CINEMA: ‘Fragmentado’ é retomada da carreira de diretor de ‘O Sexto Sentido’, diz crítica
CINEMA: ‘Fragmentado’ é retomada da carreira de diretor de ‘O Sexto Sentido’, diz crítica
M. Night Shyamalan começou muito bem a sua carreira e foi caindo aos poucos, chegando a ser desacreditado pela crítica. Parece que a má fase está indo embora. Após um instigante A Visita, o diretor nos apresenta Fragmentado, um suspense competente, ainda que com alguns problemas. E traz um final que, em vez da reviravolta que já virou marca autoral, sugere uma ampliação do seu próprio universo com uma referência direta a um dos seus primeiros e melhores filmes.
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Fragmentado quer subverter algumas lógicas e nos convence em muitas delas, principalmente pelo talento e entrega de James McAvoy a seus vinte e três personagens. Na verdade, só vemos de fato nove atuando, porém, só a citação aos quatorze restantes já nos deixa impressionados com a versatilidade do ator que nos dá um tom over conveniente com toda a situação.
Kevin Wendell Crumb é um homem fragmentado, ou seja, ele sofre de um distúrbio que vai além de múltiplas personalidades. Ele realmente se transforma biologicamente naquela pessoa, tendo doenças, força e outras alterações que dissociam de fato as personalidades como pessoas. Pelo menos é isso que sua psiquiatra, a Dra. Karen Fletcher, interpretada por Betty Buckley, quer comprovar. E pela maneira como Shyamalan constrói a narrativa e James McAvoy representa as personalidades distintas, somos convencidos dessa possibilidade.
Três dessas personalidades se juntam para sequestrar três meninas e aí é que o filme começa a perder alguns pontos. A personagem de Anya Taylor-Joy, Casey Cooke, parece entrar quase por engano. E Shymalan vai construindo sua história pregressa em paralelo às cenas do cativeiro, criando um clima mal construído, pouco orgânico e que acaba preparando para a resolução de uma maneira frouxa. Faz com que se fuja do Deus Ex-Machina, mas ainda assim, não parece tão bem amarrado quanto poderia.
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(Atenção para possíveis spoilers no próximo parágrafo, ainda que eu tente ser o mais vaga possível. Pule para o seguinte, caso não queira nenhuma informação que possa dar pistas da resolução).
Essa resolução ainda traz um problema sério que quase legitima uma certa situação que a personagem sofre, como se isso acabasse sendo um trunfo, o que é extremamente perigoso. Tudo bem que estamos lidando com um ser humano que tem distúrbios mentais e sérios problemas de caráter e discernimento de certo e errado. Ainda assim, é perigosa a forma como o filme acaba abordando o crime do qual a garota é vítima.
De qualquer maneira, a narrativa consegue se manter em constante tensão ao mesmo tempo em que aguça a nossa curiosidade em relação ao distúrbio e aos planos das personalidades apelidadas de Horda. Ainda que Haley Lu Richardson e Jessica Sula, duas das sequestradas, não consigam passar tão bem o desespero da situação, há um clima de medo construído a partir daquela prisão e das personalidades que vão se alternando na “conversa” com as garotas.
Há uma premissa e uma atmosfera tão instigantes nesse universo que nos envolve e nos faz comprar a ideia. Dentro daquele espaço claustrofóbico, M. Night Shyamalan consegue fazer o que sabe de melhor, construir o efeito de tensão e medo que um bom suspense pede. São pequenos gestos que nos colocam junto com as garotas naquela cela. Ficamos agoniados também diante das escolhas da psiquiatra e das próprias garotas diante de situação tão insólita, ainda assim, não chegamos a duvidar da proposta apresentada.
Esse bom trabalho de construção do universo e convencimento da premissa acaba nos fazendo comprar a ideia do terceiro ato da obra, ainda que possa surgir algum desconforto diante de alguns detalhes. Isso, porém, abre as portas para os segundos finais que nos dão um vislumbre de ampliação de um universo que parecia resolvido e esquecido no passado do diretor. É instigante e empolgante ver uma certa personagem em cena, mas ao mesmo tempo nos deixa com receio de como isso será desenvolvido. Pelo menos o diretor disse, em entrevista recente, que quer fazer só mais um filme com o tema e não uma série longa. Aguardemos.
De qualquer maneira, Fragmentado consegue cumprir o seu propósito. É um suspense competente que nos envolve, nos deixa tensos e nos traz surpresas, ainda que não tão bem trabalhadas quanto poderiam. Um filme que traz mais prós do que contras, o que em se tratando de M. Night Shyamalan acaba sendo extremamente positivo. Vamos torcer para que ele ainda nos presenteie com grandes obras como O Sexto Sentido e Corpo Fechado. E que ele não estrague este último com esses planos de ampliação do universo proposto.
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