Um levantamento feito para classificar como as maiores plataformas digitais tratam os trabalhadores mostrou que nenhuma conseguiu comprovar padr&otilde;es m&iacute;nimos de trabalho decente. A pesquisa foi feita no &acirc;mbito do projeto Fairwork Brasil, vinculado &agrave; Universidade de Oxford, e ouviu seis plataformas: Uber, iFood, 99, Rappi, UberEats e GetNinjas.

A pontua&ccedil;&atilde;o atribu&iacute;da vai de 0 a 10 e reflete o trabalho justo a partir de cinco eixos: remunera&ccedil;&atilde;o, condi&ccedil;&otilde;es de trabalho, contratos, gest&atilde;o e representa&ccedil;&atilde;o. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas com os trabalhadores.

Segundo o relat&oacute;rio Fairwork Brasil 2021: Por trabalho decente na economia de plataformas, o primeiro do projeto no Brasil, o iFood e a 99 receberam nota 2; a Uber, nota 1; e GetNinjas, Rappi e Uber Eats, nota 0.

&ldquo;As plataformas podem optar por reduzir as desigualdades e o desemprego. No entanto, a pontua&ccedil;&atilde;o anual do Fairwork Brasil fornece evid&ecirc;ncias de que os trabalhadores por plataformas, como em muitos pa&iacute;ses do mundo, enfrentam condi&ccedil;&otilde;es de trabalho injustas e sofrem sem prote&ccedil;&otilde;es&rdquo;, diz o relat&oacute;rio.

Quando avaliado o quesito Remunera&ccedil;&atilde;o Justa, apenas a 99 conseguiu evidenciar que os trabalhadores ganham pelo menos o sal&aacute;rio m&iacute;nimo local, de R$ 5,50 por hora, que resulta em R$ 1.212 ao m&ecirc;s (2021), descontados os custos para a realiza&ccedil;&atilde;o do trabalho. Em comunicado p&uacute;blico a empresa garantiu que nenhum trabalhador ganha menos que o sal&aacute;rio m&iacute;nimo local.

O estudo avaliou se os trabalhadores recebiam o sal&aacute;rio m&iacute;nimo local, levando em considera&ccedil;&atilde;o n&atilde;o apenas o valor pago por horas trabalhadas, mas tamb&eacute;m o custo de equipamentos espec&iacute;ficos da tarefa e outros custos relacionados ao trabalho que os trabalhadores tiveram que pagar do pr&oacute;prio bolso.

Os c&aacute;lculos de remunera&ccedil;&atilde;o tamb&eacute;m levaram em conta o tempo de espera entre uma atividade e outra, que deve ser pago pelas plataformas. A maioria delas n&atilde;o atinge esse princ&iacute;pio b&aacute;sico, o que inclui at&eacute; altas taxas para entrada na plataforma.

&ldquo;H&aacute; at&eacute; plataformas que exigem que o trabalhador compre moedas para acessar as ofertas de trabalho. As tarifas de remunera&ccedil;&atilde;o e as horas de trabalho tamb&eacute;m s&atilde;o altamente vol&aacute;teis, levando a uma alta inseguran&ccedil;a de renda para os trabalhadores&rdquo;, explicou o coordenador do Fairwork no Brasil, Rafael Grohmann.

A Uber e a 99 conseguiram mostrar que executam a&ccedil;&otilde;es para proteger os trabalhadores de riscos espec&iacute;ficos das tarefas, evidenciando assim que trabalham para oferecer Condi&ccedil;&otilde;es Justas de trabalho. Entretanto, h&aacute; outras plataformas que t&ecirc;m projetos em andamento e planejados para lidar com esses riscos. De acordo com o estudo, as boas pr&aacute;ticas abordadas envolveram a elimina&ccedil;&atilde;o de barreiras ao acesso a equipamentos de prote&ccedil;&atilde;o individual (EPI) e o fornecimento de ap&oacute;lices de seguro claras.

&ldquo;Mesmo assim os trabalhadores disseram enfrentar muitas barreiras, como a dist&acirc;ncia, para acess&aacute;-los. Outra queixa recorrente &eacute; a falta de infraestrutura b&aacute;sica como acesso a banheiros, &aacute;reas de descanso e &aacute;gua pot&aacute;vel. Os principais riscos &agrave; seguran&ccedil;a e &agrave; sa&uacute;de, de acordo com eles, s&atilde;o acidentes de tr&acirc;nsito, viol&ecirc;ncia, exposi&ccedil;&atilde;o excessiva ao sol, problemas nas costas, estresse e sofrimento mental&rdquo;, destacou Grohmann.

Apenas uma plataforma (iFood) conseguiu mostrar a ades&atilde;o aos padr&otilde;es b&aacute;sicos para contratos, resultando ent&atilde;o em Contratos Justos, inserindo termos e condi&ccedil;&otilde;es acess&iacute;veis com ilustra&ccedil;&otilde;es.

Ainda assim, segundo o coordenador da pesquisa, a quest&atilde;o dos termos de servi&ccedil;o acess&iacute;veis representa um desafio para esses trabalhadores.

&ldquo;A maioria das plataformas n&atilde;o conseguiu atingir o ponto b&aacute;sico para contratos. Para atingir esse ponto, as plataformas precisam fornecer um contrato que seja comunicado em linguagem clara, compreens&iacute;vel e acess&iacute;vel aos trabalhadores o tempo todo&rdquo;, disse Grohmann.

Segundo o Fairwork, as plataformas tamb&eacute;m precisam passar a notificar os trabalhadores sobre as mudan&ccedil;as propostas dentro de um prazo razo&aacute;vel, outra condi&ccedil;&atilde;o que cinco das seis plataformas estudadas n&atilde;o cumpriram.

Por fim, quando trata de Representa&ccedil;&atilde;o Justa, que significa que a empresa permite que os trabalhadores sejam capazes de se organizar livremente no ambiente de trabalho, o estudo revela que nenhuma das plataformas est&aacute; apta nesse sentido. Uma das plataformas (iFood) pontuou no n&iacute;vel b&aacute;sico devido &agrave; constru&ccedil;&atilde;o de mecanismo em rela&ccedil;&atilde;o &agrave; voz dos trabalhadores, mostrando que, ap&oacute;s as grandes greves, a dire&ccedil;&atilde;o se reuniu com as lideran&ccedil;as.

&ldquo;Foi criado o F&oacute;rum de Entregadores, a iFood instituiu um canal por meio do qual a voz coletiva do trabalhador pode ser expressa. Esperamos que a iFood continue e expanda ainda mais essa iniciativa para incluir o maior n&uacute;mero poss&iacute;vel de lideran&ccedil;as de entregadores e realmente use esse mecanismo para ouvir os trabalhadores&rdquo;, disse Grohmann.

O coordenador afirmou ainda que a pesquisa gera impactos ao redor do mundo. &ldquo;&Eacute; uma pesquisa-a&ccedil;&atilde;o. Os princ&iacute;pios podem ajudar na formula&ccedil;&atilde;o de pol&iacute;ticas p&uacute;blicas e a construir, junto com as diferentes institui&ccedil;&otilde;es interessadas, mecanismos rumo ao trabalho decente na economia de plataformas no Brasil&rdquo;.

OUTRO LADO

Ao comentar o resultado da pesquisa, a plataforma Uber disse que lamenta que o relat&oacute;rio Fairwork Brasil tenha ignorado alguns fatos em pelo menos tr&ecirc;s princ&iacute;pios: remunera&ccedil;&atilde;o, gest&atilde;o e contratos.

Sobre a remunera&ccedil;&atilde;o, a empresa alega que &quot;&eacute; a &uacute;nica plataforma que mostra em seu site, com transpar&ecirc;ncia, informa&ccedil;&otilde;es sobre a m&eacute;dia de ganhos dos parceiros de acordo com a cidade e o n&uacute;mero de horas online&quot;.

Sobre a gest&atilde;o, a Uber cita novamente a transpar&ecirc;ncia e diz que disponibiliza processos em um portal do site, para que parceiros possam solicitar revis&atilde;o de alguma decis&atilde;o que entenda equivocada.

Finalmente, sobre os contratos, a empresa informou que todos os motoristas parceiros precisam revisar os Termos e Condi&ccedil;&otilde;es Gerais em um documento que fica a disposi&ccedil;&atilde;o para consulta e atualiza&ccedil;&atilde;o.

A empresa GetNinjas esclareceu, em nota, que n&atilde;o foi consultada durante a elabora&ccedil;&atilde;o do relat&oacute;rio Fairwork Brasil e que seu modelo de opera&ccedil;&atilde;o &eacute; diferente do das demais empresas do levantamento. A plataforma alega que o contato, negocia&ccedil;&atilde;o e pagamento dos servi&ccedil;os s&atilde;o realizados fora da plataforma: &quot;Portanto, o nosso modelo de neg&oacute;cio se diferencia dos demais citados na pesquisa&quot;.

&quot;Destacamos que o GetNinjas opera como um classificado online, em que prestadores de servi&ccedil;o - o que inclui micro e pequenos empreendedores - anunciam seus servi&ccedil;os e conseguem novos potenciais clientes. Dessa forma, os profissionais utilizam a plataforma como um canal de an&uacute;ncio para divulgar servi&ccedil;os e negociar com potenciais clientes&quot;.

A Ag&ecirc;ncia Brasil entrou em contato com as companhias citadas e aguarda posicionamento, para incluir na reportagem.

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Pesquisa aponta que plataformas digitais não comprovam padrões mínimos de trabalho decente