CINCO MESES DEPOIS: Familiares e amigos de estudante morto na Federação pedem justiça
CINCO MESES DEPOIS: Familiares e amigos de estudante morto na Federação pedem justiça
A dor que estremece a voz da dona de casa Maria de Fátima dos Santos é sentida na alma ao lembrar da ausência do filho mais velho, Felipe dos Santos Silva, conhecido também como Felipe Doss, mais uma vítima da violência brutal que se agrava a cada dia.
De sorriso fácil e argumentos fortes, Felipe tinha vários sonhos que foram interrompidos de maneira trágica: um tiro na cabeça, após reagir à abordagem de dois ladrões que tentaram roubar seu celular. Foi o suficiente para o jovem, de 26 anos, sair de casa para comprar pastel e nunca mais voltar. Desde então, familiares e amigos da vítima buscam respostas para o crime, que ocorreu há mais de cinco meses e ainda permanece sem respostas.
Morador do bairro de Itinga, na cidade de Lauro de Freitas, os anos que antecedem a sua morte foram marcados por luta social e descobertas. Aprovado no vestibular da Universidade Federal da Bahia (Ufba), em 2009, Felipe foi o primeiro da família a ingressar em uma universidade pública.
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Apesar da consciência política desenvolvida desde a adolescência, foi o contato com o ambiente acadêmico que despertou no estudante o desejo de lutar por uma realidade melhor. Em vida, foi conhecido por atuar na militância LGBTQ no movimento estudantil; de ter participado de várias ações em defesa da universidade; de grupos sociais marginalizados, além de integrar o Diretório Central dos Estudantes (DCE).
“Eu vejo o caso do meu filho igual ao da Marielle, a diferença é que ela era vereadora e o Felipe não, mas eles lutavam e se mobilizavam pelas mesmas questões. É uma dor que não passa. Quando penso que está melhorando, surge alguma coisa que me faz lembrar dele. É como se, nesses cinco meses, eu continuasse vivendo, todo dia, o mesmo 9 de novembro [dia do crime]”, pontua a mãe da vítima.
FUTURO INTERROMPIDO
De origem humilde, o estudante via nos estudos a possibilidade de um futuro melhor para ele e para a família. Em suas anotações, a mãe relata que o jovem colocava no papel os planos seguintes a graduação, associando a idade com o grau acadêmico. Aos 36 anos, ele pretendia já ter concluído o doutorado.
Nos seus últimos dias de vida, Felipe vivia momentos intensos. A festa surpresa realizada por seus amigos em outubro, a expectativa da formatura – que aconteceria em fevereiro deste ano – e a viagem feita uma semana antes da sua morte para a cidade de Andaraí, na Chapada Diamantina, proporcionaram reflexões que o estudante até tentou compartilhar em suas redes sociais, mas não teve tempo.
Já formado, o planejamento de toda família era que Felipe voltasse para Itinga, para morar próximo dos pais e do irmão mais novo. A casa que mantinham de aluguel foi desocupada à espera do futuro professor de geografia que retornaria ao seu lar, desta vez, não só de passagem – como fez durante os últimos anos que passou morando em Salvador, por conta dos estudos. Hoje, o vazio e o silêncio no imóvel, evidenciam o sofrimento de toda a família diante da perda.
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Vivendo na capital, Doss logo se destacou na sua atuação política, o contato com a militância acadêmica fez com que o jovem conhecesse diversas partes do país, através de eventos e reuniões que participava, sempre defendendo os ideais da população negra e LGBTQ. As viagens feitas por Felipe mexiam na rotina de toda a família, a principal preocupação de sua mãe era que o filho fosse vítima de homofobia.
“Eu dizia para ele nunca ficar só nos lugares, porque eu sempre via na televisão crimes envolvendo discriminação e era disso que eu ficava com medo e falava: ‘Você, que gosta de viajar e ficar em festa no Rio Vermelho, fica lá até amanhecer para pegar seu transporte e evitar assalto, confusão’, mas ele me chamava de medrosa e mandava eu ficar calma'”, relembra.
Veja vídeo:
INVESTIGAÇÕES
Felipe estava morando há 17 dias com amigos no Parque São Brás, na Federação, quando saiu de casa para comprar um pastel e foi assassinado. Na época, testemunhas relataram que ele estava voltando para casa quando um carro Fiat Siena, cor prata, encostou e dois homens armados anunciaram o assalto. O estudante teria tentado correr e foi baleado na cabeça.
Um dia após o crime, um carro – semelhante ao que foi usado pelos assassinos de Felipe – foi encontrado abandonado próximo da Avenida Barros Reis. O veículo teve a placa arrancada e estava em um matagal. O caso está sendo investigado pelo titular da 7ª Delegacia (Rio Vermelho), delegado Antônio Fernando do Carmo, e os indícios apontam para latrocínio (roubo seguido de morte).
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Ao Aratu Online, a assessoria de comunicação da Polícia Civil informou que o processo de investigação está bastante adiantado e que não poderia passar mais informações para não atrapalhar a conclusão do inquérito.
ADMIRADO POR TODOS
Embora a ida prematura, na lembrança dos amigos e familiares, Felipe será lembrado como uma pessoa alegre, querida e resistente.
“Ele parecia ser sempre imbatível em tudo, tanto fisicamente, quanto ideologicamente. Ele podia passar um dia triste, após sofrer uma derrota ou desilusão, mas no dia seguinte parecia que nada tinha acontecido. Felipe tinha essa força”, relembra a estudante Lorena Pacheco, melhor amiga da vítima.
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*Publicada originalmente às 10h15 (23/4)