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Câmeras corporais em PMs diminuem letalidade policial? Estudos e especialista analisam eficácia do sistema

Em meio a mais um atraso no processo de fornecimento das câmeras para a Polícia Militar da Bahia, estudos revelam queda na violência policial, mas indicam diminuição em abordagens e revistas

Por Lucas Pereira

Câmeras corporais em PMs diminuem letalidade policial? Estudos e especialista analisam eficácia do sistemaCréditos da foto: reprodução/FGV
Após a reprovação da empresa L8 Group, segundo lugar no processo de escolha para o fornecimento das câmeras corporais para a Policia Militar da Bahia, a implementação do modelo segue sem uma previsão real de desfecho. A desclassificação foi anunciada nesta terça-feira (12/9) pela Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA). O processo foi iniciado em 2021 pelo então governador Rui Costa (PT), com a Motorola sendo a primeira colocada no pregão. A empresa foi desclassificada por não apresentar comprovação de atuação no Brasil. Agora, a terceira empresa do ranking, a Teltex, que está em um quadro de recuperação judicial, deve ser avaliada pelo governo.
Em meio aos atrasos no processo, Aratu On levantou pesquisas sobre a eficácia da instalação dos aparelhos em outros estados do Brasil e entrevistou a especialista pesquisadora da Rede de Observatórios de Segurança Larissa Neves, que também integra a Iniciativa Negra por Uma Nova Política sobre Drogas.
Um estudo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), feito entre julho de 2021 e julho de 2022 em São Paulo, apontou que o uso das câmeras nos uniformes dos policiais evitou a morte de 104 pessoas em operações policiais no estado, consistindo numa redução de 57% em relação ao ano anterior, em que os dispositivos não estavam implementados. A pesquisa revelou ainda reduções na letalidade policial e também na criminalidade.
Já um estudo feito pela Universidade de Stanford sobre o sistema no Rio de Janeiro, mostrou que a estratégia provocou um efeito contrário ao desejado, com os policiais sendo desencorajados ou com inibição na hora de agir em situações necessárias, o que foi chamado de "despoliciamento". Realizado na favela da Rocinha, o estudo aponta que grande parte dos policiais evitavam se envolver nos casos por medo de que as interações pudessem incriminá-los, o que resultou em uma queda de 46% nas fiscalizações "proativas", como abordagens e revistas policiais.
Defendida pelo governo baiano como uma ferramenta que pode melhorar significativamente os índices de segurança pública na Bahia, a tecnologia das câmeras corporais não deve ser encarada como a grande solução do tema e, sim, uma alternativa, de acordo com Larissa Neves. “A gente precisa entender se a implementação dessa tecnologia como solução para os problemas, como a letalidade policial, é o suficiente. Eu acho que é esse é um caminho, mas é preciso pensar em práticas mais responsáveis de policiamento, de controle dessas operações e sobre as relações mais amplas entre a polícia e as comunidades”, declarou a pesquisadora.
MAIOR TRANSPARÊNCIA
A especialista em segurança pública comentou ainda que algumas perguntas precisam ser respondidas pelo governo, começando por quando o sistema das bodycams será implantado. “É necessária uma maior transparência sobre os critérios de uso desse material, como quais unidades receberão o equipamento, onde esses dados serão armazenados, bem como os critérios de privacidade dos mesmos”.
Mais que isso, a principal problemática do sistema e que deve ter um debate em torno, de acordo com Larissa, é o modo de acionamento do equipamento: se o acionamento das câmeras será feito de maneira autônoma ou se os próprios policiais poderão ligar/desligar quando quiserem.
“Caso [o acionamento] seja manual, esses agentes podem esquecer de fazê-lo, como já ouve casos assim, ou não fazem da maneira deliberada, então a gente está entendendo, que esse agente da Segurança Pública, pode de forma intencional ou não omitir esse acionamento da câmera em determinados espaços, então a gente precisa entender como é que vai haver uma supervisão sobre isso”, detalha.
SEGURANÇA NA BAHIA
Entre 2015 e 2022, foram registrados, pelo menos, 49,5 mil homicídios na Bahia, alçando o estado ao posto do que mais registrou assassinatos nos últimos oito anos no país. Os números são 40% maiores que os do segundo colocado, o Rio de Janeiro, conforme dados do Painel de Monitoramento do SIM (Sistema de Informação sobre Mortalidade), do Ministério da Saúde, que detalham as mortes por local de ocorrências, idade, sexo e raça.
Além disso, dados da Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (Conaq) mostraram que pelos menos 30 lideranças quilombolas foram assassinados nos últimos 10 anos no Brasil, sendo somente 11, na Bahia. O tema voltou à tona após o assassinato da líder do Quilombo Pitanga dos Palmares, Yalorixá e ex-secretária de Promoção da Igualdade Racial de Simões Filho, Maria Bernadete Pacífico (Mãe Bernadete), de 72 anos.
Dados do Instituto Fogo Cruzado mostraram que entre janeiro e junho de 2023, o bairro de Tancredo Neves registrou maior número de tiroteios em Salvador. Ao todo, foram 30 ocorrências, com 18 pessoas mortas e 12 feridas. Fazenda Grande do Retiro e Pernambués, com 18 tiroteios, também foram listados.
Além dos três com mais conflitos armados, Federação, Lobato e Valéria fecham o grupo dos seis bairros mais afetados pela violência urbana em Salvador. No total, o instituto registrou 792 tiroteios, com 759 vítimas no primeiro semestre em Salvador e na Região Metropolitana.
Em média, foram 132 conflitos por mês e aproximadamente quatro por dia no período analisado. Em comparação com o semestre anterior, que concentrou 753 tiroteios com 663 baleados, houve um aumento de 5% no número de tiroteios e 14% no número de pessoas baleadas.
LEIA MAIS: SSP-BA anuncia mais de 300 presos por reconhecimento facial e especialistas acusam racismo no sistema
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