10 anos das Jornadas em Salvador: 'movimento marcou jogo político do Brasil', afirma autor de livro sobre movimento
Para Thiago Ferreira, grupos que questionavam a democracia brasileira e minorias que exigiam mais espaço na política ganharam força no país depois das manifestações de 2013
Na última reportagem da série especial do Aratu On sobre os 10 anos das Jornadas de Junho em Salvador, o doutor em comunicação e pesquisador baiano Thiago Ferreira analisou o evento histórico e os impactos sociais do movimento. Em 2019, Thiago publicou a tese de doutorado "Transformações de políticas e afetos no Brasil: contextualizando radicalmente o acontecimento Junho de 2013 em fluxos audiovisuais" pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). A tese se tranformou em um livro, lançado em 2021.
As Jornadas de Junho de 2013 começaram como um protesto provocado pelo aumento de R$ 0,20 na passagem do transporte público em São Paulo, mas agregaram outras pautas e se espalharam pelo país. Em Salvador, as marchas reuniram milhares de pessoas e ficaram marcadas por confrontos entre manifestantes e policiais. No Brasil, as Jornadas tiveram impacto na política nacional e também em grupos sociais minoritários, que exigem maior representatividade política. É o que aponta Thiago Ferreira.
Para o pesquisador, há dois eixos de transformação principais provocados pelas Jornadas: o eixo do que chama de "movimentos autonomistas", que questionam o modo de organização da política brasileira e da democracia, e o eixo da reivindicação de uma presença maior de pessoas marginalizadas em posições de poder. "Quando eu falo de presença, estou falando de visibilidade, mas, também, de ação. Há uma reivindicação desses sujeitos falando: 'nós estamos aqui na cena pública e precisamos ser percebidos'", afirma o pesquisador.
Confira aqui a análise do pesquisador sobre as Jornadas em Salvador:
Vídeo: Flávia Alexandre | Edição: José Neto
"Movimento marcou jogo político do Brasil"
Na época que as manifestações começaram em Salvador, Ferreira estava dando aula durante um mestrado na UFBA. Inicialmente, o estudioso também foi às ruas protestar. "Fui para as ruas entender o que tava acontecendo. Tinha uma responsabilidade de estar em sala e pensar junto com os alunos, mas também viver aquela experiência, ir pra rua para reivindicar direitos", diz o autor do livro sobre as marchas.
O pesquisador afirma que, através dessa experiência, as Jornadas se tornaram interesse de pesquisa para ele. "Junho de 2013 entrou na minha tese porque percebo que isso estava ali conformando o que era o Brasil, faço o exercício de entender radicalmente o que foi esse processo e como ele marcou todo o jogo político que se estabelece no Brasil depois daqueles anos".
"Sentimento antissistema de Junho de 2013 foi cooptado"
O pesquisador explica que houve uma ampliação das pautas do movimento, envolvendo, para além do transporte público, temas como educação, saúde e corrupção. "Essa difusão de pautas foi a minha primeira visada estando na rua. Mas, depois, eu vejo outros ativistas participando [das marchas], outras pessoas que começam a estar presente nas ruas", afirma.
Até mesmo os embates com a polícia provocaram essa presença diversa de ativistas nas marchas. "A violência policial impacta no próprio comportamento dos manifestantes. Há um aumento exponencial da presença das pessoas nas ruas a partir da reação da polícia. Isso entra na conta dessa diversidade de pessoas, ativistas e sujeitos [nas Jornadas]".
Para Ferreira, as mudanças no tema central das reivindicações e a entrada de outras pautas marcam uma disputa no meio político entre organizações antidemocráticas e grupos minoritários. Diferente de posicionamentos como o do ativista Onã Rudá, Ferreira não considera que as marchas foram "um erro", mas, sim, uma "briga" por diversas causas. Ele cita, por exemplo, o crescimento de movimentos de direita ou extrema direita:
"Sujeitos políticos reivindicam participar da política e da universidade"
Nesse contexto, para Ferreira, existem dois aspectos que devem ser observados: o jornalismo e a universidade. De acordo com o pesquisador, os veículos de comunicação precisaram criar uma proximidade com o público-alvo que, naquele momento, eram os manifestantes. Ferreira destaca a importância do coletivo de jornalismo independente Mídia Ninja nas coberturas.
"Eles [os profissionais do Mídia Ninja] vão para as manifestações, mas, uma das coisas que eles fazem é estar no eixo, próximos aos manifestantes. Não fazem coberturas distantes, como o Jornal Nacional, que usava as imagens da Mídia Ninja para contar essa história", lembra o estudioso.
Para ele, porém, a própria universidade e o ambiente acadêmico também entram em questão nas Jornadas. "São os mesmos sujeitos políticos reivindicando participar da política e da universidade, trazendo outros saberes, disputando uma forma de organização que não dá conta do conhecimento estabelecido em certos lugares".
*Essa é a terceira reportagem da série de entrevistas de Aratu On sobre as Jornadas de Junho de 2013 em Salvador. Na primeira reportagem, o ativista Onã Rudá falou sobre a perpectiva da militância sobre as marchas de 2013. Na segunda reportagem da série, o jornalista e apresentador Pablo Reis analisou os impactos do movimento no jornalismo.
Acompanhe nossas transmissões ao vivo no www.aratuon.com.br/aovivo. Siga a gente no Insta, Facebook e Twitter. Quer mandar uma denúncia ou sugestão de pauta, mande WhatsApp para (71) 99940 – 7440. Nos insira nos seus grupos!
As Jornadas de Junho de 2013 começaram como um protesto provocado pelo aumento de R$ 0,20 na passagem do transporte público em São Paulo, mas agregaram outras pautas e se espalharam pelo país. Em Salvador, as marchas reuniram milhares de pessoas e ficaram marcadas por confrontos entre manifestantes e policiais. No Brasil, as Jornadas tiveram impacto na política nacional e também em grupos sociais minoritários, que exigem maior representatividade política. É o que aponta Thiago Ferreira.
Para o pesquisador, há dois eixos de transformação principais provocados pelas Jornadas: o eixo do que chama de "movimentos autonomistas", que questionam o modo de organização da política brasileira e da democracia, e o eixo da reivindicação de uma presença maior de pessoas marginalizadas em posições de poder. "Quando eu falo de presença, estou falando de visibilidade, mas, também, de ação. Há uma reivindicação desses sujeitos falando: 'nós estamos aqui na cena pública e precisamos ser percebidos'", afirma o pesquisador.
Confira aqui a análise do pesquisador sobre as Jornadas em Salvador:
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Vídeo: Flávia Alexandre | Edição: José Neto
"Movimento marcou jogo político do Brasil"
Na época que as manifestações começaram em Salvador, Ferreira estava dando aula durante um mestrado na UFBA. Inicialmente, o estudioso também foi às ruas protestar. "Fui para as ruas entender o que tava acontecendo. Tinha uma responsabilidade de estar em sala e pensar junto com os alunos, mas também viver aquela experiência, ir pra rua para reivindicar direitos", diz o autor do livro sobre as marchas.
O pesquisador afirma que, através dessa experiência, as Jornadas se tornaram interesse de pesquisa para ele. "Junho de 2013 entrou na minha tese porque percebo que isso estava ali conformando o que era o Brasil, faço o exercício de entender radicalmente o que foi esse processo e como ele marcou todo o jogo político que se estabelece no Brasil depois daqueles anos".
"Sentimento antissistema de Junho de 2013 foi cooptado"
O pesquisador explica que houve uma ampliação das pautas do movimento, envolvendo, para além do transporte público, temas como educação, saúde e corrupção. "Essa difusão de pautas foi a minha primeira visada estando na rua. Mas, depois, eu vejo outros ativistas participando [das marchas], outras pessoas que começam a estar presente nas ruas", afirma.
Até mesmo os embates com a polícia provocaram essa presença diversa de ativistas nas marchas. "A violência policial impacta no próprio comportamento dos manifestantes. Há um aumento exponencial da presença das pessoas nas ruas a partir da reação da polícia. Isso entra na conta dessa diversidade de pessoas, ativistas e sujeitos [nas Jornadas]".
Para Ferreira, as mudanças no tema central das reivindicações e a entrada de outras pautas marcam uma disputa no meio político entre organizações antidemocráticas e grupos minoritários. Diferente de posicionamentos como o do ativista Onã Rudá, Ferreira não considera que as marchas foram "um erro", mas, sim, uma "briga" por diversas causas. Ele cita, por exemplo, o crescimento de movimentos de direita ou extrema direita:
"O Movimento Brasil Livre [MBL] surge pegando o sentimento antissistema. Isso vai dar nos anos seguintes às disputas, seja em 2016 [impechment da presidente Dilma Rousseff] seja em 2018 [eleição do ex-presidente Jair Bolsonaro]. Mas não faço uma relação de causa e efeito. Tem outros elementos que precisam ser observados. O sentimento antissistema que está ali, como grande característica de Junho de 2013 continuou e acaba sendo cooptado e apropriado por sujeitos outros, como Bolsonaro e outros políticos que estão ao redor dele".
"Sujeitos políticos reivindicam participar da política e da universidade"
Nesse contexto, para Ferreira, existem dois aspectos que devem ser observados: o jornalismo e a universidade. De acordo com o pesquisador, os veículos de comunicação precisaram criar uma proximidade com o público-alvo que, naquele momento, eram os manifestantes. Ferreira destaca a importância do coletivo de jornalismo independente Mídia Ninja nas coberturas.
"Eles [os profissionais do Mídia Ninja] vão para as manifestações, mas, uma das coisas que eles fazem é estar no eixo, próximos aos manifestantes. Não fazem coberturas distantes, como o Jornal Nacional, que usava as imagens da Mídia Ninja para contar essa história", lembra o estudioso.
Para ele, porém, a própria universidade e o ambiente acadêmico também entram em questão nas Jornadas. "São os mesmos sujeitos políticos reivindicando participar da política e da universidade, trazendo outros saberes, disputando uma forma de organização que não dá conta do conhecimento estabelecido em certos lugares".
*Essa é a terceira reportagem da série de entrevistas de Aratu On sobre as Jornadas de Junho de 2013 em Salvador. Na primeira reportagem, o ativista Onã Rudá falou sobre a perpectiva da militância sobre as marchas de 2013. Na segunda reportagem da série, o jornalista e apresentador Pablo Reis analisou os impactos do movimento no jornalismo.
Acompanhe nossas transmissões ao vivo no www.aratuon.com.br/aovivo. Siga a gente no Insta, Facebook e Twitter. Quer mandar uma denúncia ou sugestão de pauta, mande WhatsApp para (71) 99940 – 7440. Nos insira nos seus grupos!