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‘MANDA NUDES’: Quando o envio de conteúdos eróticos deixa de ser prazer e vira caso de polícia

‘MANDA NUDES’: Quando o envio de conteúdos eróticos deixa de ser prazer e vira caso de polícia

Por Heloísa Gomes

‘MANDA NUDES’: Quando o envio de conteúdos eróticos deixa de ser prazer e vira caso de polícia

?Safada?, ?mandou porque quis?. São estas as palavras, dentre outras piores, que ecoam pela sociedade quando uma mulher tem sua intimidade exposta pelo vazamento de um ?nude? ? termo utilizado para envio de fotos ou vídeos de nudez.


Muitas vezes quando a mulher faz um tipo de foto sem roupa ou chega a gravar um vídeo não imagina os perigos que a cercam. Faz por conta do desejo sexual. No momento em que grava é raro pensar: ?será que vai vazar?? No entanto, é aí que mora o perigo. Nada é confiável. Ninguém é.


O meu caso foi o seguinte: tinha conteúdo no meu celular e fui roubada. Depois de uma semana, soube através de um amigo que acessava site de vídeo pornô que tinha um vídeo que parecia muito comigo e me mandou o link. Fiquei muito assustada. Chorei! Minha família até hoje não sabe. Foi horrível! Não tinha nada com o meu nome, mas eu sabia que era o meu rosto exposto. Fui até um advogado, mas não me contive em ficar esperando e vendo o número de acesso ir aumentando. Foi aí que respirei e pesquisei na própria web uma forma de exterminar aquele vídeo. Depois de horas na frente do computador. Eu encontrei uma forma e comecei a batalha.


Contei para o meu parceiro, pois confio muito nele e sabia que iria me ajudar me ouvindo, me dando colo, me orientando. Ele não me condenou. Pelo contrário, quis saber o que tinha acontecido e foi quem sugeriu procurar um advogado.


Felizmente, encontrei um espaço no site que você pode pedir para retirar o conteúdo dentro de 48 horas. Em menos de 24h respirei aliviada, mas a preocupação nunca deixa de existir. Pois não sei quantas pessoas podem ter baixado aquele vídeo. Quantas pessoas me viram nua, exposta… É triste pensar nisso. Falar disso. Mas é uma forma de colocar para fora toda a amargura e desespero de ter passado por aquela situação e de ainda pensar que em qualquer momento tudo isso pode voltar. É vergonhoso, mas na hora que fiz o vídeo e deixei em meu celular não pensei no que ia fazer se vazasse.


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Foto de nudes. Divulgação


Julgar é um mal da sociedade. É algo que está ligado ao machismo. Não deveria ter essa crucificação de quem faz isso. A nudez é algo normal, nossos corpos são semelhantes, mas pessoas da sociedade tratam a nudez como algo de outro planeta, como se apenas famosos pudessem posar para lente de fotógrafos. Mas, os anônimos também possuem desejos, fetiches, mas falta amadurecimento. Falta entendimento das pessoas em relação ao compartilhamento desse tipo de imagem que, inclusive pode acabar com a vida de outra.


Essa história poderia ser sua. Poderia ser minha. Mas pertence à S. M., 23 anos. Ela teve um vídeo íntimo vazado na web depois de ter sido roubada. Ainda envergonhada só fala com o Aratu Online na condição de anonimato. Ainda se ressente da história, mas quis dar este depoimento para alertar outras jovens.


De acordo com dados da SaferNet — entidade referência nacional no enfrentamento a crimes e violações aos Direitos Humanos na Internet — só no Brasil, no último levantamento feito pela entidade, em 2014 foram atendidos 222 casos de sexting/exposição íntima na plataforma de denúncias online através de chat e e-mail. “O levantamento de 2015 está sendo feito”, garante a coordenadora do canal de ajuda, Juliana Cunha.


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MANDA NUDES:


Por que as pessoas trocam nudes? A psicóloga Olívia Valente acredita que o acesso fácil à tecnologia tem contribuído para o aumento da prática, o que pode ser negativo pela falta de controle sobre o material em relação à divulgação nas redes. ?A tecnologia não ajuda no sentido de perder completamente o controle da foto ou vídeo intimo publicado”, diz.


A sensação pra quem envia pode estar relacionada com uma vaidade narcísica de reconhecimento. “Um traço egoíco”, completa a especialista.


O envio de nudes pode ser uma nova forma de expressar a sexualidade. ?O nude selfie é uma nova cultura e para muitos acaba servindo como uma prova de amor, de cumplicidade e tudo isso faz parte de uma nova descoberta. Funciona como um jogo sexual, principalmente para os adolescentes?, explica Olívia.


Quando vaza uma nude, vaza uma intimidade. Muito mais que a nudez de um corpo é a vida de alguém sendo violada e julgada. ?A maioria das vítimas buscam apoio psicológico, pois não sabem lidar com as situações vexatórias e de constrangimento a que ficam submetidos. A cumplicidade foi rompida e muitas pessoas entram em quadros depressivos por conta disso?, revela.


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Brincadeira com a marca do youtube e o pedido de envio de fotos nuas.


A CULPA É DA VÍTIMA


Em todos os casos em que há violação da intimidade de um casal, seja provocado por um terceiro ou pelo próprio parceiro, a vítima é colocada na posição de culpada. É como se a mulher não tivesse direito sobre seu corpo e estivesse à mercê dos caprichos dos machos alfas.


Por trás de uma nude vazada há uma disputa de poder do homem sobre a mulher, um relacionamento abusivo. Um ?não? que o outro não soube lidar ou a crueldade de um desconhecido.


Para a sociedade a mulher deveria negar o seu desejo, porque se o momento particular do casal for a público ela será execrada e considerada indigna.


M. C., hoje com 20 anos, tem um relato triste. Um ex-namorado filmou uma relação sexual do casal sem o consentimento dela e, após o término do relacionamento, publicou o vídeo em um site de pornografia.


Sua família soube da exposição, mas preferiu não assistir o material. ?Quem viu o vídeo percebeu que foi feito de lado e o zoom foi utilizado, em momento nenhum eu olho para a câmera. Não foi com a minha autorização?, diz.


“Eu tinha um ex-namorado e a gente terminou, depois de um tempo ele me procurou falando que queria me ver. Eu falei para ele que não queria mais. Depois de cinco minutos, um amigo me falou que tinha visto um vídeo [íntimo] meu e me mostrou. Naquele momento eu fiquei sem chão, me tremi, fiquei triste… No início foi complicado pela vergonha de ir para a rua, de ir para o colégio. Na época a escola inteira foi atrás de mim, fiquei muito triste, mas com o tempo isso foi passando. Tive medo também de não conseguir entrar em um novo relacionamento, mas graças a Deus hoje eu tenho um companheiro, que é o pai do meu filho e estamos juntos há dois anos”, afirma.


“Demorou um tempo para as pessoas pararem de me olhar torto, durou quase um ano para tudo voltar ao normal e eu tive o apoio da minha família”, completa.


O GRITO EM SILÊNCIO:


M. C. quis denunciar, mas a família achou que era melhor não mexer mais na história e mais uma vez o abusador saiu impune.


?É difícil falar porque primeiro está relacionado com intimidade. O nude selfie é uma nova forma das pessoas expressarem a sua sexualidade e está numa nova cultura. Mas muito mais no íntimo. Por isso é difícil falar. Mas quem passa por essa violação precisa falar, precisa denunciar. E já existem campanhas para isso?, esclarece Olívia Valente.


TERRA DE NINGUÉM?


?Crimes offline são crimes online. Tudo o que não pode ser feito fora das redes também não pode ser feito dentro?, define o presidente da Safernet, advogado especialista em direito digital, Thiago Tavares.


As vítimas de sexting podem acionar os próprios sites hospedeiros do conteúdo impróprio para a remoção, como prevê o ART. 21 do Marco Civil da Internet ? Lei nº 12965 de 23 de abril de 2014, que define direitos dos usuários na rede. Caso os provedores não retirem o conteúdo do ar podem ser caracterizados como corresponsáveis e sujeitos a pagamento de multa indenizatória.


No site da Safernet é possível acessar um modelo de carta para solicitação da retirada das imagens ou vídeos sem a necessidade de uma ação judicial.


A instituição oferece um canal de orientação online. Lá psicólogos fazem atendimento às vítimas de crimes digitais pelo chat do HelpLine.


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Pedido de nude em marca da Coca-Cola


Para as pessoas que, além da retirada do conteúdo, desejam uma investigação criminal, a ação penal pode ser movida. Basta procurar um advogado e registrar boletim de ocorrência. Nas situações em que o crime digital for contra menores de 18 anos a ação torna-se pública e feita pela Defensoria.


Em Salvador ainda não há uma delegacia especializada para tratar esse tipo de crime. Apenas um grupo de apoio às delegacias tradicionais, que recebem as denúncias e encaminham para o Grupo Especializado de Repressão aos Crimes Eletrônicos (GME).


A punição para pessoas que praticam o sexting podem variar entre uma indenização de até R$ 10 mil ou responder criminalmente, dependendo do contexto, caracterizando crimes contra honra, como calúnia e difamação, por exemplo.


?O Marco Civil da Internet veio para estabelecer os limites do comportamento digital, da vida online, os direitos dos internautas e a garantia da remoção dos conteúdos impróprios. Mas a Lei Carolina Dieckmann tem sido inócua, são estabelecidas punições mais brandas e os tipos de provas são difíceis de serem coletados. Na verdade não faltam leis, falta estrutura para a polícia civil investigar e produzir as provas necessárias?, avalia Thiago Tavares.


NUDES É VIDA:


Como na web não faltaram pedidos inusitados das fotos íntimas:


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Pensa em mandar nude para alguém? É melhor tomar cuidado para não vazar, antes de praticar o jogo erótico com seu parceiro, ficante, ou seja lá como você define sua relação é bom saber se ele (a) é uma pessoa confiável.


Antes de apertar o botão “enviar”, reflita sobre o assunto fazendo o teste elaborado pelo portal UOL com a consultoria de Juliana Cunha, psicóloga da Safernet Brasil. Aqui é possível saber se existente confiança ou não na hora de enviar este tipo de material.


Faça o teste aqui.


Ainda assim o teste não é 100% infalível. E todos os cuidados são necessários antes de passar por esta situação constrangedora.


Importante: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Aratu On.

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