Longe da guerra, música ajuda a harmonizar vidas de jovens ucranianos acolhidos em Salvador
Atualmente, três moças e um rapaz fazem parte de um projeto que pretende abrigar dez pessoas e permite que eles continuem exercendo suas atividades, neste momento de conflito no leste europeu.
Indiscutivelmente, essa é uma melodia bastante conhecida! A canção de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira é o grande hino que relata as lamúrias do sertanejo, castigado pela seca do nordeste brasileiro.
Mas essa é uma versão pra lá de curiosa! A música é cantada por um ucraniano em seu idioma natal. O que poderia ter motivado a interpretação e a sensibilidade despertada por essa mensagem em alguém que nasceu bem longe daqui?
O musicista Illia Danko, 18 anos, chegou ao Brasil há pouco mais de um mês. Assim como a nossa asa branca do sertão, ele voou em busca de refúgio, em tempos difíceis para sobreviver no lugar que lhe pertence.
Seu país vive em época de guerra e foi invadido pelo exército russo. Antes disso, ele estudava em uma academia de música de Kiev, a capital da Ucrânia, e tocava alguns instrumentos de cordas, entre eles a “bandura”, que é típico na região.
Em Salvador, acolhido pelo governo estadual, através do Neojiba (Núcleos Estaduais de Orquestras Juvenis e Infantis da Bahia), ele integra uma campanha criada com o objetivo de ajudar jovens músicos ucranianos a continuarem exercendo suas atividades, neste momento de conflito no leste europeu.
Atualmente, além de Illia, três meninas fazem parte do projeto que pretende abrigar dez pessoas. O rapaz, até então, foi o último a chegar e passou por um processo bem complicado para sair da Ucrânia, conforme explicou Volha Yermalayeva Franco ao Aratu On.
Ela é uma belarussa, de 33 anos, mora há mais de dez no Brasil, é professora de idiomas e está atuando como uma facilitadora na comunicação desses jovens. Segundo Volha, desde que Illia soube da oportunidade, fez várias tentativas de participar do programa, mas só conseguiu sair do país na sétima vez.
"Nesse período de guerra, os homens com idades entre 18 e 60 anos não podem deixar a Ucrânia. Por isso, ele foi barrado várias vezes na fronteira", comentou a professora. Contudo, o jovem disse à nossa reportagem, que um convite oficial do Neojiba acabou permitindo a sua saída.
"Os homens não podiam deixar o país, a não ser para algumas atividades: quem estava estudando fora poderia sair". O jovem acrescentou, porém, que em seu caso, isso só aconteceu após o convite ser reescrito algumas vezes para se adequar às exigências.
Ao seu lado, na sede do Neojiba, nossa reportagem encontrou Vladyslava Danyliuk ou, simplesmente, Vlada. A cantora lírica, de 20 anos, havia se refugiado em Varsóvia, na Polônia, até desembarcar em Salvador, no início do mês de abril.
A jovem estudava canto em uma academia de música em Odessa, cidade da costa ucraniana, e tinha planos de participar de espetáculos com fragmentos de ópera, mas infelizmente vieram os ataques e isso não foi possível.
Vlada conta que aos 6 anos já gostava de música, interesse nada surpreendente para quem cresceu ao lado de especialistas: a mãe tocava violino e a avó era pianista. Isso não quer dizer que o seu desejo encontrou incentivo. “Elas sabiam que a música é muito legal, mas diziam que eu não iria ganhar dinheiro com isso”, pontuou.
A jovem compartilhou, ainda, que quando era pequena queria ser como a Lady Gaga, “depois conheci o canto de ópera, me inspirei na cantora ucraniana Solomiya Krushelnytska e me apaixonei pelo vocal acadêmico”, revelou Vlada.
Apesar das preocupações com a guerra, eles tentam harmonizar a vida com a oportunidade que ganharam para fazer o que mais gostam. “Enquanto estou aqui no Neojiba, eu quero aperfeiçoar as minhas habilidades musicais e quero aprender mais sobre a música brasileira e a cultura do Brasil”, disse Illia.
As aspirações de Vlada não são diferentes. A cantora pretende participar dos concertos e apresentações do Neojiba e, logo, poder retornar ao seu país e continuar sua carreira. “Quando eu voltar, eu quero terminar a academia de música, em Odessa, depois disso tentar achar um emprego como cantora de ópera”, disse.
Além da dupla, Olesia Matei, de 27 anos, e Maria Sorokina, 16, estão integrando o grupo. No Neojiba, elas realizam atividades em turno diferente e não estavam presentes, durante a visita de nossa reportagem.
Olesia, a primeira a chegar, é uma cantora lírica do Teatro Nacional de Opereta de Kiev. Ela já se apresentou como solista com a National Philharmonic of Ukraine e outras orquestras do seu país e em performances individuais na Áustria, Polônia, Hungria, França e Itália.
Sorokina é musicista e foi a última, entre as meninas, a desembarcar em Salvador. A adolescente está tendo a oportunidade de exercitar o seu talento participando da Orquestra do maestro Ricardo Castro.
Vlada, Sorokina e Olesia posam com o maestro Ricardo Castro (Foto: Elói Correa - GOVBA)
O NEOJIBA
Criado em 2007, o Neojiba promove o desenvolvimento e integração social prioritariamente de crianças, adolescentes e jovens em situações de vulnerabilidade, por meio do ensino e da prática musical coletivos.
O programa do governo baiano é vinculado à Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social, e gerido pelo Instituto de Desenvolvimento Social Pela Música (IDSM). No projeto que acolhe os ucranianos, o IDSM se responsabiliza pela emissão de vistos e custeio de todas as despesas dos jovens, como deslocamento da viagem, hospedagem, refeições, ajuda de custo, além de oferecer apoio social e psicológico.
As inscrições são feitas pelo email neojiba.help.ukraine@gmail.com, com o pedido de envio de currículo, endereço, links de registros de apresentações musicais e informações sobre o aeroporto mais próximo.
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