Ind&iacute;genas que residem no Extremo-Sul da Bahia&nbsp;prestaram depoimento, na manh&atilde; desta sexta-feira (9/9), no Centro de Opera&ccedil;&otilde;es e Intelig&ecirc;ncia (COI) da Secretaria da Seguran&ccedil;a P&uacute;blica, em Salvador.

No encontro, ficou definido que haver&aacute; a cria&ccedil;&atilde;o de um grupo de trabalho, a ser realizado por policiais, que ir&atilde;o coordenadar a&ccedil;&otilde;es preventivas e de investiga&ccedil;&atilde;o na regi&atilde;o. Fazendeiros do Sul da Bahia reclamam de invas&otilde;es de terra que estariam sendo realizadas por grupos ind&iacute;genas na localidade.&nbsp;

A decis&atilde;o foi tomada pelo secret&aacute;rio da Seguran&ccedil;a, Ricardo Mandarino, pelo comandante-geral da PM, coronel Paulo Coutinho, e pela delegada-geral da Pol&iacute;cia Civil, Helo&iacute;sa Brito, durante reuni&atilde;o com lideran&ccedil;as ind&iacute;genas.&nbsp;

&quot;N&atilde;o cabe &agrave; pol&iacute;cia estadual a resolu&ccedil;&atilde;o da propriedade de terra, na regi&atilde;o. A nossa fun&ccedil;&atilde;o &eacute; proteger vidas e atuaremos com total empenho nesse intuito e tamb&eacute;m na identifica&ccedil;&atilde;o e autoria de a&ccedil;&otilde;es criminosas&quot;, declarou Mandarino.

INVESTIGA&Ccedil;&Atilde;O&nbsp;

Um caso&nbsp;ficou conhecido no munic&iacute;pio de Prado,&nbsp;a 792 km de Salvador, quando propriet&aacute;rios da Fazenda Santa Rita, fizeram uma den&uacute;ncia de que um ve&iacute;culo oficial&nbsp;da Funda&ccedil;&atilde;o Nacional do &Iacute;ndio (Funai), vinha sendo utilizado&nbsp;por homens armados para invadir a propriedade.

Segundo informa&ccedil;&otilde;es publicadas pelo portal Bahia.Ba, os donos da &aacute;rea afirmam que &ldquo;os criminosos est&atilde;o se utilizando da causa ind&iacute;gena para instaurar o terror no campo&rdquo;. A invas&atilde;o teria tido in&iacute;cio h&aacute; cerca de um m&ecirc;s e meio.

&ldquo;A Fazenda Santa Rita, propriedade produtiva totalmente regularizada e titulada h&aacute; mais de 40 anos, possui mais de 50% de suas &aacute;reas como mata protegida, vizinha ao Parque Nacional do Descobrimento, est&aacute; invadida desde 22 de Junho de 2022 e desde ent&atilde;o sofre com saques e inc&ecirc;ndios criminosos&rdquo;, denunciaram os propriet&aacute;rios.

Em resposta &agrave; mat&eacute;ria, a Funai disse que protocolou um pedido de busca e apreens&atilde;o do ve&iacute;culo &quot;retido indevidamente por ind&iacute;genas, assim como tem encaminhado os relatos, v&iacute;deos e fotos que tem recebido para apura&ccedil;&atilde;o de potencial repercuss&atilde;o criminal junto da Secretaria de Seguran&ccedil;a P&uacute;blica na Bahia e Superintend&ecirc;ncia Regional da Pol&iacute;cia Federal na Bahia, tendo prestado apoio &agrave;s autoridades policiais para a devida apura&ccedil;&atilde;o dos fatos ocorridos no Sul da Bahia&rdquo;.

LEIA A NOTA DA FUNAI:

&quot;Em rela&ccedil;&atilde;o aos recentes epis&oacute;dios ocorridos no Sul do estado da Bahia, a Funda&ccedil;&atilde;o Nacional do &Iacute;ndio (Funai) vem a p&uacute;blico esclarecer que, enquanto institui&ccedil;&atilde;o p&uacute;blica, calcada na supremacia do interesse p&uacute;blico, n&atilde;o pode coadunar com nenhum tipo de conduta il&iacute;cita. Por conseguinte, &eacute; atribui&ccedil;&atilde;o da Funai a ado&ccedil;&atilde;o de provid&ecirc;ncias no sentido de esclarecer aos ind&iacute;genas acerca da ilicitude de sua conduta e desestimular pr&aacute;ticas que correspondem ao esbulho ou turba&ccedil;&atilde;o de propriedades, sob pena de a responsabiliza&ccedil;&atilde;o por omiss&atilde;o.

Advirta-se que, nos termos do Estatuto da Funai, aprovado pelo Decreto n&ordm; 9.010/2017, que sua finalidade institucional &eacute; justamente proteger e promover os direitos dos ind&iacute;genas, em nome da Uni&atilde;o. Contudo, esta prote&ccedil;&atilde;o e promo&ccedil;&atilde;o de direitos deve se efetivar em obedi&ecirc;ncia &agrave;s regras tra&ccedil;adas pela legisla&ccedil;&atilde;o, entre elas, a veda&ccedil;&atilde;o de utiliza&ccedil;&atilde;o da for&ccedil;a para satisfa&ccedil;&atilde;o de pretens&atilde;o, fora das circunst&acirc;ncias legalmente previstas.

O regime democr&aacute;tico de uma sociedade pluralista que consagra, como valores supremos de sua estrutura, a liberdade de pensamento e a livre express&atilde;o de ideias, confere legitimidade a que todo e qualquer segmento social &ndash; seja majorit&aacute;rio, seja pertencente &agrave;s minorias &ndash; formule uma pauta de reivindica&ccedil;&otilde;es, aponte car&ecirc;ncias que deseja ver supridas, exponha necessidades prementes que aguardam atendimento, cobre promessas n&atilde;o cumpridas, reclame a efetiva&ccedil;&atilde;o de melhorias, postule condi&ccedil;&otilde;es dignas de vida e tratamento, brade contra a inefici&ecirc;ncia estatal, realize mobiliza&ccedil;&otilde;es alertando para o descaso com que vem sendo tratado por institui&ccedil;&otilde;es p&uacute;blicas, denuncie arbitrariedades e opress&otilde;es, manifeste indigna&ccedil;&atilde;o ante omiss&otilde;es e neglig&ecirc;ncias que se prolongam no tempo. Longe de perniciosas, tais pr&aacute;ticas evidenciam justamente o contr&aacute;rio: que a democracia de nosso pa&iacute;s est&aacute; de p&eacute;, vicejando altaneira, amadurecendo dia a dia, erigindo pilares cada vez mais s&oacute;lidos.

Todavia, incorre em grave deforma&ccedil;&atilde;o do regime democr&aacute;tico a atua&ccedil;&atilde;o, individual ou coletiva, que, sob pretexto de pressionar ao r&aacute;pido e incondicional atendimento de reivindica&ccedil;&otilde;es, descamba para o uso de estrat&eacute;gias baseadas na trucul&ecirc;ncia, torpeza e desprezo total aos padr&otilde;es mais elementares de civilidade e sensatez. O apego extremado, mesmo quando n&atilde;o proposital, &agrave; m&aacute;xima de que &ldquo;os fins justificam os meios&rdquo;, cabendo sob tal &oacute;tica lan&ccedil;ar m&atilde;o de tudo quanto for imagin&aacute;vel para impor as aspira&ccedil;&otilde;es de uma pessoa ou de um grupo descontente com uma determinada situa&ccedil;&atilde;o, abre margem &agrave; instala&ccedil;&atilde;o de um perigoso, ign&oacute;bil e retr&oacute;grado quadro de barb&aacute;rie, colocando em s&eacute;rio risco o sentimento de paz social e desestabilizando fortemente a ordem p&uacute;blica.

Esse modo intransigente e inconsequente de agir, definitivamente, n&atilde;o condiz com a din&acirc;mica de um Estado que a Lei Maior brasileira, a Constitui&ccedil;&atilde;o Federal, aplic&aacute;vel a todos os brasileiros e estrangeiros residentes no Pa&iacute;s, sem distin&ccedil;&atilde;o de origem, ra&ccedil;a, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discrimina&ccedil;&atilde;o, qualifica solenemente como sendo um Estado Democr&aacute;tico de Direito. &Eacute; inaceit&aacute;vel para um regime democr&aacute;tico comprometido com o primado da ordem p&uacute;blica, abonar, fomentar ou tolerar o descalabro resultante de a&ccedil;&otilde;es perpetradas ao arrepio da legalidade, de s&uacute;bito, com uso de m&eacute;todos nada pac&iacute;ficos, postos em pr&aacute;tica para criar n&iacute;tido ambiente de intimida&ccedil;&atilde;o e com absoluta indiferen&ccedil;a &agrave; observ&acirc;ncia dos limites necess&aacute;rios a evitar a instala&ccedil;&atilde;o de um cen&aacute;rio ca&oacute;tico, tornando ainda mais dif&iacute;cil a resolu&ccedil;&atilde;o dos problemas fundi&aacute;rios.

Cumpre ressaltar que a Funai reconhece a organiza&ccedil;&atilde;o social, os usos, costumes e tradi&ccedil;&otilde;es, bem como a pluralidade &eacute;tnica-cultural das diversas comunidades ind&iacute;genas, entretanto, n&atilde;o exerce tutela orfanol&oacute;gica de ind&iacute;genas que se encontram em pleno gozo de seus direitos civis, possuam grau de aculturamento e est&aacute;gio adequado de compreens&atilde;o dos h&aacute;bitos da sociedade nacional, com ela interagindo de forma perene, os quais s&atilde;o perfeitamente respons&aacute;veis por suas a&ccedil;&otilde;es. Uma vez reconhecida a plena capacidade de tais ind&iacute;genas e a n&atilde;o recep&ccedil;&atilde;o do instituto da tutela orfanol&oacute;gica prevista no Estatuto do &Iacute;ndio, por via de consequ&ecirc;ncia, deve ser admitida a legitimidade passiva para responderem pelos atos que praticam, j&aacute; que enquanto legitimados passivos tamb&eacute;m exercem a defesa de seus direitos. Cabe destacar, ainda, que eventuais quest&otilde;es envolvendo a vulnerabilidade social tamb&eacute;m n&atilde;o excluem a potencial responsabiliza&ccedil;&atilde;o por il&iacute;citos cometidos.

Nesse sentido, &eacute; o entendimento j&aacute; consolidado pela Jurisprud&ecirc;ncia, inclusive do Superior Tribunal de Justi&ccedil;a (STJ): &ldquo;Os ind&iacute;genas integrados &agrave; sociedade, nos termos do art. 4&ordm;, inciso III, da Lei n&ordm; 6.001/73, n&atilde;o se sujeitam ao regime tutelar especial estabelecido pelo Estatuto do &Iacute;ndio&rdquo; (REsp 737285/PB &ndash; STJ &ndash; Relatora Ministra Laurita Vaz &ndash; DJ 08/11/2005); &ldquo;O Estatuto do &Iacute;ndio s&oacute; &eacute; aplic&aacute;vel ao ind&iacute;gena que ainda n&atilde;o se encontra integrado &agrave; comunh&atilde;o e cultura nacional. O ind&iacute;gena que est&aacute; em pleno gozo de seus direitos civis, inclusive possuindo t&iacute;tulo de eleitor, est&aacute; devidamente integrado &agrave; sociedade brasileira, logo, est&aacute; sujeito &agrave;s mesmas leis que s&atilde;o impostas aos demais cidad&atilde;os nascidos no Brasil&rdquo; (HC 88853/MS &ndash; STJ &ndash; Relatora Ministra Jane Silva &ndash; DJ 11/02/2008); &ldquo;Uma vez integrado &agrave; comunh&atilde;o nacional, encontra-se o &iacute;ndio no pleno exerc&iacute;cio dos seus direitos civis e pol&iacute;ticos, cessando a tutela exercida pela FUNAI/Uni&atilde;o&rdquo; (AC 2003.71.04.005390-2/RS &ndash; TRF da 4&ordf; Regi&atilde;o &ndash; relatora Desembargadora Federal maria L&uacute;cia Luz Leiria &ndash; DJ 11/02/2009); &ldquo;Descabe falar na incid&ecirc;ncia do Estatuto do &Iacute;ndio quando o &iacute;ndio est&aacute; integrado &agrave; vida urbana e &aacute; sociedade, n&atilde;o necessitando, pois, de tratamento diferenciado&rdquo; (HC 0003971-78.2014.827.0000 &ndash; TJTO &ndash; Relator Desembargador Eur&iacute;pedes Lamounier &ndash; DJ 19/08/2014); &ldquo;O ind&iacute;gena que est&aacute; em pleno gozo de seus direitos civis est&aacute; devidamente integrado &agrave; sociedade brasileira, logo, est&aacute; sujeito &agrave;s mesmas leis que s&atilde;o impostas aos demais cidad&atilde;os brasileiros&rdquo; (AC 0090.10.000428-3 &ndash; TJRR &ndash; Relatora Desembargadora T&acirc;nia Vasconcelos Dias &ndash; DJ 04/02/2014.

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