Ancestralidade e natureza: turismo afro-indígena promete movimentar economia baiana no pós-Covid
Crédito da foto: Elói Correa/GovBa
O setor turístico está de olho em um segmento que deve crescer com o avanço da vacinação contra a Covid-19 e a reabertura dos serviços nas cidades: o turismo étnico, afro e indígena, que está incluído dentro do guarda-chuva do ‘turismo de experiência’.
Esse nicho deve movimentar aldeias indígenas do Sul, Extremo Sul e Baixo Sul da Bahia na próxima temporada, entre os meses de agosto e dezembro, quando haverá o aumento da curva da retomada econômica após tanto tempo de medidas sanitárias anti-Covid.
Chapada Diamantina e Recôncavo Baiano também são localidades polos desse setor, por causa das comunidades quilombolas, alvo de grande busca pelos turistas que estão voltados mais para a natureza, por uma série de fatores que tenho ouvido de gente da área.
Especialistas do trade turístico apontam que esse segmento sempre foi potencial dentro do setor de serviços, mas a pandemia catapultou as procuras, já que as pessoas passaram a buscar experiências coletivas e integradas à natureza, ao fazer manual, às tradições.
E em natureza, coletividade, fazer manual e tradições, não tem para ninguém... a Bahia lidera com folga. Tem a Costa do Descobrimento, alcunha que os indígenas não simpatizam por motivos históricos óbvios, e as principais comunidades negras tradicionais do Brasil.
“Antes da pandemia, as pessoas estavam muito individualizadas, então já havia gente buscando viver em comunidades para fugir disso. Após a pandemia, essa necessidade aumentou mais ainda, por causa dos impactos do processo de isolamento”, explica Tâmara Azevedo, consultora em Gestão de Políticas Públicas de Turismo e diretora-executiva da agência Bahia Turismo e Arte, uma das empresas (uma das únicas) que estão apostando nesse ‘boom’ e oferecem pacotes diversos para esse tipo de turismo.
As pesquisas do setor indicam tanto potencial a ponto de municípios dessas regiões estarem contratando consultorias para aprender como explorar o segmento. Já há movimentações nesse sentido em Porto Seguro e Cabrália (no Sul do mapa da Bahia), Cachoeira e Santo Amaro (vizinhas do Recôncavo) e na badalada Itacaré.
Esse sentimento, de acordo com a consultora, já era detectado antes do isolamento social em uma faixa específica de turistas internacionais, principalmente de pesquisadores e acadêmicos. Mas agora ampliou, como ela disse, por causa da nova dinâmica pandêmica.
O foco desses visitantes é entrar na rotina dessas comunidades, como um “retorno à ancestralidade, aos conhecimentos ancestrais”. E nesse desejo entra também busca por cura, bem-estar espiritual, conexão com a natureza, além da interação com produção artesanal, produção de farinha, dendê in natura, plantas comestíveis não tradicionais e seus milagres, grupos de samba, grupos de capoeira… As possibilidades são infinitas.
Atualmente, o Parque Nacional Monte Pascoal, onde fica a Aldeia Pé do Monte, em Porto Seguro, já recebe mil visitantes por mês. Já a Aldeia Reserva da Jaqueira, no mesmo município marco do descobrimento, recebe diariamente 150 clientes somente da CVC, a agência mais conhecida do setor turístico localmente. Todo esse público é de gente que quer dançar o toré (espécie de ‘xirê’ indígena), jogar arco e flecha, cabo de guerra e outros jogos tradicionais. Ou se conectar com a história quilombola.
Em Itacaré, onde o ex-secretário de Turismo do Governo do Estado da Bahia, José Alves, comanda a gestão do setor há menos de um mês, esse nicho será um dos focos, segundo o próprio antecipou para a coluna do Aratu ON.
Será elaborado, inclusive, um planejamento transversal do turismo, com o objetivo de orientar essa guinada. “Uma das minhas missões é a valorização da cultura, no que diz respeito às pessoas entenderem a cidade, como ela foi criada, suas tradições”, explicou Alves, é ex-diretor da Associação Brasileira dos Agentes de Viagem.
A partir da estrada que tem, ele está organizando atividades para o treinamento dos guias turísticos e demais profissionais do município. Alves destaca que esse ‘boom’ do turismo étcnico se dá porque o turismo para natureza vai ser potencializado durante essa retomada econômica, já que estar ao ar livre também é um atenuador da transmissão do coronavírus.
Além de tudo, essa é uma versão sustentável de viagem. As comunidades não precisam mudar seu modo de viver para receber o visitante, porque a atividade que a comunidade já realiza é o interesse focal deles. Logo, problemas como descaracterização das tradições, folclorização e outros, comuns na interação entre o estrangeiro e o nativo, são evitados.
Um resumo em números?
Esse movimento vai levar as cidades envolvidas, que estavam tendo menos 40% de ocupação durante as restrições, para um patamar de 70% ou até 80% de movimentação.
Ainda não há dados exatos de quanto movimenta especificamente o turismo étnico afro e indígena. Mas o turismo movimenta 59 segmentos da economia, o que nos diz muito sobre o quanto essa “novidade” pode render para a Bahia no campo objetivo. Do lado simbólico, nos ajuda, no mínimo, a reafirmar a identidade nacional de um país afro-indígena.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.