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Caso Cabula: após absolvição de PMs, mortes são denunciadas à Justiça internacional

Caso Cabula: após absolvição de PMs, mortes são denunciadas à Justiça internacional

Por Da Redação

Caso Cabula: após absolvição de PMs, mortes são denunciadas à Justiça internacionalLúcio Távora/Agência A Tarde

A sociedade baiana recebeu neste final de semana a notícia de que nove policiais suspeitos de participação nas mortes de 12 pessoas foram inocentados pela Justiça. A informação surpreendeu o Ministério Público estadual e membros de entidades de proteção aos direitos humanos, já que o parecer da juíza foi realizado sem que a acusação, no caso o MP, fosse ouvida.


Os policiais estavam sendo julgados por uma ação que aconteceu no último dia 06 de fevereiro, na região da Vila Moisés, no bairro do Cabula, em Salvador. À época, a polícia afirmou que os mortos seriam bandidos que estariam planejando um assalto a banco. Segundo a versão policial, eles foram alvo de uma operação que resultou em uma troca de tiros, motivada pela reação dos suspeitos. Do lado policial, um homem teria sido baleado de raspão.


Judiciário Comprometido


Cabula 2

Foto: Reconstituição/Cláudio Max/TV Aratu


A divulgação da decisão da juíza Marivalda Almeida Moutinho, que substitui o responsável pela ação, juiz Vilebaldo José de Freitas Pereira, que está em seu período de férias, causou revolta em membros de organizações da sociedade civil, como o coordenador do Observatório da Segurança Pública da Bahia, Carlos Alberto da Costa Gomes. “Os policiais foram liberados por uma juíza substituta que ignorou todas as etapas do processo. Ela pode ter agido de acordo com o que a lei prevê, mas não foi de acordo com o que a lei determina. Houve um erro grave de procedimento. Entre eles o fato de que ela não ouviu o Ministério Público estadual, responsável pela acusação. Ela não seguiu os parâmetros necessários para a elaboração de uma sentença. Esta mesma lei que ela usou determina que ela também se inteire dos fatos antes de qualquer conclusão”, avalia o professor.


Costa Gomes vai além e afirma que o caso se tornou uma disputa entre a Secretaria de Segurança Pública (SSP) e o MP. “O que está havendo não é uma busca pela justiça, está beirando a molecagem”, afirmou o professor, afirmando ainda que “o Ministério Público não é composto por um bando de moleques que iriam se propor a fazer uma acusação sem fundamento”. Para Costa Gomes, é necessário que haja um respeito mútuo entre as instituições, o que não é testemunhado neste caso. De acordo com o professor,  a SSP se insurgiu contra a conclusão do MP. “Isso não existe, a Secretaria não pode desqualificar o Ministério Público do Estado, não pode dizer que ele está mentindo”.


Seguindo o mesmo raciocínio, o professor avalia que o judiciário baiano não é imparcial. “O que nos falta é um judiciário independente. Aqui na Bahia ele ‘come na mão’ do Poder Executivo, quando o judiciário deveria processar todos por crime de prevaricação”. Prevaricação é o termo usado para o crime cometido por um funcionário público quando, indevidamente, este retarda ou deixa de praticar um ato, ou pratica-o contra disposição legal expressa, visando satisfazer interesse pessoal. Para o professor, este caso exemplifica que quem tem poder no Estado tende a favorecer questões que não são de interesse da população, acobertando situações que possam interferir em interesses próprios. “Quando o governo foi à imprensa apoiar a ação dos policiais, ele buscava ter esta categoria em sua base política”, afirma.


Costa afirma haver pontos que não podem ser ignorados neste processo. “Vamos aos fatos. O que temos nessa história é que houve uma chacina de 12 pessoas que comprovadamente não eram bandidas e que foram assassinadas por policiais. O Ministério Público deu uma resposta a uma ação completamente improvisada pela polícia, já que pela investigação do órgão foi comprovado que não havia ordem para operação alguma na região naquele dia. Ficou claro que isto foi usado como argumento para esconder a verdade”, avalia o professor, referindo-se ao fato de que, após as mortes, a polícia ter divulgado oficialmente a versão de que a troca de tiros teria sido resultado de uma operação que visava prender assaltantes de banco. Costa Gomes enfatiza que “os representantes públicos da sociedade, eleitos pelos votos dos cidadãos, não têm poder para fazer o que querem, já que vivemos em um Estado regulamentado por leis”.


Lei Internacional

A notícia da decisão da juíza Moutinho foi divulgada por uma reportagem da jornalista Flávia Marreiro, publicada na versão digital do EL País no Brasil. Após a repercussão, o governador Rui Costa, que no mesmo dia comparou a ação policial com a de um “artilheiro em frente ao gol”, disse que não comentará a decisão da Justiça, já que o processo corre em segredo. O governador ainda disse querer saber de onde a informação teria surgido. Já a SSP disse que não comentará mais o caso. A Secretaria de Comunicação do governo manifestou-se informando que mantinha a mesma postura apresentada em coletiva pelo Secretário de Segurança Pública, realizada no último dia 3 de julho. Nela, Maurício Barbosa afirmou que os policiais agiram em legítima defesa, mesma conclusão do inquérito policial apresentado pela Polícia Civil. Já a assessoria de comunicação do Tribunal de Justiça divulgou que a magistrada alegou ter baseado sua decisão nas provas que existiam nos autos.


Em entrevista ao Aratu Online, o representante do grupo social Reaja ou Será Morto, Hamilton Borges, disse que o caso já está na Comissão de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). “Diante desta decisão acelerada de pular etapas, estamos pedindo que uma comissão da OEA venha de forma urgente à Bahia para realizar uma investigação própria. Esta juíza não respeitou o convencimento do próprio juiz titular do caso  e praticamente matou por uma segunda vez os jovens do Cabula. Ela tirou das famílias a chance de se fazer justiça”, afirmou.


Borges explica que, após uma investigação independente, a comissão da OEA apresentará a conclusão à Justiça Global. Dependendo da conclusão do processo, o país será recomendado a seguir a determinação e, caso não a acate, poderá sofrer sanções. O representante do Reaja afirma que ele e outros membros do grupo têm recebido ameaças de morte para que se afastem do caso, com mensagens como “reaja e morra”. “Nós não vamos recuar nem vamos ser convencidos pela guerra midiática da SSP, que mais uma vez confirma que a Rondesp é a ‘polícia política’ deste governo, com poder para julgar e sentenciar seus suspeitos”.


Defesa e Recurso

O Aratu Online entrou em contato com o advogado dos policiais suspeitos no caso. Dinoermeson Tiago Nascimento atendeu à ligação e pediu que o contato fosse feito um pouco mais tarde, mas não atendeu às tentativas seguintes. Em entrevista ao jornal A Tarde, ele afirmou que teve acesso à decisão de 15 páginas da juíza Marivalda Almeida Moutinho. Ele relatou que a magistrada aceitou a tese de que houve legítima defesa dos policiais com base nas provas periciais apresentadas pelo inquérito policial. “Quem saiu ganhando foi a sociedade. A decisão mostra que o judiciário está sensível com a situação dos policiais”, disse. Ainda de acordo com ele, “a juíza não achou necessário ouvir testemunhas e outros envolvidos no caso porque todos já haviam prestado depoimento durante o inquérito da Polícia Civil, com o acompanhamento do Ministério Público”.


Em contrapartida, em contato com a produção da TV Aratu, o promotor Davi Gallo informou que a juíza jamais poderia ter tomado esta atitude antes de intimar um representante do órgão, ou ouvir as partes envolvidas. Ainda de acordo com o promotor, o caso do Cabula não pode ser analisado tendo como base a ótica do Código de Processo Civil, ?pois isto é ilegal?. Gallo informou que, após a análise dos fatos, o MP-BA deve entrar com um recurso para derrubar a decisão.


Esta não é a primeira vez que os promotores questionam ações relacionadas ao caso. No início do mês, quando a SSP divulgou o resultado do inquérito policial que apontava um parecer diferente daquele produzido pelos promotores, Gallo questionou os procedimentos.


O caso 


Cabula 3

Foto: Divulgação Polícia Militar


Doze pessoas morreram na madrugada do dia 6 de fevereiro por volta das 2h, durante uma suposta troca de tiros entre bandidos e policiais militares, na região da Vila Moisés, no bairro do Cabula. Na ocasião, o Departamento de Comunicação Social da PM-BA informou que a ação aconteceu quando três guarnições da Rondesp Central e duas da 23ª CIPM (Tancredo Neves) estavam averiguando a situação de um veículo suspeito, próximo a uma agência bancária.


Ainda de acordo com a PM, o tiroteio começou após os policiais perceberem a presença de cerca de 30 homens armados, alguns com uniformes semelhantes aos do Exército e carregando mochilas, em uma baixada do entorno do local. A PM disse, também, que quando os militares abordaram o grupo, foram recebidos a tiros. Teria havido revide, resultando nas mortes. Os parentes e vizinhos das vítimas, entretanto, alegam que houve uma execução, versão que foi confirmada pela investigação realizada pelos promotores do MP.


Policiais nas ruas

Os nove policiais militares envolvidos na ação voltaram às ruas em março. A informação foi confirmada pelo capitão Bruno Ramos, porta-voz da PM-BA. Os agentes envolvidos foram reincorporados após passarem por tratamento psicológico.


O detalhe é que, durante esse período (de março a julho), a instituição dizia que eles estariam exercendo funções administrativas. Há cerca de um mês, o Aratu Online voltou a entrar em contato com a PM para tratar do tema e foi informado que os agentes não estavam trabalhando nas ruas. Para explicar o mal-entendido, o Capitão disse que houve uma falha na comunicação e pensou ter se tratado do caso Geovane, onde militares também foram afastados.


 


 


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