RESPOSTAS DE UMA TRAGÉDIA: Medo acompanha passageiros da travessia Salvador-Mar Grande
RESPOSTAS DE UMA TRAGÉDIA: Medo acompanha passageiros da travessia Salvador-Mar Grande
O Aratu Online publica, nesta segunda-feira (25/9), a segunda matéria da série especial ?Respostas de uma Tragédia?. A primeira foi veiculada ontem e mostrou situações de sobreviventes, referentes às assistências que têm recebidos da empresa proprietária da lancha Cavalo Marinho I e autoridades competentes. Os personagens foram vítimas de um naufrágio ocorrido na Baía-de-Todos-os-Santos que, neste domingo (24/9), completou um mês.
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As matérias produzidas nesta série objetivam encontrar respostas para algumas situações relacionadas com o triste episódio que enlutou todo o estado da Bahia.
Nesta segunda parte, a nossa reportagem realizou a travessia Salvador/Mar Grande/Salvador para conferir quais mudanças foram adotadas na segurança, após a tragédia.
Boa Leitura!
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?Não precisa usar o tempo todo, mas caso se sintam inseguros, melhor colocar!?. O aviso fazia referência à utilização de coletes salva-vidas e vinha de um membro da tripulação de uma das lanchas da CL Transportes, quando iniciava, na tarde da última sexta-feira (22/9), uma viagem de Mar Grande, em Vera Cruz, para Salvador.
A advertência, embora não seja uma medida nova de segurança, aparentemente, vem sendo intensificada, em algumas das inúmeras travessias que se sucedem ao longo do dia. A nossa reportagem não registrou o procedimento, quando partiu da capital para a Ilha, o que sugere ser uma iniciativa pouco oficializada.
A orientação foi parte de algumas instruções passadas aos passageiros que, naquele momento, estavam a bordo da Cavalo Marinho III. O nome da embarcação parecia ser um motivo a mais para manter viva uma triste lembrança e deixar em estado de alerta aqueles que dependem da utilização do serviço.
O percurso mal havia iniciado e um casal puxou dois coletes salva-vidas, já no primeiro balanço do mar. A manifestação arrancou risos nervosos dos demais passageiros. Os dois, porém, seguiram à risca as orientações dadas pelo funcionário da Associação dos Transportadores Marítimos da Bahia (Astramab).
Volta e meia, tripulantes circulavam pela embarcação para se certificarem de que todos estavam em condição de concluir bem a o percurso. Desde aquele 24 de agosto, não há uma viagem em que pelo menos um passageiro não mostre no semblante a presença da lembrança do desastre que enlutou a Bahia. Porém, em um mês, pouco se fez pela segurança.
A identificação das vítimas foi um dos desafios enfrentados pelos órgãos responsáveis nas buscas por sobreviventes do terrível naufrágio. Mesmo assim, até hoje, não há qualquer tipo de controle ou registro de quem está a bordo.
A operacionalização do transporte marítimo realizado pelas lanchas, falha também na orientação específica para a condução de crianças de colo e passageiros, principalmente turistas, com grande volume de bagagens.
As especulações de que o mau tempo e a desestabilização tenham provocado o acidente, parecem ser motivos que encorajam as pessoas a continuarem a fazer a travessia em condições favoráveis. Para Rosane Costa, moradora de Salvador e cozinheira de um restaurante localizado na Ilha, apesar da carência por melhorias, é possível se sentir segura.
?Não vejo como culpa de nenhum desses funcionários daqui, até porque a vida deles também está em jogo. Claro que dá para melhorar muita coisa?, ressaltou.
Outra passageira, Edjane Souza, agradece por não precisar pegar a lancha todos os dias. ?Eu não confio, porque são tantas irregularidades. Se você parar para observar, vai ver que os órgãos que deviam estar cuidando disso, na verdade estão contando com o esquecimento das pessoas?, desabafou.
Mãe de Gabriel, de apenas 10 meses, Juliene Almeida viajava com o filho. Ela disse que faz a travessia rezando e lembra do naufrágio sempre que precisa pegar a lancha para ir à Salvador. ?A gente tem que ir, né? Sempre fico aqui pedindo a Deus para que nada nos aconteça. Não tem como não lembrar [do naufrágio], marcou demais?, completou.
Na chegada ao terminal náutico da capital baiana, um dos condutores da Cavalo Marinho III, Gilberto Santos, relatou que a tripulação ?faz o que pode?, mas não tem como controlar a insegurança das pessoas.
?O que mudou nesses trinta dias foi nossa atenção para as coisas, né? Mesmo sabendo que eu tenho competência para conduzir a lancha, agora tudo passa a ser detalhe importante. A associação está mais preocupada, mas não depende só da gente mudar tudo?, explicou, enquanto observava, aliviado, o desembarque dos passageiros.
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FISCALIZAÇÃO E SEGURANÇA (QUEM GARANTE?)
Após a tragédia do dia 24 de agosto, ficou a pergunta: o que as empresas, associações e órgãos reguladores têm feito para melhorar os padrões de segurança e de fiscalização das embarcações que diariamente cruzam a Baía de Todos os Santos?
O presidente da Astramab, Jacinto Chagas, preferiu deixar a resposta para os proprietários de embarcações. Procurado pelo Aratu Online, ele se limitou a dizer que a associação não se responsabiliza diretamente pelo rigor nos procedimentos de segurança das lanchas.
Ao todo, a Astramab compreende 13 embarcações com suas devidas tripulações. Sete deles são administrados pela Vera Cruz Transporte Marítimo, enquanto seis ficam por conta da CL, dona da Cavalo Marinho I.
À nossa reportagem, a CL, por meio de sua assessoria, deixou claro que cumpre com ?todas as determinações? da Capitania dos Portos da Bahia, coisa que vinha fazendo desde antes do naufrágio. Depois do trágico episódio, nada mudou. ?Não houve nenhum pedido oficial de mudança de procedimentos. Não podemos fazer nada sem alguma determinação?, informou a empresa.
A Capitania dos Portos da Bahia e a Agerba são responsáveis pela orientação nos procedimentos de segurança das embarcações. A agência reguladora informou ao Aratu Online que dispõe de nove fiscais, atuando no sistema ferry boat e no sistema de lanchas.
A Agerba disse que assume a tarefa de fiscalizar o funcionamento dos serviços do terminal, estabelece tarifas e fiscaliza o cumprimento de horário das embarcações. O órgão estadual informou, ainda, que para haver qualquer mudança nos padrões de segurança da travessia, espera a finalização da investigação realizada pela Marinha, para após o resultado seguir com os protocolos estabelecidos pela autoridade marítima.
De janeiro a agosto de 2017, a Capitania dos Portos realizou 5.847 inspeções em embarcações de transporte de passageiros na Baía de Todos os Santos. Nessas ações, os inspetores abordam as embarcações atracadas ou no mar e verificam a existência de coletes, sinalizadores, rádio, boias, além de itens como a conformidade documental, tripulação e lotação.
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Não houve mudança na fiscalização das embarcações após o naufrágio da Cavalo Marinho I. De acordo com uma nota enviada ao Aratu Online, a instância da Marinha deixa claro que ?o trabalho de fiscalização do tráfego aquaviário vem sendo executado de acordo com o previsto para a época do ano?.
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*Publicada originalmente às 6h (25/9)