O Minist&eacute;rio P&uacute;blico da Bahia ajuizou, na ter&ccedil;a-feira (8/3), uma a&ccedil;&atilde;o civil p&uacute;blica contra a Ag&ecirc;ncia Estadual de Defesa Agropecu&aacute;ria do Estado da Bahia (Adab) para que fortale&ccedil;a a fiscaliza&ccedil;&atilde;o nas propriedades criadoras e que recebem jumentos no estado. Tamb&eacute;m foi acionada a empresa Nordeste Pecu&aacute;ria, Ind&uacute;stria e Com&eacute;rcio.&nbsp;

O MP pede para que a empresa, localizada no munic&iacute;pio de Amargosa, a 270 km de Salvador,&nbsp;suspenda o abate de jumentos em suas depend&ecirc;ncias at&eacute; que a Adab regulamente a exig&ecirc;ncia do exame de Mormo e de anemia infecciosa equina como protocolo para o recebimento e o abate dos jumentos em todos os frigor&iacute;ficos licenciados da Bahia.

Apesar de ainda ser tabu, o abate de jegues &eacute; uma atividade ec&ocirc;nomica bastante lucrativa na qual a Bahia tem sido destaque. Estima-se que o produto movimente bilh&otilde;es de d&oacute;lares por ano. A cidade de Amargosa &eacute; o principal polo no Brasil, seguido dos municipios baianos de Sim&otilde;es Filho e Itapetinga.

LEIA MAIS:&nbsp;<a href="https://aratuon.com.br/noticia/interior/de-quem-e-esse-jegue-conheca-a-cidade-baiana-que-mata-jumentos-para-virarem-remedio-na-china" target="_blank">&quot;De quem &eacute; esse jegue?&quot;: conhe&ccedil;a a cidade baiana que mata jumentos para virarem rem&eacute;dio na China</a>

Uma pe&ccedil;a de couro de jegue, por exemplo, pode ser vendida na China por at&eacute; U$ 4 mil (cerca de R$ 22,6 mil). Mas o mais lucrativo nos jumentos &eacute; que, desse mesmo couro, &eacute; possivel extrair uma subst&acirc;ncia medicinal&nbsp;popular na China.

Depois de morto com um tiro de ar comprimido entre os olhos, o couro do bicho &eacute; retirado, embalado em caixas e levado para a China, onde &eacute; transformado em uma gelatina que &eacute; usada para produzir o ejiao, pertencente a Tradicional Medicina Chinesa. Uma caixa de ejiao sai por R$ 750.&nbsp;

EXTIN&Ccedil;&Atilde;O

Na a&ccedil;&atilde;o, o MP requer que o abate seja suspenso at&eacute; que seja &quot;disciplinado um protocolo para a efetiva cria&ccedil;&atilde;o de uma cadeia produtiva destes animais no estado, demonstrando que o crescimento vegetativo da esp&eacute;cie seja superior ou, no m&iacute;nimo, igual ao n&uacute;mero de abates dos jumentos, a fim de evitar a extin&ccedil;&atilde;o dos mesmos&quot;.

Em 2013, havia 900 mil jumentos no Brasil, a maior parte no Nordeste, segundo o IBGE. Agora, de acordo com o Minist&eacute;rio da Agricultura, Pecu&aacute;ria e Abastecimento (Mapa), h&aacute; por volta de 400 mil. Entre 2010 e 2014, o Brasil abateu 1 mil jumentos, enquanto entre 2015 e 2019, foram 91,6 mil.

Ap&oacute;s a venda internacional, o n&uacute;mero s&oacute; aumenta. De acordo com uma reportagem da BBC, apenas na cidade de Amargosa, s&atilde;o 4,8 mil animais abatidos todos os meses, ou 57,6 mil por ano, sem contar outros munic&iacute;pios baianos.

Segundo o promotor de Justi&ccedil;a Julimar Barreto, informa&ccedil;&otilde;es do Servi&ccedil;o de Inspe&ccedil;&atilde;o de Produtos de Origem Animal (Sipoa) da Superintend&ecirc;ncia Federal de Agricultura (SFA/Ba) enviadas ao MP mostraram que quase todo o produto do abate de jumentos &eacute; direcionado ao mercado chin&ecirc;s e que, no frigor&iacute;fico de Amargosa, foram abatidos 28.199 jumentos de janeiro a novembro de 2021. &ldquo;

Uma quantidade alarmante se comparada &agrave; quantidade total de animais vivos no Estado da Bahia que &eacute; de aproximadamente 400 mil&rdquo;, destacou o promotor de Justi&ccedil;a.

&ldquo;Estima-se que a China demande um consumo de 5 milh&otilde;es de peles de jumento por ano, desde 2017, volume que o estoque interno n&atilde;o &eacute; capaz de atender. Na d&eacute;cada passada, em raz&atilde;o das aproxima&ccedil;&otilde;es comerciais China/Brasil, relativas ao agroneg&oacute;cio e investimentos em infraestrutura, os chineses descobriram o Nordeste brasileiro como potencial fornecedor da pele de jumento para produzir o ejiao&rdquo;, completou.

FISCALIZA&Ccedil;&Atilde;O

O MP requer ainda que a Adab, no prazo m&aacute;ximo de 30 dias, adote medidas para fortalecer a fiscaliza&ccedil;&atilde;o nas propriedades criadoras e fornecedoras dos bichos, al&eacute;m dos locais onde ocorre a triagem e a espera dos jumentos pro abate, apresentando relat&oacute;rio detalhado das propriedades fiscalizadas no prazo m&aacute;ximo de 60 dias.&nbsp;

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A popula&ccedil;&atilde;o de Amargosa, a 119 km de Salvador, famosa pelas festas de S&atilde;o Jo&atilde;o, agora ganhou fama internacional - e n&atilde;o tem nada a ver com o per&iacute;odo junino. Desde 2017, O munic&iacute;pio de tornou o maior abatedor de&nbsp;jegues do Brasil.

Na cidade funciona o Frinordeste, hoje o principal frigor&iacute;fico de abate de jumentos do pa&iacute;s. No local, cerca de 1,2 mil animais s&atilde;o abatidos todas as semanas para posterior exporta&ccedil;&atilde;o &agrave; China, segundo funcion&aacute;rios ouvidos pela BBC sob a condi&ccedil;&atilde;o de anonimato. Estima-se que o produto movimente bilh&otilde;es de d&oacute;lares por ano.&nbsp;

Uma pe&ccedil;a de couro, por exemplo, pode ser vendida na China por at&eacute; U$ 4 mil (cerca de R$ 22,6 mil). Mas o mais lucrativo nos jumentos &eacute; que, desse mesmo&nbsp;couro, &eacute; possivel extrair uma subst&acirc;ncia medicinal muito popular na China. Depois de morto com um tiro de ar comprimido entre os olhos, o couro do bicho &eacute; retirado, embalado em caixas e levado para a China, onde &eacute; transformado em uma gelatina que &eacute; usada para produzir o ejiao, pertencente a Tradicional Medicina Chinesa. Uma caixa de ejiao sai por R$ 750.&nbsp;

A carne normalmente &eacute; separada e exportada para o Vietn&atilde;. No Brasil, os valores do com&eacute;rcio s&atilde;o bem menores &mdash; jumentos s&atilde;o negociados por R$ 20 no sert&atilde;o, e depois repassados aos chineses. Ainda de acordo com a reportagem, a cidade de Amargosa se tornou dependente de um mercado que cresce a cada ano, mesmo sob a acusa&ccedil;&atilde;o de colocar a exist&ecirc;ncia do animal em risco.

N&atilde;o h&aacute; comprova&ccedil;&atilde;o cient&iacute;fica de que o ejiao funcione, mas, no pa&iacute;s asi&aacute;tico, ele &eacute; utilizado para tratar diversos problemas de sa&uacute;de, como menstrua&ccedil;&atilde;o irregular, anemia, ins&ocirc;nia e at&eacute; impot&ecirc;ncia sexual. Ele &eacute; consumido de v&aacute;rias maneiras, como em ch&aacute;s e bolos. No YouTube, h&aacute; v&iacute;deos de programas populares da TV chinesa ensinando receitas com ejiao e prometendo ao espectador uma vida &quot;mais saud&aacute;vel.&quot;

POPULA&Ccedil;&Atilde;O

A alta demanda e lucratividade fizeram com que empres&aacute;rios chineses mirassem o Brasil, pa&iacute;s com uma popula&ccedil;&atilde;o abundante de jegues &mdash; em 2013, havia 900 mil deles, a maior parte no Nordeste, segundo o IBGE. Hoje, de acordo com o Minist&eacute;rio da Agricultura, Pecu&aacute;ria e Abastecimento (Mapa) h&aacute; por volta de 400 mil. Entre 2010 e 2014, o Brasil abateu 1 mil jumentos &mdash; j&aacute; entre 2015 e 2019, foram 91,6 mil.

Mas esse n&uacute;mero hoje &eacute; maior. Apenas em Amargosa, s&atilde;o 4,8 mil animais por m&ecirc;s &mdash; 57,6 mil por ano. H&aacute; outros dois frigor&iacute;ficos com permiss&atilde;o para a atividade nas cidade de Sim&otilde;es Filho e Itapetinga, tamb&eacute;m na Bahia.

Para fabricar o produto, os animais s&atilde;o retirados do meio ambiente em grande volume, sem que exista uma cadeia de produ&ccedil;&atilde;o que renove o rebanho, como ocorre com o gado. Ou seja, eles s&atilde;o abatidos em uma velocidade maior do que a capacidade de reprodu&ccedil;&atilde;o, o que acendeu um alerta de que a popula&ccedil;&atilde;o de jegues pode ser eliminada nos pr&oacute;ximos ano no Nordeste.

Tr&ecirc;s vezes por semana, cerca de 400 jumentos chegam ao Frinordeste em caminh&otilde;es fechados &mdash; 50 por ve&iacute;culo. Funcion&aacute;rios relatam que, diante do calor, de viagens de at&eacute; 500 km e da condi&ccedil;&atilde;o f&iacute;sica debilitada, animais chegam a desembarcar na empresa machucados ou at&eacute; mortos.

&quot;COMO UM CACHORRO&quot;

&quot;Para mim &eacute; como matar um cachorro, um bicho de estima&ccedil;&atilde;o. A gente cresce montando jegue, e agora tem que ver jegue morrendo sem parar. &Eacute; muito jegue, amigo. Muito mesmo, tem semana que s&atilde;o 1,2 mil. Ningu&eacute;m aguenta mais ver essa situa&ccedil;&atilde;o&quot;, diz Jo&atilde;o (nome fict&iacute;cio), que trabalha no frigor&iacute;fico pois&nbsp;depende do sal&aacute;rio para sustentar a fam&iacute;lia.

Em entrevista a BBC, ele contou que passou meses desempregado e, sem op&ccedil;&atilde;o, aceitou um emprego. &quot;Trabalho por que preciso, n&atilde;o por concordar. Mas, se fechar, como ficam as fam&iacute;lias aqui?&quot;, diz.

Outro funcion&aacute;rio, Jos&eacute;, tamb&eacute;m diz ter dificuldade em assistir todos os dias a tantos abates. &quot;A gente nem sabe direito porque est&atilde;o fazendo isso, o que v&atilde;o fazer com eles... Muitos chegam aqui machucados, morrendo. &Eacute; um animal que a gente v&ecirc; desde pequeno, faz parte da nossa vida. &Eacute; complicado participar disso, mas a precis&atilde;o exige. Tenho filhos para criar, a situa&ccedil;&atilde;o est&aacute; bem dif&iacute;cil&quot;, afirma.

FISCALIZA&Ccedil;&Atilde;O

Em 9 de julho deste ano,&nbsp;a Pol&iacute;cia Militar da Bahia recebeu uma den&uacute;ncia: centenas de jumentos que seriam abatidos no Frinordeste estavam morrendo de fome e sede na fazenda Boa Esperan&ccedil;a, em Itatim. Quem os encontrou foi o tenente Benjamin Pereira e Silva, comandante do pelot&atilde;o da PM na cidade.

&quot;Infelizmente a situa&ccedil;&atilde;o era pior do que imagin&aacute;vamos. Eram uns 200 animais, que tinham vindo da cidade de Rodelas. Eles estavam bem debilitados, machucados, muitas f&ecirc;meas prenhas, muitas abortando. N&atilde;o tinha mais capim nem &aacute;gua, nenhuma comida para eles. Era uma &aacute;rea totalmente &aacute;rida. Encontramos muitos animais mortos, com urubus em cima. N&atilde;o havia nenhum tipo de apoio de equipe veterin&aacute;ria. Levamos o gerente para a delegacia e ele foi autuado por maus-tratos&quot;, relata o tenente &agrave; reportagem. &quot;No dia seguinte, voltamos &agrave; fazenda e n&atilde;o havia mais nenhum animal. Todos foram levados para outro lugar&quot;, diz o policial.

N&atilde;o foi a primeira vez que isso aconteceu. Em 2019, centenas de jegues foram encontrados em situa&ccedil;&atilde;o parecida nas cidades de Canudos e Itapetinga, tamb&eacute;m no interior da Bahia. Nestes casos, os animais seriam destinados a outros abatedouros, n&atilde;o o de Amargosa.

Em Canudos, estima-se que 200 dos cerca de 1 mil jumentos encontrados morreram de inani&ccedil;&atilde;o. Os outros estavam bastante debilitados. No local, foram encontrados dois imigrantes chineses, respons&aacute;veis por cuidar do rebanho.

&quot;Eram dois jovens que n&atilde;o recebiam sal&aacute;rio para trabalhar ali. N&atilde;o falavam portugu&ecirc;s, tivemos que usar o Google Tradutor&quot;, conta Patr&iacute;cia Tatemoto, PHD em biologia e pesquisadora da ONG brit&acirc;nica The Donkey Sanctuary, que atua na defesa do jumento contra o mercado de&nbsp;ejiao. &quot;Quando os encontramos, eles n&atilde;o tinham comida na fazenda, estavam com fome, n&atilde;o tinha nem banheiro. O laudo da pol&iacute;cia apontou que eles estavam em trabalho an&aacute;logo &agrave; escravid&atilde;o.&quot;

Os dois imigrante ainda foram autuados por maus-tratos, mas nunca mais foram vistos na regi&atilde;o de Canudos.

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