ESPECIAL TERCEIRIZAÇÃO: “A volta do capitalismo selvagem”, diz professor universitário
ESPECIAL TERCEIRIZAÇÃO: “A volta do capitalismo selvagem”, diz professor universitário
O Aratu Online inicia nesta quinta-feira (30/3) um especial de três capítulos sobre a terceirização das leis trabalhistas. Professores universitários, políticos e especialistas foram convocados a opinar sobre o projeto de lei que possibilita novas modalidades de reger as relações de trabalho no Brasil.
O professor de história da Universidade Federal da Bahia (Ufba), Carlos Zacarias, é o primeiro a escrever. Ele se coloca contrário às flexibilizações da CLT e classifica o projeto de lei como retrocesso. “No ritmo que vamos, levaremos menos tempo para desembarcar no século XIX, do que levamos para construir algumas das combalidas estruturas da nossa frágil e limitadíssima democracia”.
Leia o artigo na íntegra abaixo:
Firmemente empenhando em cumprir os desígnios que determinaram a sua condução à cabeça do governo, Michel Temer promove uma terra arrasado no pouco de civilização que o Brasil conseguiu construir ao longo dos seus quase 200 anos de história como nação, digamos, independente. Depois de aprovar no Congresso a PEC 257, responsável pelo congelamento dos gastos públicos pelos próximos 20 anos, e conseguir aprovar na Câmara o Projeto de Lei 4302/98, numa manobra que ressuscitou um PL do tempo em que Fernando Henrique Cardoso era presidente, o governo se prepara agora para pôr a cereja no bolo, com as propostas de reforma da previdência e as alterações na CLT. No ritmo que vamos, levaremos menos tempo para desembarcar no século XIX, do que levamos para construir algumas das combalidas estruturas da nossa frágil e limitadíssima democracia.
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É certo que a fase de letargia que alcançou os movimentos sociais e os sindicatos parece que vai ficando para trás. Todavia, não se pode dizer que a resistência de milhares (milhões se consideramos os trabalhadores envolvidos) observada no último dia 15, vá conseguir reverter os efeitos de uma derrota que começou a se desenhar quando o impeachment foi votado no Congresso, liberando os parlamentares para servir a quem lhes pagou as eleição. Em todo caso, as próximas semanas serão decisivas, pois animados pelo sucesso do dia 15, e também pelo retumbante fracasso das manifestações convocadas para o último domingo pelos movimentos das novas direitas, que apoiam as reformas do governo ilegítimo de Temer, sindicatos e movimentos sociais convocaram novo dia de mobilizações para o dia 31/03 e agora falam abertamente, e em unidade, sobre a construção de uma greve geral para abril.
Sendo vitoriosos, os trabalhadores, seus sindicatos e os movimentos sociais poderão barrar as reformas encaminhadas ao Congresso e poderão pôr o governo de Michel Temer na defensiva. Caso não tenham êxito, viveremos uma era de profundos e trágicos retrocessos que redundarão numa regressão civilizacional com paralelos, somente, em situações de cataclismos. Isso porque, tanto a proposta de emenda constitucional que visa alterar o eixo estruturante do sistema de seguridade social no país, quanto a legislação trabalhista construída a duras penas entre as décadas de 1930 e 1960 por pressão dos movimentos sociais, foi um dos pontos centrais do nosso processo civilizacional, que embora sendo reconhecidamente excludente e concentrador, teve nos dispositivos da CLT de 1943 e na Constituição de 1988, significativos elementos atenuantes.
Ou seja, pelo que foi aprovado recentemente no Congresso, e pelo que está prestes a se aprovar, o Brasil daqui a alguns anos será um país de indigentes, subempregados e com salários aviltantes, pois as possibilidades estabelecidas com a lei de terceirização determinarão trabalhadores com menor remuneração, com maior rotatividade nos empregos, sujeitos a mais acidentes de trabalho e, por fim, descobertos pela legislação que pode ser suprimida em função do desejo do governo de fazer prevalecer o negociado sobre o legislado. Junte-se a isso, o surgimento de categorias de trabalhadores atomizados, com representações sindicais fracas, cartoriais ou, simplesmente, inexistentes, tornarão os trabalhadores incapazes de se contrapor ao patronato, definindo o quadro que nos remeterá ao passado.
Por certo retrocedemos quase um século em nossa história, caso não se consiga barrar tais propostas que tramitam no Congresso. O efeito disso a médio e longo prazos, será o brutal aumento da violência e da criminalidade nas cidades e a redução da expectativa de vida de homens e mulheres que tenderão a morrerem antes da aposentadoria e ainda pressionarão o sistema público de saúde, cada vez mais incapaz de acolher as demandas em função dos estrangulamento das verbas governamentais. Uma triste realidade que está sendo decidida em um Congresso de corruptos controlado por um governo igualmente corrupto e ilegítimo interessado, apenas, em salvaguardar o espírito do nosso capitalismo selvagem.
No final das contas, antes que a vitória seja decidida pelas forças da regressão, há a possibilidade de que a classe trabalhadora, voltando a acreditar nas suas própria sforças, torne-se igualmente selvagem e bastante menos paciente com seus governantes e patrões. Se assim o for, o Congresso e o governo provarão do remédio amargo que querem fazer a população, em sua esmagadora maioria, engolir.
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