como um evento "cômico e curioso". A rejeição a modalidade era tão grande, que um decreto dos anos 40 proibiu que mulheres praticassem a modalidade, considerada "incompatível com a natureza feminina".


Nos anos 60, em meio a Ditadura Militar que assolava o país, a lei é detalhada para combater o grande número de práticas clandestinas que existiam no país desde a proibição. Entretanto, em 79, o decreto é revogado e liberado na nação. Entretanto, a falta de apoio das entidades profissionais brasileiras faz com que o futebol feminino siga na marginalidade e no amadorismo por muitos e muitos anos. Nem mesma a criação da Seleção Feminina, em 86, muda este panorama.


Primeiras competições e títulos


Convidada a integrar o Torneio Experimental da FIFA em 1988, a Seleção Feminina usou como base o elenco do Esporte Clube Radar, equipe carioca que tinha um currículo e estrutura inegáveis para a modalidade no Brasil daquele período. Entretanto, o descaso com a equipe era tão grande que o jogo de uniformes era a sobra de peças da equipe masculina, e o grupo não tinha tradutores, alimentação ideal e sequer dinheiro para suprir os gastos.


Nessa equipe, atletas como Sissi, Roseli e Michael Jackson já eram nomes que se destacavam e atuavam em equipes brasileiras. Um grupo jovem que estreou com derrota para a Austrália (1 a 0), se recuperou vencendo a forte Noruega (2 a 1) e goleou a Tailândia (9 a 0). Nas quartas, passou pela Holanda (2 a 1) e pegou novamente as norueguesas, perdendo nos minutos finais por 2 a 1. No terceiro lugar, conseguiram vencer a China nos penaltis para assegurar um elogiado resultado no certame.




Com os planos de uma Copa do Mundo concretizados, foi criada também uma Copa América para dar vaga ao representante da América do Sul no torneio. E o Brasil dominou a competição, sempre conseguindo chegar ao Mundial de forma direta.


Na primeira edição do torneio, apenas três países (Brasil, Chile e Venezuela) participaram da competição, com as canarinhas vencendo sem dificuldade a seletiva. Na sua primeira Copa, o Brasil teve quase a mesma equipe utilizada no Torneio Experimental, mas não conseguiu repetir a campanha anterior: venceu o Japão por 1 a 0, mas perdeu para os EUA por 5 a 0 e para a Suécia por 2 a 0. Na Copa de 95, depois de um Sul-Americano com direito a 13 a 0 contra o Equador e 15 a 0 contra o Bolívia, novo fracasso vencendo a Suécia por 1 a 0, mas derrotado pelo Japão por 3 a 1 e a Alemanha por 6 a 1. Um destaque que vale ser lembrado é que nesta edição temos a estreia da baiana Formiga, recordista de participações em Copas com sete presenças.


O título da Copa América ainda deu a vaga para a primeira edição dos Jogos Olímpicos da modalidade, em 1996. Com um time já de veteranas, a exemplo de Meg, Fanta, Suzy, Pretinha (artilheira da competição), Sissi e Roseli, a Seleção não fez feio e subiu de patamar. Empatou com a Noruega por 2 a 2, derrotou o Japão por 2 a 0 e empatou novamente com a Alemanha por 1 a 1. Nas semifinais, caiu perante a China por 3 a 2 e ficou em quarto lugar ao ser derrotada por 2 a 0 contra a Noruega.


Dois anos depois, novo título sul-americano com 100% de aproveitamento e uma Copa do Mundo para ficar marcada na história. Liderou a chave ao golear o México (7 a 1), vencer a Itália (2 a 0) e empatar com a Alemanha (3 a 3). Nas quartas, derrotam a Nigéria por 4 a 3 e chegam as semifinais para serem derrotadas pelos EUA por 2 a 0. Na decisão do terceiro lugar, superam a Noruega na disputa de penalidades e fazem o pódio atrás de americanas e chinesas. Outro destaque é a baiana Sissi, artilheira do torneio com sete gols.




A equipe vai empolgada aos Jogos Olímpicos do ano 2000, vencendo Suécia e Austrália na primeira fase e sofrendo um revés contra as alemães. Nas semi, nova derrota para os EUA por 1 a 0 e outro quarto lugar contra as germânicas novamente.


A Era Marta e o Vice de 2007


A Copa de 2003 vem depois de mais um título impecável do Brasil no Sul-Americano e tem como grande destaque a estreia de Marta, que mesmo jovem já chamava atenção pelo seu talento com a bola no pé. Foi dela o primeiro gol da equipe no torneio, ao vencer a Coreia do Sul por 3 a 0. Na segunda todada, Marta também participou do 4 a 1 sobre a Noruega e não pôde ajudar sua equipe no empate em 1 a 1 contra a França. Entretanto, o time caiu perante a Suécia por 2 a 1 e deu adeus ao Mundial nas quartas de final.


Além de Formiga e Marta, esta equipe ainda tinha em seu elenco a estreia da atacante Cristiane e a participação de Milene Domingues, a rainha das embaixadinhas e esposa de Ronaldo Fenômeno na época. No mesmo ano, o Brasil foi medalhista de ouro no Pan-americano de Santo Domingo.


Esta é considerada por muitos como a geração de ouro brasileira, e sua caminhada estava apenas começando. Pelos Jogos de 2004, a equipe cai apenas para os EUA na primeira fase, derrotando Austrália e Grêcia para conseguir a classificação. Nas quartas, nova goleada sobre o México e vitória sobre a Suécia nas semifinais. Na decisão, novamente as americanas se tornam algozes da equipe, que com a derrota ficam com a prata, sua primeira medalha.


Em 2006, Marta se torna a melhor do mundo pela primeira vez e um ano depois comanda o Brasil na sua melhor campanha em copas. No torneio sediado na China, a brasileira se iguala a Sissi no número de gols marcados em um Mundial (7) e pavimenta o caminho da Seleção. O curioso é que nesta época o Brasil não vence a Copa América, perdendo pontos no torneio pela primeira vez na história (sequer havia empatado antes).


100% na fase de grupos ao derrotar a Nova Zelândia por 5 a 0, a China por 4 a 0 e a Dinamarca por 1 a 0. Nas quartas, vencem as australianas por 3 a 2 e chegam as semifinais para golear o temido Estados Unidos por 4 a 0. Este, até hoje, é um dos piores placares sofridos pela equipe norte-americana. Infelizmente, na decisão, o Brasil cai perante uma excepcional Alemanha e fica com o inédito vice-campeonato mundial.



Um ano depois, novamente na China, o Brasil amarga outra medalha de prata nos Jogos de Pequim. Empatam com a Alemanha na primeira fase, com triunfos sobre Coreia do Norte e Nigéria. Depois passam pela Noruega e enfim se vingam das germânicas nas semifinais. Porém, chegam na decisão e perdem para os Estados Unidos por 1 a 0, chegando a sua segunda prata.
Internamente, o cenário esportivo era tímido e quase sem apoio. Federações tinham campeonatos regionais bastante irregulares, e o nacional era resumido em competições de baixa competitividade e com disputa muito rápida. Isso acabaria refletindo na Seleção, que passaria a ter dificuldades por conta do evolução técnica que acontecia na Europa, América do Norte e Japão.
Para a Copa de 2011, o Brasil tem outro início imbátivel ao não dar chances para Austrália, Noruega e Guiné Equatorial. Entretanto, reecontra os Estados Unidos em uma emocionante quartas de final que termina em 2 a 2 no tempo normal e prorrogação. Na disputa de penalidades, perde por 5 a 3 e dá adeus a uma campanha que muitos consideram uma das mais professoras do time.
Fim de uma era e recomeço
Ainda com a mesma base, o Brasil chega aos Jogos de Londres e tem dois resultados importantes para sua eliminação precoce: depois de vencer Camarões e Nova Zelândia, perdem para a Grã-Bretanha e depois para o Japão nas quartas, voltando mais cedo para casa.
O resultado faz a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) se movimentar, criando uma alternativa de mudança que não se mostraria tão viável: uma seleção feminina permanente. Mesmo que a medida fosse para dar estabilidade financeira as melhores jogadoras do país, ela isolava o time e fazia pouco caso do irregular cenário de clubes na modalidade.
Na Copa América de 2014 o Brasil é derrotado mais uma vez e tem seu primeiro empate, mas isso não impede o hexacampeonato continental. Na Copa do ano seguinte, no Canadá, o time sente o revés de um cenário atrasado e sem melhorias técnicas ao ser derrotado pela emergente Austrália nas oitavas de final. As duas equipe vão ainda disputar mas duas outras partidas em torneios oficiais futuros, criando uma nova rivalidade a Seleção Canarinho.
Nos Jogos do Rio 2016, o "fator casa" deu incentivo a uma equipe mesclada de velhas e novas caras no plantel. Depois de venceram com autoridade China e Suécia, garantiram a liderança com um empate com a África do Sul. Nas quartas, superaram a Austrália em um emocionante e tenso empate sem gols, derrotando as visitantes na disputa de penalidades. Contra a Suécia, nova disputa de tiros livres que acabou com triunfo escandinavo e decepção de toda uma nação. Na disputa do Bronze, um quarto lugar após perder da Dinamarca.

Ainda vivendo um processo de renovação e transição, o país vai a Copa de 2019 com uma equipe questionada e desacreditada pela torcida. E mesmo depois de vencer a Jamaica na estreia, a Seleção perde de virada para as australianas, conseguindo a classificação como uma das melhores terceiras colocadas ao derrotar a Itália na terceira rodada.
Apesar da campanha ruim na primeira fase, a equipe faz um jogo de igual para igual com a França nas oitavas, vendenco caro sua derrota. Perdem de 2 a 1 na prorrogação, dando adeus a mais um torneio. Anos depois, em Tóquio, goleiam China e Zambia, perdendo a primeira posição depois de um empate contra as holandesas e menor saldo de gols contra as adversárias. Apesar de estarem com um desempenho melhor que do Mundial, não resistem a retranca canadense e são eliminadas na disputa de penalidades.
Brasil na Copa do Mundo 2023
Sob o comando da experiente treinadora Pia Sundhage - que também comandou o grupo na disputa dos Jogos de Tóquio - o Brasil passa por uma renovação não só de elenco, mas também de mentalidade. Anos atrasada em relação as mudanças ocorridas no futebol feminino, a equipe verde e amarela agora tem feito bons jogos contra equipe europeias, conseguindo rivalizar com as atuais potências do cenário.
Um exemplo disso é a decisão da Finalíssima, no qual as Guerreiras defenderam o octacampeonato continental em um jogo único contra as inglesas, vencedoras da última Euro. Mesmo derrotadas nos penaltis, as brasileiras fizeram um jogo duro e não se intimidaram, mostrando que tem talento e capacidade de ir longe na Copa do Mundo de 2023.
Para chegar lá, a equipe conta com uma presença que transborda talento e liderança dentro e fora de campo: Marta, seis vezes melhor do mundo, vem a sua última Copa e tem talento de sobra para ajudar outras atletas que se destacam no atual time. Uma delas é a zagueira baiana Rafaelle, que está em ótima forma e quer ajudar defensivamente o país na conquista do título inédito.

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