Objeto de an&aacute;lise desde os prim&oacute;rdios da civiliza&ccedil;&atilde;o, a intelig&ecirc;ncia humana &eacute; um mist&eacute;rio t&atilde;o intrigante quanto a origem do universo. No livro A F&aacute;brica de Cretinos Digitais, que acaba de ser lan&ccedil;ado no Brasil, o renomado neurocientista franc&ecirc;s Michel Desmurget, diretor de pesquisas do Instituto Nacional de Sa&uacute;de da Fran&ccedil;a, aponta as baterias de combate ao estado atual de estagna&ccedil;&atilde;o intelectual para o que afirma ser sua maior causa: o excesso de tempo passado diante da tela dos mais variados aparelhos digitais.

&ldquo;A tela, em si, n&atilde;o representa um mal, mas o n&uacute;mero de horas despendidas na sua frente &eacute; assustador&rdquo;, ressaltou Desmurget &agrave; Revista Veja. &ldquo;O uso de computadores e celulares por pr&eacute;-adolescentes &eacute; tr&ecirc;s vezes maior para se divertir do que para fazer trabalhos escolares. No caso dos adolescentes, o n&uacute;mero sobe para oito&rdquo;.

No trecho em que se debru&ccedil;a sobre o desenvolvimento de crian&ccedil;as pequenas, o especialista adverte que internet e aplicativos de redes sociais em demasia afetam negativamente as intera&ccedil;&otilde;es, a linguagem e a concentra&ccedil;&atilde;o, os tr&ecirc;s pilares b&aacute;sicos do progresso cognitivo em qualquer idade, mas de excepcional import&acirc;ncia nos cinco primeiros anos da exist&ecirc;ncia. &Eacute; justamente nesse per&iacute;odo-chave que se observa o auge da plasticidade &mdash; nome dado &agrave; fren&eacute;tica forma&ccedil;&atilde;o de sinapses que nunca mais se repetir&aacute; e que resulta na evolu&ccedil;&atilde;o ultra-acelerada do potencial do c&eacute;rebro.&nbsp;

A revista Veja em sua publica&ccedil;&atilde;o ressalta que, colocada dessa maneira, parece que a tecnologia &eacute; um mal. Longe disso. O foguete do progresso tecnol&oacute;gico transportou a humanidade para um novo patamar de conhecimento, criatividade, bem-estar e longevidade, com n&iacute;tidos e incont&aacute;veis benef&iacute;cios em todas as &aacute;reas &mdash; inclusive no estudo da intelig&ecirc;ncia. O ruim &eacute; o exagero.

Esse ramo da ci&ecirc;ncia, de aferi&ccedil;&atilde;o cognitiva, ganhou impulso no s&eacute;culo XIX, quando o antrop&oacute;logo ingl&ecirc;s Francis Galton (1822-1911) esmiu&ccedil;ou a teoria da evolu&ccedil;&atilde;o formulada por seu primo, Charles Darwin (1809-1882). Galton concluiu que a intelig&ecirc;ncia &eacute; uma caracter&iacute;stica heredit&aacute;ria e desenvolveu, em 1884, o primeiro m&eacute;todo de medida do intelecto humano &mdash; um conjunto rudimentar de testes f&iacute;sicos e psicol&oacute;gicos.&nbsp;

QI

Tr&ecirc;s d&eacute;cadas depois, foi a vez de o psic&oacute;logo alem&atilde;o Wilhelm Stern elaborar o quociente de intelig&ecirc;ncia, s&oacute; que em uma f&oacute;rmula muito complexa. Coube a Lewis Terman, especialista em psicologia educacional da Universidade Stanford, simplificar o teste e popularizar a sigla Q.I. Foi Terman quem sedimentou o padr&atilde;o m&eacute;dio de Q.I. no n&uacute;mero 100, criando a escala Stanford-Binet, usada at&eacute; hoje.

&Agrave; medida que a ci&ecirc;ncia evolui, escorada pelos avan&ccedil;os da computa&ccedil;&atilde;o, o componente heredit&aacute;rio da intelig&ecirc;ncia identificado por Galton vai ganhando a companhia de outros fatores. Em pesquisa publicada em 1984, o educador americano James Flynn (1934-2020), tomando por base o avan&ccedil;o constante do Q.I. m&eacute;dio nos pa&iacute;ses mais pr&oacute;speros &mdash; que atingiu seu &aacute;pice na d&eacute;cada de 1970, com altas anuais de tr&ecirc;s pontos &mdash;, demonstrou que as melhorias alcan&ccedil;adas na medicina, na educa&ccedil;&atilde;o e no pensamento cr&iacute;tico haviam contribu&iacute;do decisivamente para tornar a popula&ccedil;&atilde;o mais inteligente, um fen&ocirc;meno que ganhou o nome de &ldquo;efeito Flynn&rdquo;.&nbsp;

Problema: passado o apogeu, as conquistas no Q.I. foram sendo cada vez menores at&eacute; estacionarem e, na entrada do s&eacute;culo XXI, come&ccedil;arem a deslizar ladeira abaixo, devagar e sempre, acendendo o sinal amarelo. E a trajet&oacute;ria segue em queda na capacidade cognitiva.

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