PROFISSÃO PROSTITUTA: Profissionais do sexo querem sair da marginalidade e lutam por direitos trabalhistas

PROFISSÃO PROSTITUTA: Profissionais do sexo querem sair da marginalidade e lutam por direitos trabalhistas

Por Heloísa Gomes.

PROFISSÃO PROSTITUTA: Profissionais do sexo querem sair da marginalidade e lutam por direitos trabalhistasReprodução

Na Grécia e no Egito antigo, as prostitutas eram respeitadas, consideradas grandes sacerdotisas, portanto sagradas. Recebiam honras e presentes em troca de favores sexuais. Hoje, marginalizados e expostos à violência, profissionais do sexo buscam reconhecimento profissional e direitos trabalhistas. “Nós temos alma, razão, coração e queremos ser reconhecidos como profissionais, queremos autonomia”, diz Keila Simpson, presidente da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra).

Considerada como uma das profissões mais antigas do mundo, a prostituição é tratada no código penal desde 1942. Segundo Adriana Wyzykowski, professora de direito da Faculdade Baiana de Direito e da Universidade Estadual da Bahia (UNEB), “o código penal vitimiza o profissional e acaba favorecendo o agenciador. Muitos gostam do que fazem e não querem ser vistos como vítimas, querem autonomia, respeito e liberdade para trabalhar”.

Existem três sistemas legais sobre prostituição: o regulamentarismo, que estabelece um contrato, aposentadoria e garantias trabalhistas – adotado por países sul americanos como Uruguai, Equador e Bolívia. Na Europa, Alemanha e Holanda são grandes exemplos. “Em Amsterdã [Holanda] é diferente. O curioso é que lá tem uma famosa rua onde os profissionais ficam expostos em vitrines e os clientes escolhem. Nestes países os direitos trabalhistas são garantidos”, conta Adriana. Já os Estados Unidos adota o proibicionismo, nele todos são punidos. Tanto o agenciador como os profissionais, o estado é quem define sobre o que cada um deve fazer com o seu corpo.

O Brasil adota o abolicionismo, significa que uma pessoa praticar prostituição não é crime, o ato ilícito está configurado naquele que explora ou agencia. Ou seja, pune o dono da casa de prostituição, não o profissional. “Isso não tem eficácia social, porque na prática isso [prostituição] acontece, é uma hipocrisia. Os agenciadores que são beneficiados, já que não tem vínculo empregatício e não pagam os direitos dos trabalhadores”, avalia a advogada.

De acordo com a professora, a maioria das pessoas que exercem a prostituição é formada pela comunidade LGBT e mulheres de baixa renda, “a sociedade não dá oportunidade igual para as pessoas, o que favorece a prostituição. A profissão precisa ser uma escolha, não uma condição”, afirma.

CENÁRIO DESFAVORÁVEL:

Bancada evangélica em protesto contra a Parada Gay Foto: Reprodução

Bancada evangélica em protesto contra a Parada Gay Foto: Reprodução

Com a nova conjuntura conservadora instalada na Câmara dos Deputados, pautas voltadas para questões como esta dificilmente serão aprovadas. Para evitar uma derrota, a comunidade LGBT adotou uma estratégia: informação. “Primeiro queremos esclarecer a população promovendo um debate sobre o assunto, antes seria interessante discutir identidade de gênero [PL 5002/2013 – Lei João Nery], primeiro transexual do Brasil. [Projeto de autoria dos deputados Jean Wyllys (PSOL – RJ) e Érika Kokay (PT – DF)] com a população e depois partir para a cobrança da votação no plenário”, admite.

NÃO QUERO “PROSTITUTA” NA CARTEIRA DE TRABALHO:

Carteira de trabalho

Enquanto alguns profissionais lutam pelo reconhecimento da profissão e por direitos trabalhistas outros classificam a lei como irrelevante para suas condições de trabalho e até mesmo desnecessárias. “Ninguém vai querer aparecer, não tem fundamento. As pessoas trabalham justamente para sair disso [prostituição] ou para resolver algum problema financeiro. Na verdade a gente sente vergonha, se afasta dos amigos porque não vão entender. Existe muito preconceito”, desabafa Mariana, prostituta de elite.

Mariana tem um perfil em uma agência online, nela homens, mulheres e gays colocam suas descrições físicas e fotos, além dos contatos profissionais. Em uma conversa franca Mariana contou detalhes de como funciona a prostituição no Brasil. “Antigamente existia a figura do “cafetão”, hoje ninguém quer mais isso. Preferimos pagar mensalmente por anúncios em sites e fazer parcerias com boates ou casas. Neste caso precisamos que o cliente consuma um determinado valor, alguns lugares cobram taxa de saída [o cliente só sai com a garota caso pague um valor para sair do local] ou ainda despesas do aluguel do quarto, quando tem”.

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Com cinco anos de profissão a jovem de 28 anos saiu do Rio Grande do Sul para Salvador alegando que no Norte e Nordeste o mercado é mais generoso, “no sul e sudeste tem muita menina bonita a oferta é grande. No Balneário Camboriú muitas meninas fazem programa, por exemplo. Aqui dá para cobrar mais caro. Inclusive no sul e sudeste as pessoas preferem mulheres negras, por aqui preferem mulheres de pele branca, parecem ser bastante preconceituosos”, revela.

Antes Mariana curso 1 ano e meio de direito, depois dois anos e meio de administração e educação física. Decidiu se prostituir porque estava cansada de trabalhar muito e não ser reconhecida profissionalmente, além da baixa remuneração. “Trabalhando em um escritório de administração eu ganhava 1.800 por mês e por mais que me doasse 100% as pessoas não estavam satisfeitas. Agora eu cobro em média R$ 400,00 (quando em baixa) 1h de programa ou R$ 550,00 1h completo (incluindo sexo anal).

Sobre a regulamentação a garota de programa é contrária, “já ficaremos marcados pela vida toda pela nossa consciência, não quero me associar à profissão. Quem quer ter “prostituta” na carteira de trabalho? Como vou conseguir outro emprego depois?”, questiona.

Leo Silveira, 25 anos, considera irrelevante,”para mim será mais uma lei. Não muda nada. Eu trabalho como autônomo e posso pagar INSS, eu não tenho vínculo com ninguém, trabalho por conta própria então não acho que tenha necessidade disso”.

DAS TREVAS PARA A LUZ:

Foto 1

“90% da população de travestis que se prostitui trabalham na rua, completamente a mercê da violência. A Lei Gabriela Leite [PL 4211/2012], apesar de algumas problemáticas garante políticas públicas, saúde e dignidade ao trabalhador”, diz Keila Simpson, presidente do Antra. A Lei 4211/2012 é de autoria do deputado estadual Jean Wyllys (PSOL/RJ) e está paralisada desde 2015 na Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.

Para Keila a discussão dos direitos trabalhistas devem ser feitas dentro de uma lógica jurídica. A melhor forma de avançar nas questões que envolvem direitos das minorias dependem de um amplo debate com a sociedade civil. “As pessoas não podem ser reféns de manchetes sensacionalistas ou se basear apenas no discurso de uma determinada emissora. É preciso pesquisar sobre o assunto, conhecer mais afundo e a partir daí formar opinião, criticar e propor”.  As lideranças religiosas ainda influenciam no modo como as pessoas enxergam a comunidade LGBT. “Assim como vimos na votação do impeachment [de Dimla Rousseff], as pessoas votam leis e assumem posturas fundamentadas em fanatismo, por líderes religiosos ou de outras lideranças que querem apenas que as pessoas reverberem o pensamento deles”, acredita.

Os profissionais do sexo já podem trabalhar como autônomos e podem recolher INSS por meio da classificação da prostituição na Categoria Brasileira de Ocupação (CBO). O Projeto de Lei pretende criar um vínculo empregatício para desfavorecer a exploração sexual – quando uma pessoa é obrigada a praticar sexo com retorno financeiro direcionado a uma terceira pessoa (explorador). Entre algumas conquistas, assinatura da carteira de trabalho, FGTS, décimo terceiro salário, adicional noturno, salário, entre outros. “A lei apenas quer garantir a legalidade de quem exerce. Trabalha com prostituição quem quer”, pontua Simpson.

 

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