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É ruim, mas é bom! Primeira temporada de "O Agente Noturno" é viciante, mesmo cheia de clichês e saídas fáceis

Colunista On: Enoe Lopes PontesPesquisadora, jornalista e crítica de cinema e séries
É ruim, mas é bom! Primeira temporada de "O Agente Noturno" é viciante, mesmo cheia de clichês e saídas fáceis

Ao avistar a série "O Agente Noturno" na primeira colocação do top 10 de mais assistidas da Netflix por semanas, uma curiosidade tomou conta de mim e eu decidi que iria assistir à produção. Com uma sinopse um tanto genérica, a pergunta que não saia da minha cabeça era: qual a razão para tanto público assim? E falo tudo isso em primeira pessoa, porque acredito que esta obra provocou uma sensação tão forte de nostalgia em mim, que precisei resgatar o meu adolescente, que consumia seriados policiais, no início dos anos 2000.


Talvez este seja o primeiro elemento relevante para a garantia do sucesso de O Agente Noturno, fazendo com que ela seja tão viciante. Existe em sua linguagem este aspecto antigo, que funciona nas narrativas seriadas televisivas de outras décadas, que é um uso contínuo do cliffhanger. Mesmo sem possuir a necessidade de pausas para intervalos comerciais, por ter exibição original em um canal streaming, a série conta com ganchos fortes dentro de cada episódio, que aumentam a suspensão e o desejo de não parar de assisti-la.


Além disso, os encerramentos de cada episódio também contam com cliffhangersintrigantes. Isto é destacável porque, comumente, os conteúdos oferecidos pela Netflix possuem irregularidades neste sentido, fazendo com que algumas histórias fiquem mornas por um tempo ou muito empolgantes somente em momentos específicos. Isto não ocorre aqui.


Pelo contrário, há a permanência da atenção de quem assiste. E mesmo com esta quantidade intensa de suspensões, o seriado não perde seu rumo apenas para causar efeitos e estimular o binge watching.


Há todo uma busca por desenvolver as premissas e investigar os desenlaces causados pelas reviravoltas recorrentes presentes na trama. Ainda que a história seja um tanto boba e óbvia, esta tentativa de trabalhar os arcos narrativos já faz com que a qualidade da produção cresça. Porque não há nada de novo nela, nem o enredo - que trata sobre uma conspiração na Casa Branca, envolvendo o FBI -, nem a formação do par romântico - assim que os protagonistas se encontrarem, você saberá que eles serão um casal.


Todavia, acompanhar o como todas as relações e conflitos vão acontecer é o que instiga e interessa aqui, sobretudo porque há um carisma nas personagens. Ainda que Rose Larkin (Luciane Buchanan) e Peter Sutherland (Gabriel Basso) não combinem nem um pouco, individualmente, eles geram empatia na audiência. Basso é um ator com limitações nítidas, porque ele não tem uma gama variada de expressões faciais, porém há algo de charmoso e antigo na sua presença, que cria uma sensação de familiaridade - o que pode ser um plus para Boomers e Millennials, por exemplo.


Basso tem um ar de pouca inteligência, mas bom coração, o que gera uma pena por sua personagem. É na própria limitação de sua interpretação que uma espécie de apego a ele é criado. Já Buchanan não chega a ser ruim exatamente. O que falta para ela é realmente compreender o seu papel, para convocar tons mais apropriados para cada uma das intenções de Rose. Porque a forma como Buchanan faz suas entonações a leva para algo quase monocórdico. Rose soa nervosa 90% do tempo. Falta nuance e gráficos tonais. Ainda assim, ela tem um carisma intenso e consegue se valer do limite do seu talento também. De um lado, um Peter confuso, do outro, uma Rose desesperada. De alguma maneira, esse caos performático contribui para as cenas.


O restante do elenco também é limitado, com intérpretes caricatos, com rosto de boneco e pouca expressividade, com exceção de uma única atriz e ela se chama Hong Chau (O Menu). Não há uma sequência que ela não faça crescer com seu talento. Ela compreende a sua personagem com profundidade. Chau joga com os olhos, com a contenção de gestos e movimento, com todo o seu tônus corporal. Até o final da temporada, é impossível saber quando Farr está sendo sincera ou não e essa é uma das maiores graças de O Agente Noturno. Porque é nesta dúvida posta pela personagem Diane Farr que os outros plotsse alimentam, criando perguntas para serem resolvidas, como: Se a Diane é boa como os assassinos foram parar na localização exata de Rose e Peter? Há outro policial corrupto envolvido na explosão da bomba? Quem? E por aí seguem os questionamentos, durante a temporada inteira.


Há também uma abordagem interessante do casal de assassinos Ellen (Eve Harlow) e Dale (Phoenix Raei). Ainda que os atores não entreguem um bom resultado, o roteiro tenta imprimir alguma complexidade para eles. Nos episódios finais, este desenho da exploração de camadas da dupla vai se perdendo, caminhando para algo mais maniqueísta, até simplório mesmo, de vilania exagerada, mas existe uma tentativa, que deixa Ellen e Dale mais perturbadores. Esta investida inicial do roteiro também eleva a tensão, porque resta uma sensação de que o limite que os dois podem alcançar é infinito.


Apesar disso, o desfecho dos vilões é um tanto rápido. Resta saber se no segundo ano da série, os novos criminosos serão tão instigantes assim. Em termos de direção, não há nada de inventivo, porém, mesmo com 5 diretores diferentes, existe uma coesão de linguagem e um trabalho pensado à serviço da narrativa. A criação de atmosfera é fomentada pela miseen-scène, que explora a dinâmica das relações, seja nos afetos ou nas distinções de poder entre as personagens, pontos centrais da trama do seriado. Nesta criação de unidade e construção de mundo ficcional, há força em uma decupagem que eleva a potencialidade da ação na cena.


Contudo, esta qualidade de direção não soa arbitrária. Os cineastas escolhidos para comandar os episódios parecem escolhidos estrategicamente, pois são artistas experientes no que se referem aos gêneros ação e policial. Este fato é notável principalmente na seleção de Adam Arkin para os episódios 7 e 8, momento de clímax da produção. Arkin conta com mais de 50 títulos dirigidos em sua carreira, com um número significativo de obras de ação e policiais.


Assim, é perceptível que o que prende a atenção de quem assiste foi planejado com cautela. Seja na sua quantidade intensa de ganchos, no carisma das personagens, na confiança na experiência dos diretores ou no talento de Chau, O Agente Noturno tem as suas qualidades. Com tantos detalhes organizados e o seu sucesso de público - ele é um dos seriados mais assistidos da Netflix de todos os tempos -, até os seus defeitos podem ter sido calculados. Afinal, clichês e previsibilidades conquistam uma parte da audiência também. Mas, esta última parte é apenas uma teoria de fã.


Sim, entre a rejeição inicial e a curiosidade para checar a mais nova farofa policial da Netflix, a série ganhou um membro para seu fandom: uma crítica de cinema ranzinza que, agora, está aguardando ansiosamente para a próxima temporada. E que ela chegue logo, cheia de perseguições, mistérios e conspirações mirabolantes!


*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.

Importante: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Aratu On.

Enoe Lopes Pontes

Enoe Lopes Pontes

Doutoranda e mestre em Comunicação, formada em Artes Cênicas e em Comunicação Social, Enoe Lopes Pontes é pesquisadora, jornalista e crítica de cinema e séries. É membro da ABRACCINE e do Coletivo Elviras. Cinéfila desde os 6 anos, sempre procurou estar atenta para todo tipo de produção, independentemente do gênero, classificação ou fama. Do cult ao pipoca, busca observar as projeções com cuidado e sensibilidade. Filmes preferidos: Hiroshima Mon Amour e Possession.

Enoe integra a equipe do Coisas de Cinéfilo, como crítica.

Instagram: @enoelp

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