A Universidade Federal da Bahia (Ufba) se posicionou contra a Proposta de Emenda &agrave; Constitui&ccedil;&atilde;o (CCJ) que estabelece a cobran&ccedil;a de mensalidades em universidades p&uacute;blicas brasileiras.

O texto, que foi inclu&iacute;do na &uacute;ltima ter&ccedil;a-feira (24/5) na pauta da Comiss&atilde;o de Constitui&ccedil;&atilde;o e Justi&ccedil;a (CCJ) da C&acirc;mara, &eacute; de autoria do deputado federal General Peternelli (UB-SP).

Em nota, a principal institui&ccedil;&atilde;o de ensino baiana afirmou que a comunidade acad&ecirc;mica da Ufba recebeu com &quot;espanto e indigna&ccedil;&atilde;o a not&iacute;cia da tramita&ccedil;&atilde;o&quot; da PEC 206.&nbsp;

A Reitoria da universidade classificou como &quot;delet&eacute;ria&quot; a proposta, defendida pelo relator Kim Kataguiri (UB-SP), &quot;seja por seu potencial de criar e acirrar desigualdades entre &aacute;reas e cursos, comprometendo a natureza da universidade, seja por dividir a comunidade estudantil em cidad&atilde;os e clientes, seja enfim por se tratar de medida sabidamente ineficaz para o enfrentamento do problema que se arvora a resolver, a saber, o d&eacute;ficit de financiamento da educa&ccedil;&atilde;o superior federal nos &uacute;ltimos anos&quot;.

A institui&ccedil;&atilde;o ainda argumenta que a defesa da cobran&ccedil;a de mensalidades &quot;costuma ser justificada, por ignor&acirc;ncia ou m&aacute;-f&eacute;, por meio de argumentos falazes e que denotam desconhecimento tanto da matriz or&ccedil;ament&aacute;ria, quanto dos prop&oacute;sitos da universidade&quot;.

A vota&ccedil;&atilde;o marcada para acontecer na &uacute;ltima ter&ccedil;a na CCJ na C&acirc;mara n&atilde;o aconteceu pois Kataguirim relator da PEC, est&aacute; viajando. A aprecia&ccedil;&atilde;o, contudo, visava analisar apenas quest&otilde;es t&eacute;cnicas. Isto &eacute;, se o texto fere algum princ&iacute;pio constitucional para autorizar ou n&atilde;o a sua tramita&ccedil;&atilde;o.&nbsp;

LEIA NA &Iacute;NTEGRA A NOTA DA UFBA:

O sistema federal de educa&ccedil;&atilde;o superior &eacute; patrim&ocirc;nio do povo brasileiro. &Eacute; o resultado de d&eacute;cadas de investimento material do Estado e, sobretudo, do trabalho e da luta de gera&ccedil;&otilde;es de educadores, t&eacute;cnicos e estudantes dedicados &agrave; constru&ccedil;&atilde;o de uma universidade p&uacute;blica, gratuita, aut&ocirc;noma, inclusiva e de qualidade; uma universidade que fundamenta sua autonomia em sua capacidade de formar cidad&atilde;os qualificados, de forjar m&eacute;rito acad&ecirc;mico em todas as &aacute;reas do conhecimento, produzindo ci&ecirc;ncia, cultura e arte. S&oacute; podemos assim receber com espanto e indigna&ccedil;&atilde;o a not&iacute;cia da tramita&ccedil;&atilde;o no Congresso Nacional de projeto de emenda constitucional que visa &agrave; introdu&ccedil;&atilde;o de cobran&ccedil;a de mensalidades pelas universidades federais brasileiras.

Diante de t&atilde;o grave amea&ccedil;a, a Reitoria da UFBA v&ecirc;-se instada a reafirmar que a cobran&ccedil;a de mensalidades &eacute; delet&eacute;ria &agrave; Universidade P&uacute;blica, seja por seu potencial de criar e acirrar desigualdades entre &aacute;reas e cursos, comprometendo a natureza da universidade, seja por dividir a comunidade estudantil em cidad&atilde;os e clientes, seja enfim por se tratar de medida sabidamente ineficaz para o enfrentamento do problema que se arvora a resolver, a saber, o d&eacute;ficit de financiamento da educa&ccedil;&atilde;o superior federal nos &uacute;ltimos anos.

A defesa da cobran&ccedil;a de mensalidades costuma ser justificada, por ignor&acirc;ncia ou m&aacute; f&eacute;, por meio de argumentos falazes e que denotam desconhecimento tanto da matriz or&ccedil;ament&aacute;ria, quanto dos prop&oacute;sitos da universidade. Assim, costumam supor, por exemplo, que as vagas discentes das universidades federais s&atilde;o ocupadas por estudantes de camadas elitizadas da sociedade, que, portanto, estariam em condi&ccedil;&otilde;es de custear os pr&oacute;prios estudos. Tal argumenta&ccedil;&atilde;o &eacute; equivocada, pois generaliza, por um lado, a condi&ccedil;&atilde;o socioecon&ocirc;mica de uma pequena e cada vez mais reduzida parcela dos estudantes das universidades federais; enquanto, por outro lado, desconhece a significativa transforma&ccedil;&atilde;o por que passou a Universidade P&uacute;blica brasileira com a implementa&ccedil;&atilde;o de pol&iacute;ticas de a&ccedil;&otilde;es afirmativas, de sorte que a ampla maioria do alunado das universidades federais &eacute; hoje formada por estudantes em situa&ccedil;&atilde;o de vulnerabilidade socioecon&ocirc;mica.

Outra afirma&ccedil;&atilde;o infundada &eacute; a de que seria ent&atilde;o adequado cobrar mensalidade daqueles estudantes que tenham efetivamente condi&ccedil;&otilde;es de pagar. Aparentemente justa, essa medida, al&eacute;m de n&atilde;o solucionar problemas de financiamento de universidades mundo afora, teria o cond&atilde;o nefasto de acirrar a desigualdade j&aacute; existente entre cursos socialmente mais prestigiados (e, logo, mais ocupados por estudantes em melhor condi&ccedil;&atilde;o socioecon&ocirc;mica) e aqueles cursos menos prestigiados, que, apesar de sua incontest&aacute;vel relev&acirc;ncia acad&ecirc;mica, seriam cada vez mais relegados. Dessa desigualdade fundamental decorreriam outras, a implicarem o subfinanciamento p&uacute;blico dos cursos e das &aacute;reas de ensino, pesquisa e extens&atilde;o menos atrativos ao investimento privado.

Costuma-se ainda afirmar que o gasto por aluno do ensino superior p&uacute;blico federal &eacute; inflado em compara&ccedil;&atilde;o ao de institui&ccedil;&otilde;es privadas, representando &ocirc;nus indevido aos cofres p&uacute;blicos. Entre os muitos equ&iacute;vocos que essa afirma&ccedil;&atilde;o encerra, cabe destacar o c&aacute;lculo superficial e apressado, que, de prop&oacute;sito, desconsidera o fato de que as universidades federais n&atilde;o realizam apenas ensino, mas tamb&eacute;m e de forma indissoci&aacute;vel pesquisa e extens&atilde;o. A produ&ccedil;&atilde;o de conhecimento de qualidade, praticada sobretudo em universidades plenas, implica assim grande investimento em infraestrutura de pesquisa, mas tamb&eacute;m em projetos de longa dura&ccedil;&atilde;o, entre os quais n&atilde;o &eacute; de se desprezar o fortalecimento de carreiras acad&ecirc;micas s&oacute;lidas, capazes de desenhar um horizonte de independ&ecirc;ncia intelectual para nossa na&ccedil;&atilde;o. Desse modo, pesquisadores s&eacute;rios t&ecirc;m mostrado que um c&aacute;lculo mais acurado e adequado &agrave; realidade da Universidade P&uacute;blica resulta em um custo por aluno da ordem de R$ 1.150,00, a valores de 2015 &ndash; bastante equivalente ao valor mensal cobrado por institui&ccedil;&otilde;es privadas que, todavia, por muitas raz&otilde;es, n&atilde;o costumam oferecer qualidade compat&iacute;vel com a das universidades federais.

Amparada, portanto, em uma soma de equ&iacute;vocos e incompreens&otilde;es, a introdu&ccedil;&atilde;o da cobran&ccedil;a de mensalidades nas universidades federais &eacute;, em &uacute;ltima inst&acirc;ncia, uma medida irrefletida e inepta, significando tanto ignor&acirc;ncia da natureza da universidade quanto descompromisso com a produ&ccedil;&atilde;o de conhecimento. &Eacute; medida, assim, obscurantista e eivada ademais daquele antigo oportunismo de quantos, com imenso dano para uma educa&ccedil;&atilde;o superior universal, diversa e de qualidade, querem desobrigar o Estado de seu compromisso com o financiamento p&uacute;blico da educa&ccedil;&atilde;o.

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