Sempre&nbsp;com um vestido&nbsp;roxo e&nbsp;um enorme crucifixo pendurado no pesco&ccedil;o, a figura inusitada despertava curiosidade por onde passava. Ela n&atilde;o &eacute; um personagem de um filme de terror, tampouco de outra produ&ccedil;&atilde;o. Estamos falando da &quot;Mulher de Roxo&quot; - figura caricata em Salvador por um motivo: sua poss&iacute;vel desilus&atilde;o amorosa.&nbsp;

&quot;Ela transitava no Centro Hist&oacute;rico, na Rua Chile e seus arredores, entre 1960 e 1990&quot;, explica o professor e historiador, Rafael Dantas.

Em maio, m&ecirc;s das noivas, o Aratu On resolveu falar sobre a, quem sabe, mais emblem&aacute;tica e misteriosa noiva da capital. A hist&oacute;ria dela, confusa,&nbsp;come&ccedil;a pelo nome:&nbsp;Florinda Santos ou Doralice? At&eacute; hoje, a d&uacute;vida permanece. Foi como &quot;Mulher de Roxo&quot;, por&eacute;m, que&nbsp;foi conhecida&nbsp;por muitos anos por olhares incr&eacute;dulos e dedos sempre apontados.&nbsp;

Sua origem&nbsp;&eacute;&nbsp;outro mist&eacute;rio. Ela teria nascido em 1917. Uns defendem a tese de que a mulher teria enlouquecido porque teria sido abandonada no altar; outros, por&eacute;m, cravam que ela havia perdido a fortuna e transloucado.

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As vers&otilde;es n&atilde;o param por a&iacute;. H&aacute; quem defenda com veem&ecirc;ncia que a mulher teria visto a m&atilde;e matar o pai e depois suicidar-se; terceiros garantiam, ainda, que ela perdera a filha de considera&ccedil;&atilde;o e a casa, na Ladeira da Montanha, numa batalha contra o jogo. Florinda&nbsp;nunca contou a ningu&eacute;m&nbsp;sua verdadeira hist&oacute;ria.

&quot;Ela mesma era quem costurava&nbsp;suas roupas. Acrescentava a suas indument&aacute;rias um tor&ccedil;o e um enorme crucifixo&quot;, ressalta Patr&iacute;cia S&aacute; Moura. A jornalista e escritora&nbsp;&eacute; uma das que se inspirou a produzir material sobre a fantasia criada em torno da vida da &quot;Mulher de Roxo&quot;.

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A obra &quot;Mulher de roxo: retrato de um mito&quot;, lan&ccedil;ada&nbsp;em&nbsp;2016 (5&ordf; edi&ccedil;&atilde;o)&nbsp;e publicada&nbsp;pela Arcadia, ressalta, por exemplo, entre outros h&aacute;bitos, um&nbsp; bastante comum da ent&atilde;o&nbsp;anci&atilde;.&nbsp;Fizesse chuva ou sol, bastava as portas do com&eacute;rcio da Rua Chile abrirem e, l&aacute; estava, a mulher&nbsp;em frente &agrave; uma das mais emblem&aacute;ticas lojas de departamento da &eacute;poca: a Slopper. Com seu vestido aveludado, andava descal&ccedil;a, falava sozinha e&nbsp;pedia dinheiro.

&quot;Entenda-se: c&eacute;dula!&nbsp;Moeda, ela n&atilde;o aceitava. Queria somente c&eacute;dula, pois dizia que seu rosto estava estampado nas c&eacute;dulas a pedido de uma importante pessoa de sua vida&quot;, explica Patr&iacute;cia, sem dar &quot;spoiler&quot;&nbsp;de &#39;quem teria sido tal figura&#39;.

Apesar de folcl&oacute;rica, a imagem da dama causava um misto de sentimentos, como medo,&nbsp;compaix&atilde;o, arrepios e at&eacute; mesmo pena. A escritora Patr&iacute;cia S&aacute;, no entanto, revela um situa&ccedil;&atilde;o, at&eacute; ent&atilde;o, pouco conhecida. Florinda teria nascido em S&atilde;o Sebasti&atilde;o do Pass&eacute;, na Regi&atilde;o Metropolitana de Salvador,&nbsp;e, ao contr&aacute;rio de que muitos acreditam, ela tinha nome, sobrenome... uma identidade oficial.&nbsp;

&quot;&Agrave; noite, ela dormia em um dos albergues noturno da Prefeitura, situado na Baixa&nbsp;dos Sapateiros. O ref&uacute;gio era seu &uacute;nico abrigo. Certa vez, houve um temporal e inundou o local. Muitos moradores perderam seus documentos. O m&eacute;dico respons&aacute;vel pelo lugar falou com ela para retirar novos documentos, mas ela n&atilde;o quis. A partir da&iacute;, ficou indigente. Ningu&eacute;m, no entanto, soube, de fato, qual era o nome oficial dela&quot;, ressalta.&nbsp;

Infelizmente, ao que tudo indica, a verdade jamais ser&aacute; descoberta. Afinal, a mulher de roxo foi enterrada em 5 de abril de 1997, quando faleceu, ao que especula-se aos 80 anos,&nbsp;sendo sepultada como indigente.

A causa da morte teria sido erisipela - um processo infeccioso da pele, que pode atingir a gordura do tecido celular, causado por uma bact&eacute;ria que se propaga pelos vasos linf&aacute;ticos -. &quot;Ela foi internada no hospital Irm&atilde; Dulce em 1991, com erisipela. Passou longos anos por tratamento, mas, acabou falecendo em 1997&quot;, esclarece a escritora.&nbsp;

O folclore sobre a mulher de roxo sobrepujou as barreiras locais e serviram de inspira&ccedil;&atilde;o&nbsp;para cria&ccedil;&atilde;o de m&uacute;sica &quot;Mulher de Roxo&quot;, da&nbsp;Banda Cascadura e Pitty.&nbsp;

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A hist&oacute;ria inspirou at&eacute; mesmo&nbsp;um personagem do cineasta Glauber Rocha no filme &quot;O Drag&atilde;o da Maldade Contra o Santo Guerreiro&quot;, de 1969.

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Al&eacute;m da fic&ccedil;&atilde;o, a mem&oacute;ria da &quot;Mulher de Roxo&quot; tamb&eacute;m foi contada no document&aacute;rio hom&ocirc;nimo, dirigido por Fernando Guerreiro e Jos&eacute; Am&eacute;rico Moreira da Silva.&nbsp;Produzido pelo P&oacute;lo de Teledramaturgia da Bahia, o v&iacute;deo, de 12 minutos, mistura document&aacute;rio e fic&ccedil;&atilde;o. Haydil Linhares &eacute; uma das atrizes que vive Florinda Santos.

A imagem da &quot;Mulher de Roxo&quot;&nbsp;foi eternizada na Galeota Gratid&atilde;o do Povo, um painel pintado por Carlos Bastos que decora o plen&aacute;rio da Assembleia Legislativa. Na&nbsp;Ladeira da Pra&ccedil;a da S&eacute;,&nbsp;h&aacute; uma pintura de um grande painel grafitado da &ldquo;Mulher de Roxo&rdquo;.&nbsp;O trabalho &eacute; de&nbsp;J&uacute;lio, Bigod, Prisk, Baga, Teles, Bones e Br&atilde;o. O registro (abaixo)&nbsp;foi feito por&nbsp;JFParanagu&aacute;.

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Mês das Noivas - a história da "Mulher de Roxo": abandonada no altar, ela perambulava com seu longo vestido em Salvador