Fome e conveniência
Crédito da foto: arquivo/Agência Brasil
A quantas anda a sua alimentação nesses tempos de pandemia?
A Agência Brasil informou, ao final de 2020, que mais de 19 milhões de pessoas no nosso país passavam FOME.
Não sei, de verdade, o que é passar fome ou assistir um filho nessa condição. Porque não é aquela que a gente conhece, que dá entre uma refeição e outra. É algo muito profundo, que debilita, humilha, dói lá dentro, entristece, desespera. Creio.
E eu aqui me preocupando se vou, ou não, repetir o menu.
Precisamos ser mais solidários. Não tem como pensar que isso é normal. Achar que fechando o vidro do carro ou se abrigando em condomínios o problema vai deixar de existir.
Cheguei a me reunir com empresários de restaurantes e cozinheiros da nossa Soterópolis e nos mobilizamos para preparar e distribuir quentinhas e cestas básicas.
Mais de um ano se passou. A segunda onda veio bombando com o cheiro acre da irresponsabilidade governamental. Morreram mais de 430 mil pessoas, mais que o dobro de baixas da guerra do Iraque.
Hoje, o cenário instalado é de desemprego, inflação nas alturas, economia em frangalhos, e nós que ajudamos no ano passado, fomos definhando também, impotentes sem os clientes. Condição ruim de empresário, mas privilegiada de quem não viu faltar comida na própria mesa.
Chego a sentir vergonha de achar que pode existir qualquer outra coisa para chamar de difícil, quando me deparo com o real problema da fome. Acontece que quando falamos em insegurança alimentar, essa é apenas uma de suas faces. Provavelmente, a mais perversa e feia.
Contudo, também causa preocupação o fato da maior parte dos lares brasileiros estarem expostos às consequências nefastas de uma alimentação equivocada, deficiente e desequilibrada. Do consumo excessivo de sódio, açúcar e gordura hidrogenada. Dos riscos das tantas toxinas cancerígenas contidas em conservantes químicos e aditivos presentes nos super processados que chamamos de CONVENIÊNCIA.
Eu, cozinheiro com mais de vinte anos de profissão, ativista do Slow Food, confesso que também me vejo magnetizado por essas facilidades e que termino cedendo mais do que deveria.
Mas, antes de atirarem a primeira pedra, lembrem que estamos falando de pelo menos três refeições diárias. Todos os dias. Dá muito trabalho. As vezes é mesmo de enlouquecer. Planejamento, compras, protocolos de “alquingel” nas coisas, e guarda no armário, prepara, serve, recolhe, guarda na geladeira, lava, arruma, tira o lixo e daqui há pouco já começa tudo de novo.
E a indústria da fast-food e suas agências de marketing terminam por nos vencer no cansaço.
Nas próximas colunas sigo compartilhando ideias para detectar e driblar essas armadilhas.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.