MDMA e 'cogumelos mágicos': médicos explicam tratamento com alucinógenos em casos de depressão grave
No dia 1º de julho, a Austrália se tornou o primeiro país do mundo a legalizar a prescrição de MDMA e psilocibina para pacientes com depressão e TEPT
E se o seu médico te recomendasse um tratamento à base de "cogumelos mágicos" e MDMA - também conhecido como ecstasy -, você acharia estranho? Pois a "terapia psicodélica" está próxima de se tornar comum para casos de depressão e transtorno do estresse pós-traumático (TEPT).
No dia 1º de julho, a Austrália se tornou o primeiro país do mundo a legalizar a prescrição clínica de MDMA e psilocibina, principal substância psicoativa dos cogumelos alucinógenos, para pacientes diagnosticados com depressão resistente e TEPT. Em nota, a Administração de Produtos Terapêuticos do Austrália (TGA) justificou a adesão ao tratamento, que já passou por diversos estudos no país e, se bem administrado, traz resultados positivos: “A psilocibina e o MDMA são relativamente seguros quando usados em um ambiente medicamente controlado sob a supervisão de profissionais de saúde adequadamente treinados e nas dosagens que foram estudadas em ensaios clínicos”.
Nos Estados Unidos, a coisa também está caminhando bem: em 2020 e 2022, moradores dos estados de Oregon e Colorado votaram a favor da legalização das substâncias para tratamentos médicos, e a expectativa é de que o uso seja aprovado até 2024. Já no Brasil, a adoção a esses medicamentos deve demorar um pouco mais: por aqui, a psilocibina e o MDMA são usados apenas em estudos científicos bem controlados.
E aí, você pode se perguntar: o que essas substâncias fazem com o nosso cérebro? O uso recreativo, que é ilegal, também traz benefícios? O psiquiatra Antonio Freire, diretor geral e coordenador do programa de residência médica em psiquiatria do Hospital Psiquiátrico Juliano Moreira, explicou, em entrevista ao Aratu On, que esses ingredientes atuam na liberação de serotonina, dopamina e norepinefrina no sistema nervoso central, e é daí que vem a sensação de prazer e bem-estar.
"O MDMA interfere em vários neurotransmissores, e causa a liberação de serotonina, dopamina e norepinefrina no sistema nervoso central, os quais estão envolvidos no controle do humor, regulação da temperatura corporal, sono e apetite. Os efeitos psicoativos do MDMA podem levar a ansiedade reduzida, efeito antidepressivo agudo, percepção visual e auditiva aumentada, pensamento acelerado, euforia e aumento de comportamentos pró-sociais, como um senso de confiança e vínculo", comenta.
Porém, como pontua o médico, também há efeitos adversos - e estes devem ser bem observados: "Os mais frequentes são náuseas, tremores, bruxismo, hiperreflexia, incontinência, tensão muscular, sensação de frio e calor, movimentos oculares involuntários e contração dolorosa da musculatura mandibular. Também são observadas dificuldades cognitivas, como durante a execução de tarefas mentais e físicas".
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O TRATAMENTO
O processo, como detalha o psiquiatra André Gordilho, deve ser feito em dose única: "A ideia seria um tratamento para quadros de depressão resistentes, refratárias, que não respondem aos tratamentos, e seria mais uma medicação que a gente teria à disposição para esses quadros que não respondem aos tratamentos convencionais. Aparentemente, provocariam efeitos rápidos e duradouros".
O problema, como conta André, está em um possível mau uso desses remédios - muito populares em festas. Em casos de pacientes que já tiveram episódios psicóticos ou têm pré-disposição, mas não sabem, os efeitos também podem ser prejudiciais:
"Quando a pessoa tem um quadro psicótico, isso pode fazer com que, durante o uso da droga, o paciente entre em um quadro alucinatório, pré-psicótico. Mas, geralmente, com o tratamento com psicodélico, a ideia é que a dose seja feita com acompanhamento terapêutico do psiquiatra e do psicoterapeuta que vai fazer a intervenção, enquanto a medicação está fazendo efeito. Esses profissionais vão estar ali visando dar uma segurança no tratamento".
Mas, por mais que essa nova opção ainda não seja adotada por aqui, clínicas em todo o país, inclusive na Bahia, já oferecem tratamento para a depressão à base de cetamina, substância que também provoca efeitos alucinógenos. Esse medicamento, como aponta André Gordilho, que trabalha com a substância em Salvador, já foi amplamente estudado no Brasil e teve a eficácia comprovada.
Assim como o MDMA e a psilocibina, a cetamina é usada somente para casos graves, resistentes ou com risco de suicídio. "A cetamina é uma droga anestésica, com propriedades dissociativas, e apresentam um efeito antidepressivo rápido quando usado em doses subanestésicas. É um tratamento que vem sendo bastante utilizado e com uma comprovação científica mais robusta. É uma droga que é segura, mas precisa de uma monitorização e de um ambiente adequado para fazer a infusão".
E, por enquanto, é isso mesmo o que falta para essa outra possibilidade de tratamento, com a substância dos cogumelos alucinógenos e do MDMA, chegue aqui: mais estudos clínicos e artigos científicos feitos no Brasil, como conclui o psiquiatra Antonio Freire: "Apesar do horizonte positivo para a utilização de MDMA em quadros de estresse pós-traumático e de alguns resultados positivos em possíveis mudanças de humor, ainda são necessários maiores estudos para avaliar os efeitos da droga com maior segurança".
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