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Legal x Moral: casamentos envolvendo adolescentes podem trazer impactos emocionais? Entenda o caso

O casamento do prefeito de Araucária, no Paraná, Hissam Hussein (Cidadania), de 65 anos, com uma adolescente de 16, gerou polêmica no país por envolver alguém com menos de 18 anos

Por Juana Castro

Legal x Moral: casamentos envolvendo adolescentes podem trazer impactos emocionais? Entenda o casoreprodução/redes sociais

O casamento do prefeito de Araucária, no Paraná, Hissam Hussein (Cidadania), de 65 anos, com uma adolescente de 16, gerou polêmica no país por envolver alguém com menos de 18 anos. Além disso, o gestor também nomeou a mãe da garota (sogra dele, portanto), Marilene Rode, como secretária municipal de Turismo.


Com essas questões evidenciadas, o Ministério Público do Paraná informou, nesta terça-feira (25/4), que está investigando tanto o casamento quanto a nomeação. Por envolver uma adolescente, "todas as informações referentes ao fato em apuração são sigilosas".


A jovem, que já foi eleita "Miss Teen" de Araucária, casou-se com Hussein em 12 de abril, um dia após completar 16 anos. Apesar da repercussão, o matrimônio nessa idade é considerado legal, no Brasil, desde que haja autorização dos pais ou responsáveis, ou, ainda, se o(a) jovem for emancipado(a). Isso porque o Código Civil estabelece os 16 anos como "idade núbil", reconhecendo aptidão psíquica e sexual para casar.


Mesmo dentro da legalidade, o assunto é considerado tabu para muitas pessoas - sobretudo pela diferença de idade entre o casal - e divide opiniões. Por isso, o Aratu On conversou com a psicóloga Aline Larruscaim, especialista em psicoterapia analítica, para saber se há impactos em um compromisso como o matrimônio na adolescência.


Pontuando que a adolescência é a fase de transição entre a infância e a vida adulta, a profissional destaca que esse é um período de desenvolvimentos - tanto físico quanto emocional - e de incertezas.


"Existem dois envolvimentos intensos acontecendo, o biológico/fisiológico e o psíquico/emocional. No primeiro, o corpo produz hormônios do desenvolvimento físico e sexual e o indivíduo vai se tornando pronto para ter uma vida sexual ativa, com desejos e impulsos para realizá-los", inicia Aline.


Já no segundo ocorre a "individualização do sujeito". "A pessoa não segue mais as ideias dos pais, digamos assim, e começa a buscar o lugar dela no mundo, de autoafirmação, com opiniões próprias", acrescenta.


Esse momento de buscar o lugar no mundo, de acordo com a psicóloga, tende a ser conflituoso, não só do adolescente consigo mesmo, mas também com outras pessoas. "Há muita exploração de conhecimento, que ele busca com as próprias vivências. As brincadeiras infantis não preenchem mais; a família deixa de ser o centro do adolescente e esse espaço vai sendo preenchido pelas amizades, namoros... tudo isso faz parte dessa descoberta", diz.


Embora afirme ser possível se apaixonar na adolescência, para a profissional, um compromisso como um casamento exige alguns cuidados. "É importante que haja um relacionamento saudável e o adolescente ainda está em fase de descoberta do que é saudável e do que funciona para ele. É algo muito subjetivo", frisa.


Quando adolescentes se casam, o ato pode ser visto como algo impulsivo, atitude comum à fase - que vai dos 10 aos 19 anos, conforme a Organização Mundial da Saúde (OMS). Porém, quando envolve adultos formados, pessoas com 30, 40, 50 anos ou mais, levanta questões como dependência emocional, chantagens e abusos.


"Mesmo que adolescentes saibam o que é sexo* e entendam sobre consentimento, ainda existem casos de abuso emocional. É uma disparidade muito grande de amadurecimento e conhecimento. São realidades de vida diferentes e o adolescente pode abrir mão de experiências e vivências importantes para o seu desenvolvimento, o que pode não ser muito favorável no aspecto psicológico", comenta.


*A legislação brasileira considera que uma pessoa já é capaz de consentir o ato sexual a partir dos 14 anos


Para a psicóloga, é fundamental que também se leve em conta o contexto social no qual aquele jovem está inserido. "Nossa cultura e experiências pessoais impactam diretamente no amadurecimento e desenvolvimento, que refletem na capacidade de tomar decisões tão significativas quanto essa", afirma Aline.


"Alguns adolescentes têm uma vida muito dura e são 'adultizados' precocemente. Podem se tornar provedores da casa, ou precisam ajudar a cuidar dos irmãos menores, entre outros exemplos que os empurram para esse amadurecimento precoce, e tudo isso impacta nas decisões do indivíduo, tornando o mesmo mais apto a tomar decisões que, em outros contextos, não estaria pronto", conclui.


ETATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE


A também psicóloga Vitória Barreto, integrante do time de Colunistas On, reforça que é necessário ter como parâmetro o que o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) dá como alicerce acerca da garantia dos direitos e proteção das crianças e adolescentes. "Temos também que incluir a perspectiva desenvolvimentista, onde compreendemos que uma adolescente de 16 anos de idade não tem os recursos psicocomportamentais amadurecidos para garantir sua autonomia e proteção dentro de uma relação matrimonial com tamanha desigualdade etária", complementa.


EM TEMPO


Ainda na noite dessa terça-feira (25/4), Hissan Hussein comunicou ao diretório estadual do Cidadania o seu desligamento do partido. Ele não explicou o motivo da decisão, tampouco disse se vai se filiar a outra legenda. A nota do político foi publicada no site da sigla. Leia abaixo, na íntegra:


"Eu Hissam Hussein Dehaini anuncio meu desligamento do partido Cidadania, agradeço a convivência que sempre tive na legenda desde 2009, sendo meu único partido de filiação. Grato pela acolhida".


INVESTIGAÇÃO POR NEPOTISMO


De acordo com a legislação brasileira, o nepotismo ocorre quando um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer um ou mais parentes. Ele é vedado, primeiramente, pela própria Constituição Federal, porque contraria os princípios da impessoalidade, moralidade e igualdade.


Ao se tornar sogra do prefeito, Marilene Rode também virou parente de segundo grau do político, configurando um caso de nepotismo, pois, com base no que estabelece o Supremo Tribunal Federal (STF), é proibida a nomeação de parentes de até terceiro grau "para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios".


*Atualização: Marilene Rode, sogra do prefeito, e Elizangela Rode, tia da adolescente, foram exoneradas nesta quarta-feira (26/04). A decisão foi publicada no Diário Oficial do município. 


LEIA MAIS: Prefeito de 65 anos se casa com adolescente de 16 e nomeia sogra para cargo no Paraná


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