Entre os pr&eacute;dios da Ladeira da Barra, pr&oacute;ximo a um dos restaurantes mais caros de Salvador, uma paisagem de calmaria e um p&ocirc;r do Sol de tirar o f&ocirc;lego. Essas caracter&iacute;sticas seriam a garantia de um ponto tur&iacute;stico badalado, se n&atilde;o fosse uma &uacute;nica particularidade: estamos falando de um cemit&eacute;rio - o dos Ingleses.

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No local, h&aacute; v&iacute;timas de febre amarela, guerras e at&eacute; desastre de avi&atilde;o.&nbsp;O espa&ccedil;o foi cedido em 1811 pelo ent&atilde;o governador da Bahia,&nbsp;Conde dos Arcos, para que os ingleses pudessem ser sepultados com dignidade.

E essa hist&oacute;ria surgiu porque os baianos cat&oacute;licos eram enterrados dentro das igrejas e, como os brit&acirc;nicos seguiam o anglicanismo, n&atilde;o havia lugar para receberem o &quot;descanso eterno&quot;, sendo enterrados como indigentes.&nbsp;

O Aratu On foi at&eacute; o espa&ccedil;o para mostrar que, al&eacute;m de nada mal assombrado, tamb&eacute;m serve de ideia de encontros no final da tarde.&nbsp;

MORTOS &quot;FAMOSOS&quot;

Passear pelo cemit&eacute;rio &eacute;, tamb&eacute;m, uma visita &agrave;s l&aacute;pides e a hist&oacute;ria de um povo, ent&atilde;o n&atilde;o se acanhe se &quot;pisar&quot; em cima de algu&eacute;m. Seguindo a tradi&ccedil;&atilde;o brit&acirc;nica, cada jazigo cont&eacute;m uma placa com explica&ccedil;&otilde;es sobre a vida de quem ali esteve. T&iacute;tulos como &quot;amada m&atilde;e&quot;, &quot;honrado filho&quot;, &quot;bravo soldado&quot; est&atilde;o escritos junto com a causa de morte. O espa&ccedil;o participa da Semana dos Museus e tem uma programa&ccedil;&atilde;o especial no pr&oacute;ximo dia 21 de maio.

Dentre os &quot;moradores&quot; mais famosos est&aacute; John Ligertwood Paterson. O m&eacute;dico assumiu o trabalho do irm&atilde;o Alexander Ligertwood Paterson (enterrado ao lado), aperfei&ccedil;oando a &quot;casa do doutor ingl&ecirc;s&quot;, em 1842. Trata-se de um espa&ccedil;o dentro da casa da fam&iacute;lia onde receberam doentes de febre amarela que n&atilde;o conseguiam ser internados em hospitais.

<img alt="" src="https://storage.googleapis.com/aratu-backend/fotos/aratu_noticias/93539/mg/2 (1).jpg" style="width: 768px; height: 1024px;" />Logo depois, em 1849, ele voltou a usar a casa em um surto de c&oacute;lera-morbus asi&aacute;tico. Por fim, o espa&ccedil;o acabou sendo um local onde ele dava aulas de medicina e palestras. Este movimento posteriormente ficou conhecido como &quot;Escola Parasitol&oacute;gica e Tropicalista da Bahia&quot;.

PELLEW WILSON

Outro t&uacute;mulo que chama aten&ccedil;&atilde;o &eacute; o de Edward Pellew Wilson, feito todo em m&aacute;rmore e granito. Ele e seu irm&atilde;o criaram a Wilsons &amp; Sons Co., empresa que administra diversos portos do Brasil, especialmente no Nordeste.

Wilson tamb&eacute;m ajudou a introduzir a ilumina&ccedil;&atilde;o a g&aacute;s em Salvador.&nbsp;Foi acionista da Cia. a Vapor e Estrada de Ferro de Petr&oacute;polis (1852);&nbsp;do Estaleiro e Fundi&ccedil;&atilde;o Ponta d&#39;Areia (1846);&nbsp;da S&atilde;o Francisco Railway (1858);&nbsp;da Estrada de Ferro Paragua&ccedil;u (1858);&nbsp;e um dos acionistas-fundadores do Banco Mau&aacute; (1854) em Montevid&eacute;u, Uruguai.

Em maio de 1832, dois companheiros de Charles Darwin, da expedi&ccedil;&atilde;o do Beagle, Jones e Charles Musters, morreram em Salvador e foram sepultados no Cemit&eacute;rio dos Ingleses. Alguns c&ocirc;nsules&nbsp;brit&acirc;nicos e estadunidenses tamb&eacute;m est&atilde;o enterrados no espa&ccedil;o, al&eacute;m de membros da comunidade judaica em Salvador.

Como o primeiro sepultamento foi registrado na&nbsp;data de 1813, dois anos ap&oacute;s estabelecerem o local, Salvador perdeu o posto de cidade com o cemit&eacute;rio mais velho do Brasil - o t&iacute;tulo ficou para o Rio de Janeiro, cujo cemit&eacute;rio brit&acirc;nico j&aacute; recebeu corpos no mesmo ano,&nbsp;1811 -. Ainda assim, o espa&ccedil;o na Barra foi a primeira estrutura da Bahia a ser um cemit&eacute;rio nos moldes de como conhecemos hoje.&nbsp;O segundo foi o Cemit&eacute;rio Campo Santo, iniciando as atividades apenas em 1844.

Ultimamente, os enterros no local n&atilde;o s&atilde;o t&atilde;o frequentes: os estrangeiros costumam transferir os corpos para suas cidades natais ou podem ter jazigos familiares em outros cemit&eacute;rios no espa&ccedil;o. Ainda assim, a pr&aacute;tica de enterrar as cinzas (ou parte delas) no espa&ccedil;o &eacute; comum, tendo o &uacute;ltimo sepultamento ocorrido em 2022.

VIZINHO INC&Ocirc;MODO

Apesar de ser um espa&ccedil;o de paz e tranquilidade, o Cemit&eacute;rio Brit&acirc;nico j&aacute; enfrentou alguns problemas por conta da sua localiza&ccedil;&atilde;o. Um deles &eacute; o fato de estar situado na Ladeira da Barra, em um espa&ccedil;o cujo metro quadrado &eacute; um dos mais caros da cidade.

O local &eacute; tombado como patrim&ocirc;nio hist&oacute;rico desde 1993. O que se fala nos bastidores &eacute; que o pr&oacute;prio tombamento j&aacute; foi fruto de uma press&atilde;o para que o espa&ccedil;o fosse anexado pelo seu vizinho, o Yacht Clube da Bahia.

Pouco antes do tombamento, o clube teria invadido&nbsp;parte da &aacute;rea do cemit&eacute;rio, cujo terreno ia at&eacute; o mar. A pr&aacute;tica teria sido documentada, inclusive, nos arquivos do empreendimento, pois t&uacute;mulos teriam sido atirados ao mar para dar espa&ccedil;o &agrave;&nbsp;constru&ccedil;&atilde;o de uma pista para carros. O Aratu On solicitou resposta &agrave; administra&ccedil;&atilde;o do Yacht, sem sucesso.&nbsp;

Al&eacute;m disso, em 2008, a Sociedade de S&atilde;o Jorge, que administra o espa&ccedil;o, conseguiu, no Supremo Tribunal Federal (STF), o direito de n&atilde;o pagar uma d&iacute;vida de R$ 41.831,70 em IPTUs atrasados - os magistrados decidiram que, por se tratar de um cemit&eacute;rio sem fim lucrativo, n&atilde;o havia obrigatoriedade no pagamento -.

Embora a pr&aacute;tica de visitar cemit&eacute;rios cause estranheza no Brasil, o costume de transformar esses locais hist&oacute;ricos em espa&ccedil;o de visita&ccedil;&atilde;o n&atilde;o &eacute; novo. O Cemit&eacute;rio dos Ingleses, inclusive, participar&aacute; da Semana dos Museus, no dia 21 de maio. O Cemit&eacute;rio na Barra tem entrada gratuita e&nbsp;&eacute; aberto para&nbsp;visita&ccedil;&atilde;o de segunda e sexta, das 8h &agrave;s 17h.

P&Ocirc;R DO SOL

Essa mesma localiza&ccedil;&atilde;o privilegiada cria um cen&aacute;rio ideal de p&ocirc;r do sol: de frente para a Ba&iacute;a&nbsp;de Todos-os-Santos, acima do n&iacute;vel do mar e sem nenhum pr&eacute;dio para &quot;empatar&quot; a vis&atilde;o. A&nbsp;paisagem fica ainda mais completa com os barquinhos &nbsp;passando ao fundo.

Entretanto, um adendo: a administra&ccedil;&atilde;o do espa&ccedil;o pediu encarecidamente um destaque ao funcionamento, que vai at&eacute; &agrave;s 17h. Ou seja, o p&ocirc;r-do-sol &eacute; lindo, mas talvez voc&ecirc; n&atilde;o consiga v&ecirc;-lo por inteiro. De qualquer forma, a visita a um cemit&eacute;rio tende a ser melhor enquanto h&aacute; luz do dia.

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