'Desaparecidos': Dona Guiomar faz buscas por conta própria e mantém quarto do filho intacto após 2 anos
William Rodrigues dos Santos, então com 35 anos, disse que iria à igreja e nunca mais voltou
Pessoas que saíram de casa e não voltaram mais. Mães que não puderam se despedir de seus filhos. Filhos sem notícia da mãe. Nesta terça-feira (24/10), a TV Aratu, em parceria com o Aratu On, exibe o segundo episódio da série de reportagens "Desaparecidos - Mães sem filhos; Filhos sem mães".
"O luto de Dona Guiomar" traz a história de uma mãe que, mais de dois anos depois do desaparecimento do filho, William, mantém o quarto do jeito que ele deixou.
Com texto da jornalista Lorena Dias, produção de Camila Soeiro, arte de Vivian Alecy e edição de JF Neto, a série começou na segunda-feira (23/10) e segue até quinta-feira (26/10), durante o jornal Aratu Notícias, a partir das 19h15. Cada episódio será reprisado no dia seguinte, até sexta-feira (27/10), no Bom Dia Bahia, a partir das 6h30.
Você pode assistir pela televisão, no canal 4.1, pelo aratuon.com.br/aovivo ou no Aratu On, logo após a estreia na TV.
Assista à segunda reportagem da série:
https://youtu.be/HvVoLVwLZYk
Na casa de Dona Guiomar, o quarto de William está do jeito que ele deixou. O perfume ela guarda para lembrar do cheiro do filho. "É difícil, porque aqui ele usava o perfume dele e eu sabia que era o que ele usava pra sair. Fui até eu que fui comprar esse perfume com ele", diz, aos prantos, após borrifar a loção pelo cômodo.
Dona Guiomar borrifou o perfume do filho no quarto e chorou | Imagem: TV Aratu
William Rodrigues dos Santos foi visto pela última vez em 18 de novembro de 2020. Na época, ele tinha 35 anos e a última coisa que disse à mãe é que iria para a igreja.
"Eu saí, fui pro DHPP, prestei a ocorrência, voltei pra casa e aí eu continuei as buscas. Ali eu andava o trajeto onde meu filho foi... E eu não encontrava", lamenta Dona Guiomar.
Mãe de William faz buscas por conta própria | Imagem: TV Aratu
Por meio de nota, a Polícia Civil informou que a Delegacia de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) segue com apuração do caso. Segundo a unidade, diversas diligências e oitivas já foram realizadas. Um ofício também foi expedido ao Instituto Médico Legal (IML) solicitando consultas e realizações de exames de DNA de familiares para inclusão no banco de perfis do Laboratório Central de Polícia Técnica.
"Eu procuro meu filho todos os dias da minha vida. Só basta eu botar o pé pra fora de casa que eu procuro o meu filho. Tem dia que eu chego em casa 1h da manhã, porque eu ando pelas ruas pedindo, mostrando a foto dele para os moradores de rua. Eles olham a foto do meu filho - inclusive me atendem muito bem - e eu continuo esse trabalho, porque é o que me sustenta", destaca Dona Guiomar.
LUTO
Segundo a psicólogoa Ana Clara Bastos, o luto é uma reação à uma perda significativa. A gente fala de um vínculo que não necessariamente é só por morte. Normalmente as pessoas associam 'luto e morte', mas luto é quando a gente perde algo que significativo, então a gente fala de muitas perdas", explica a profissional, especialista no assunto.
Em casos de desaparecimentos, Ana Clara pontua que o luto é ambíguo e existe uma dificuldade maior para elaborar a perda. "A mãe ela fica sempre nessa ambivalência - 'Será que eu perdi meu filho, ou será que eu vou encontrar ele a qualquer momento?' -, então gera outras emoções, de angústia, ansiedade, e a imaginação que vai longe. A gente vai construindo histórias para tentar explicar aquela perda", exemplifica a psicóloga.
Ana Clara Bastos, psicóloga especialista em luto | Imagem: TV Aratu
A especialista destaca que é preciso reconhecer a dor, que tem muita ambivalência e angústia. "Ou seja, você não tem resposta, precisa lidar com aquilo de alguma maneira e, a partir daí, construir esses recursos", diz, para em seguida ressaltar: "as pessoas pensam que viver o luto é superar a perda é eliminar a perda, mas não".
A pessoa pensa em como pode viver a vida, agora, com a pessoa desaparecida de uma forma simbólica, já que ela não está ali concretamente. "Mas a mãe não vai esquecer o filho, nem o filho vai esquecer a mãe", ressalta Ana Clara.
Dona Guiomar não se esquece. Nem se cansa. Agarrando-se à crença de que William está vivo, confessa que mantém o quarto do jeito que o rapaz deixou na esperança de que ele volte. Tudo o que ela quer - e pede - é uma resposta.
"Meu filho, eu te amo! Meu filho, volte pra casa! Alivia o coração da tua mãe que tanto sofre e tanto te procura", implora. "E se alguém 'tá' com você, meu filho, fala com esse alguém pra me procurar. E se você, meu filho, não quiser voltar pra casa, só basta me procurar dizendo 'minha mãe, eu não quero mais voltar pra casa, onde estou eu estou bem'. Eu só quero só uma notícia, uma resposta".
D. Guiomar faz apelo por notícia do filho | Imagem: TV Aratu
DADOS
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, o Brasil registrou 74.061 pessoas desaparecidas em 2022, com uma média de 203 desaparecimentos diários. Desse total, 46,7% se concentram na região Sudeste, seguida do Sul, com 22,3%, e o Nordeste aparece em terceiro lugar, com 14,8% dos desaparecidos do ano passado.
A Bahia teve uma média de um desaparecimento a cada três horas. Conforme dados da Polícia Civil, foram mais de 16 mil ocorrências apenas no primeiro semestre de 2023. Por aqui, uma análise feita pelo Anuário de Segurança Pública, com relação ao perfil dos desaparecidos entre 2019 e 2021, mostrou que 65% eram homens, 51% tinham idade entre 12 e 17 anos, e 95% eram negros.
DISQUE-DENÚNCIA
Caso você tenha alguma informação sobre uma pessoa desaparecida, entre em contato com a polícia (de forma anônima, se preferir) através do número 181.
No próximo episódio vamos saber como estão os filhos de Bete, desaparecida em 2019. A titular da Delegacia de Proteção à Pessoa vai falar das investigações de desaparecimentos.
Ficha técnica da série “Desaparecidos”:
Produção: Camila Soeiro
Reportagem: Lorena Dias
Arte: Vivian Alecy
Imagens: José Sena, Raimundo Carvalho e Robson Melo
Edição: JF Neto
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