A dor do luto: psicóloga explica o que acontece no momento da perda e dá dicas de como superar
A psicóloga Juliana Correia, especialista em luto, afirma que as pessoas tem maneiras diferentes de lidar com a perda, mas a forma de reagir pode aliviar a dor.
Em algum momento da vida, todos nós iremos atravessar a dor do luto. A morte faz parte do processo humano e, ainda que seja duro lidar com ela, é a única certeza que temos na vida. No entanto, enfrentar a perda de uma pessoa querida não é nada fácil e, muitas vezes, esse período é enfrentado de forma pesada, sobrecarregada e com muita tristeza.
De acordo com a psicóloga Juliana Correia, especialista em luto, esse período nada mais é do que o ajustamento de uma pessoa à nova realidade, a partir do rompimento de um vínculo. Durante a pandemia, observamos o aumento de mortes, e consequentemente, milhares de pessoas tem enfrentado essa situação pela primeira vez.
Não há um passo-a-passo sobre como se deve agir após a perda de uma pessoa que faleceu, e o período de duração desse luto é inconstante. "Ele vai variar de situação a situação, pelo contexto da perda. Outros fatores que a gente leva em consideração são, como era a relação com a pessoa que se perdeu, as circunstâncias da morte, e o jeito que essa pessoa lida com as próprias emoções", explica a psicóloga durante entrevista em vídeo ao Aratu On (play abaixo).
COMO LIDAR
Segundo a especialista, o momento de receber a notícia da perda de alguém também pode desencadear uma espécie de situação traumática, o que chamamos de "choque". "O congelamento diante de um luto, diante de uma perda, esse comportamento de 'choque', é uma reação emocional esperada e protetiva. Significa que essa situação é tão difícil de entrar em contato, que uma das medidas protetivas é não entrar em contato, naquele momento. Aos poucos a realidade vai se colocando como presente", conta.
Ela acrescenta ainda que, situações do cotidiano, vividas com a pessoa falecida, que passam a não ocorrer mais, vão trazendo a pessoa enlutada de volta à realidade. Esse processo, no entanto, gera uma grande carga emocional, e é exatamente por isso que é preciso procurar uma maneira de passar pelo período de forma saudável.
Juliana afirma que as pessoas têm maneiras diferentes de lidar com a perda, mas a forma de reagir pode aliviar a dor. "O luto é como um túnel, não tem como fazer um atalho, a gente precisa atravessá-lo. Então, a maneira mais saudável de viver um luto é vivendo. É validando que sim, é justo eu ficar triste; sim, é justo pensar em sentir alívio, porque aquela pessoa estava sofrendo; é justo sentir saudade. Então, que a gente valide e aceite os nossos próprios sentimentos, esse é um caminho para viver o luto de forma saudável", esclarece a psicóloga.
Para a psicóloga, realizar um ritual de despedida também pode ser importante para as pessoas enlutadas. Missas ou funeral online, no caso de pessoas que perderam alguém para a Covid-19; caixa de recordações; tirar as roupas da pessoa falecida do armário e pensar em para quem doar, são algumas das opções.
LUTO NA PANDEMIA
Desde o início da pandemia no Brasil, mais de 400 mil pessoas morreram. Esse "luto coletivo" pode ter forte impacto na saúde mental de boa parte da população. "No nosso caso, esse luto entra com sensações de 'isso poderia ter sido evitado'; algumas pessoas entram a sensação de culpa. Isso gera também um sentimento de ansiedade, de até quando essa situação vai se estender", justifica Juliana, acrescentando ainda que o cenário confuso pode ser outro fator.
A especialista explica que, com a perda de tantas pessoas, ao mesmo tempo, uma troca de afetos coletiva pode ajudar a aliviar a sensação do luto. "Enquanto sociedade, há uma possibilidade de nos juntarmos nessa dor, para nos apoiarmos mutuamente, já que é uma dor que, cada um na sua medida, vem compartilhando".
CRIANÇAS
Algo que pode dificultar ainda mais para um adulto, no momento de atravessar o luto, é ter que contar sobre a situação para uma criança, que possuía vínculos com a pessoa falecida. Muitos tem dúvidas sobre a maneira correta de falar com essa criança, de forma que ela entenda, mas não fique traumatizada com a notícia.
"A gente tem muita dificuldade, enquanto sociedade, de lidar com a morte como um fenômeno natural, como uma coisa normal. Por isso, quando a gente se vê diante de situações onde é preciso falar de morte com crianças, a gente tende a tentar pincelar a situação, para parecer um pouco menos difícil, um pouco menos agressiva, um pouco menos dolorosa", relata Juliana.
"Metáforas como "virou uma estrelinha" ou "foi ficar com papai do céu" costumam deixar as crianças muito confusas. Então, a melhor maneira de se comunicar é de maneira direta, para não abrir espaço para essas fantasias", conclui. Segundo ela, é melhor deixar claro que a pessoa morreu, que não será mais possível vê-la, mas que essa fase difícil será superada, com apoio, que está tudo bem se ela ficar triste ou chorar em algum momento.
QUANDO É NECESSÁRIO BUSCAR AJUDA?
É fato que, apesar de não ser uma situação fácil, o luto faz parte da vida de todo ser humano, e por isso, deve ser visto como algo normal. Nesse período, todos precisam passar pela fase de reconstrução da própria vida, adequando-se à perda. No entanto, em alguns casos, é possível que esse momento de tristeza se torne ainda maior e mais extenso, comprometendo a saúde mental e a vida pessoal.
"A gente identifica algumas questões que podem facilitar esse tipo de luto. Qual era a relação com essa pessoa? Se quem morreu e quem tá enlutado tinha uma relação muito difícil, se tinha um problema, se a pessoa tem a sensação de muitas pendências... A gente pode pensar também em situações muito traumáticas, de pessoas que perderam muitos familiares ao mesmo tempo, de mortes que foram muito súbitas e inesperadas", detalha Juliana.
Para ela, há indicadores que demonstram quando a situação do enlutado pode estar se agravando. "Se você sente que está difícil demais para o outro continuar vivendo minimamente, se organizando e progredindo, esse pode ser o momento de uma avaliação terapêutica", completa.
Juliana também explica que algumas falas à pessoa enlutada devem ser evitadas, para não tornar o processo mais doloroso. "É muito difícil quando a gente tenta consolar a dor do outro com frases clichês, como 'foi melhor assim'. Melhor pra quem? Essa pessoa está sofrendo muito naquele momento; 'Não chore, ele não ia gostar que você tivesse chorando'; chorar é uma das maneiras saudáveis de deixar a dor sair. Então, nesse momento o que a gente precisa, é ser muito acolhedor. É perguntar no que a gente pode ajudar", especifica. "É importante que a gente se faça presente", complementa a psicóloga.
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