SUPERAÇÃO: A incrível história de um jovem escritor, que sofre de uma grave deficiência… Mas aposto que você nem vai lembrar desse “que”
SUPERAÇÃO: A incrível história de um jovem escritor, que sofre de uma grave deficiência… Mas aposto que você nem vai lembrar desse “que”
Essa é uma história de superação, vivência e sobrevivência de um herói demasiadamente humano.
O que, efetivamente, muda em nossa vida no dia do nosso aniversário? Você provavelmente vai dizer exatamente o que maioria das pessoas responderia: nada.
Não muda nada.
Isso era o que também achava o escritor e psicólogo Levi Wenceslau, há 10 anos, quando tinha apenas 23. Parecia até uma profecia de um calvário e ao mesmo tempo a ressignificação de sua vida.
Dois de maio de 2006. O dia em que Levi imergiu das águas do riacho abaixo da ponte na BR-101, no trecho Recife ? João Pessoa, como um rito de passagem. O carro em que estava com mais cinco amigos capotou numa ponte da estrada ao colidir com um cavalo morto na pista.
No ano de 2006, a morte cruzou com a vida e, por ironia do destino, fez Levi renascer na mesma data e quase no mesmo horário em que ele nasceu: 2 de maio de 1983. Como se não bastasse tamanha casualidade, Levi ainda carregava no colo, no banco de trás do carro, um bolo de aniversário no momento do acidente.
Uma data e dois motivos para celebrar.
?Logo que o carro capotou e eu cai no riacho, eu senti que meu corpo desligou do pescoço pra baixo?, relatou. Uma lesão na medula, na altura da coluna cervical, deixou Levi tetraplégico ? paralisia dos quatro membros do pescoço pra baixo.
Hoje, após dez anos do fatídico dia, Levi luta para levar uma vida da forma mais leve possível aos seus 33 anos de idade. Ele usa uma cadeira de rodas motorizada, mora em um apartamento ?sozinho? (conta com a ajuda de três cuidadoras que se revezam e nunca o deixam desacompanhado), escreveu o seu primeiro livro em 2013 e se formou, em 2016, na faculdade de psicologia.
?Apesar de eu depender de alguém para fazer praticamente tudo, eu aprendi a ter mais autonomia e independência. Olhando para mim, eu constato que, apesar de tudo, existe vida produtiva e saudável sob uma cadeira de rodas?, afirmou.
FAMÍLIA E RELIGIOSIDADE
Nascido no Rio de Janeiro, Levi cresceu na Paraíba e hoje mora na Bahia. Ele tem dez irmãos, sendo sete do mesmo pai e da mesma mãe. Os pais, que morreram poucos antes do acidente, eram evangélicos. Levi manteve a tradição da religiosidade da família. No entanto, enveredou para o espiritismo.
Desde jovem ele visita o Centro Espírita União do Vegetal, o qual frequenta até hoje. ?No dia do acidente, inclusive, eu voltava de uma festa religiosa da União do Vegetal. Eu continuo sendo membro da instituição porque lá eu encontro cada vez mais respostas para os meus questionamentos, aprendo a viver em comunidade, a ter disciplina e a manter uma rotina?, afirmou.
?É bom ter um norte, ter algo para seguir e acreditar. Um amigo meu costuma dizer que se Deus não existisse o homem iria inventá-lo?, completou.
Os gastos com medicamentos, médicos, exames e instrumentos elevam o custo de vida do escritor, que apesar de ser aposentado pelo INSS, recebe ajuda financeira da família. A venda dos livros e as palestras também lhe rendem um bom dinheiro, segundo Levi. ?Meu custo de vida hoje gira em torno de sete mil reais. Mas graças a Deus eu estou conseguindo tirar um dinheirinho com a divulgação e venda do meu livro?, afirmou.
LIVRO
O extravagante título do livro, denominado de Cadeira Elétrica, já deixa pistas da personalidade do jovem escritor. Sarcástico, irônico e bem resolvido com a vida e com a sua condição, Levi se expressa de forma eloquente e dinâmica sobre as perspectivas e o que enfrenta um deficiente físico.
Contrário aos eufemismos, como o termo ?portador de necessidades especiais?, Levi faz duras críticas às principais dificuldades que um tetraplégico enfrenta, como a falta de preparo e humanização nos hospitais públicos, acessibilidade e preconceito.
O livro é uma autobiografia que, apesar de começar com o fato mórbido do acidente, o autor dá um tom leve e até cômico a história. ?Eu procuro mostrar, através do que aconteceu, que a gente tem uma incrível capacidade de se adaptar até mesmo as situações mais extremas que acontecem. A gente acha que não dá, mas resiste e sobrevive?, afirmou Levi.
Levi confessa que nem gostava de ler, mas o ócio lhe obrigou a isso. ?Comecei a ler muito e tomei gosto. Depois resolvi escrever uma espécie de diário sobre o meu dia, até que minha irmã me deu a ideia do livro?, explicou.
Os amigos de Levi já o conhecem pela sua capacidade de contar situações engraçadas que enfrenta com as gafes cometidas pelas pessoas.
Veja relato do autor sobre algumas gafes:
Totalmente adaptado, foi o próprio Levi quem escreveu o livro. Ele conseguiu fazer um “armengue”, colocando um lápis com uma borracha arredondada na ponta do imobilizador que usa no braço esquerdo. Assim, ele consegue apertar as teclas do notebook e até digitar no tablet quando utiliza o aplicativo de mensagens WhatsApp.
Veja no vídeo abaixo:
Quando questionado pela equipe de reportagem do Aratu Online se em algum momento após a acidente ele teria pensado em se matar, Levi usou e abusou do seu senso aguçado de humor.
?Até para um tetraplégico é complicado se matar. Como vou fazer isso se não mexo as pernas e os braços??, indagou.
Levi Wenceslau é a prova viva de que a vida nos prega peças imprevisíveis, mas que podemos ser forte o suficiente pra reaprender a viver e a ser feliz.
?Não vou dizer que estou totalmente adaptado porque viver com a deficiência nunca vai ser uma maravilha em lugar nenhum do mundo. Mas eu penso que o pior já passou. É possível ter uma vida saudável, produtiva e fazer o que eu quero”, diz.