
Bruxismo: o olhar do especialista de dor sobre o assunto
Atualizado em 19 de jan. de 2022 17h17
Publicado em 19 de jan. de 2022 17h00
Atualizado em 19 de jan. de 2022 17h17
Publicado em 19 de jan. de 2022 17h00
Foto: ilustrativa/Pexels
O ranger dos dentes tem sido descrito na literatura cientifica como bruxismo desde 1906, quando foi considerado um comportamento oral, relacionado a percepção de dor e raiva. Em verdade representa uma patologia de prevalência crescente e que acomete cerca de 30% da população, comprometendo a sua qualidade de vida, fato que preocupa não apenas o paciente, mas também as equipes de saúde. Hoje, o bruxismo é definido como uma atividade muscular mastigatória rítmica, caracterizado pelo apertamento ou ranger dos dentes, fenômeno regulado principalmente pelo sistema nervoso central e influenciado perifericamente.
A Academia Americana de Medicina do Sono considera o bruxismo como um distúrbio relacionado ao sono. O bruxismo apresenta duas manifestações circadianas distintas: bruxismo do sono e bruxismo acordado, também conhecido com bruxismo de vigília, os quais compartilham fatores de risco comuns e levam a consequências semelhantes para o sistema mastigatório. Este comportamento oral alterado tem sido associado ao desgaste e perda de unidades dentárias, mas representa muito mais, estando atrelado a sensibilidade dos músculos mastigatórios, dores de cabeça, distúrbios do sono; distúrbios respiratórios do sono, como síndrome de apnéia do sono e hipopnéia; transtornos de comportamento e até ao uso de alguns medicamentos.
Tem sido comprovado que alguns fármacos frequentes na prescrição de pacientes portadores de dor crônica podem agravar o bruxismo, como antidepressivos inibidores seletivos da receptação da serotonina ou da noradrenalina, antipsicóticos e anfetaminas. Sabe-se que o bruxismo é influenciado por fatores psicossociais e comportamentais, o que significa que atividades parafuncionais oromandibulares, disfunções temporomandibulares, má oclusão geralmente estão presente em pacientes com altos níveis de ansiedade e estresse. Acredita-se que a sua etiologia seja multifatorial, embora observe-se que os distúrbios psicológicos têm destaque como causa deste distúrbio funcional.
Apesar do quadro clínica e das comorbidades descritas, é importante ressaltar que as evidências científicas disponíveis não suportam a visão de que o bruxismo é uma causa direta de dor, o que deve ser levado em consideração no tratamento e no manejo de pacientes. Um dos princípios do tratamento da dor é buscar identificar a sua causa. Estas observações fortalecem a necessidade do diagnóstico etiológico da dor e do tratamento multiprofissional precoce, com o intuito de prevenir a sua progressão e as consequências citadas.
Estudos demonstram que o bruxismo do sono pode ocorrer em qualquer idade, porém é mais frequente em crianças do que em adultos, sendo mais prevalente em adolescentes do sexo masculino. Em crianças a evolução do bruxismo geralmente é satisfatória, desde que diagnosticado e tratado precocemente. Acredita-se que o estresse e a ansiedade também estão no centro da etiologia do bruxismo neste grupo de pacientes, o que pode estar relacionado ao número crescente de tarefas e demandas das crianças e adolescentes nos dias atuais. Algo interessante a observar nestas faixas etárias é que pode existir uma relação entre parafunções e bruxismo do sono, portanto morder os lábios, unhas ou canetas podem desempenhar um papel importante na gênese do bruxismo em crianças. Neste contexto, eliminar tais comportamentos torna-se primordial na profilaxia e no tratamento do bruxismo.
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico do bruxismo geralmente é um processo complexo, que envolve a necessidade do olhar atento do paciente e de seus familiares e a avaliação por uma equipe de saúde treinada. Geralmente há presença de sons característicos gerados pelo ranger dos dentes durante o sono, redução da abertura da boca, estalidos, crepitações na articulação temporo-mandibular e dores musculares. Apesar deste quadro rico, apenas estes sinais e sintomas não são suficientes para se fechar o diagnostico desta patologia. É preciso a realização de um exame físico detalhado e a realização de alguns exames complementares, os quais só poderão ser feitos e solicitados por profissionais específicos. Os profissionais mais procurados com este fim são os odontólogos e médicos especialista em dor e disfunções orofaciais.
O segundo passo após o diagnostico é buscar o tratamento específico. Este é tido como desafiador e envolve a utilização de aparelhos oclusivos durante o sono para proteger os dentes contra a abrasão e fratura patológica, fisioterapia, acupuntura, biofeedback, fotobiomodulação, terapia psicológica, com mudança de hábitos indesejáveis, redução do estresse e higiene do sono, buscando sempre um estilo de vida mais saudável.
O tratamento farmacológico pode ser necessário, quando isto ocorre este é feito através da administração de relaxante muscular, benzodiazepínicos e alguns anticonvulsivantes. É importante lembrar que a educação dos pacientes e da equipe de saúde no que diz respeito ao diagnostico e aos tratamentos disponíveis mostram-se fundamentais, pois só desta forma é possível minimizar os efeitos precoces e tardios do bruxismo ao longo da vida dos pacientes.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.
Dra. Anita Rocha é médica Algologista , coordenadora do Itaigara Memorial Clínica da Dor, membro titular da Sociedade Brasileira de Anestesiologia; da Sociedade Brasileira de Dor e da Sociedade Brasileira de Médicos Intervencionistas da Dor. Possui residência médica em Anestesiologia pelo CET Obras Sociais Irmã Dulce; em Clínica da Dor pela UNESP-Botucatu e formação em Técnicas Intervencionistas para o tratamento da dor na Singular/Campinas.
Instagram: @draanitarocha