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ESPECIAL ‘DOZE’: O argumento da legítima defesa e o discurso que o policial “está lá para limpar o lixo”

ESPECIAL ‘DOZE’: O argumento da legítima defesa e o discurso que o policial “está lá para limpar o lixo”

Por Jean Mendes

ESPECIAL ‘DOZE’: O argumento da legítima defesa e o discurso que o policial “está lá para limpar o lixo”Vista de uma das ruas da Vila Moisés - André Uzêda / Aratu Online

O Aratu Online publica nesta quarta-feira (17/2) a terceira parte da série especial ?Doze?.


As reportagens tentam recontar a história do Cabula e dos jovens que morreram no dia 6 de fevereiro de 2015, após suposto confronto com a Polícia Militar.  O nome ?Doze? possui duplo significado: 12 foi o número de mortos na ação policial; como também representa o número de meses (1 ano) em luto pela morte das vítimas.


As duas primeiras reportagens você pode ler aqui:


PRIMEIRA PARTE:  ESPECIAL ?DOZE?: Os medos, traumas e origem da Vila Moisés, o palco da tragédia em Salvador

SEGUNDA PARTE: ESPECIAL ?DOZE?: O canto do Gallo, o homem que tenta mudar o roteiro final dos julgamentos no atentado da Vila Moisés

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Nesta terceira reportagem especial será abordado o discurso da polícia sobre o atentado na figura do Capitão Tadeu, ex-deputado estadual que tem como bandeira histórica a defesa da corporação. O ex-parlamentar acredita que a polícia agiu em legítima defesa e que o julgamento da Justiça — que absolveu os militares — foi correto. Ele ainda vai além e diz que a função do policial é limpar o “lixo” que a família e o estado não educam.


Boa Leitura!


***


Sem as formalidades que a linha militar tradicionalmente exige — ele dispensa o uso da farda, por exemplo — encontro Antônio Tadeu Nascimento Fernandes no estacionamento de um shopping em Salvador. Ele está bem à vontade, de chinelos e bermuda. Capitão Tadeu, como ficou conhecido em suas carreiras na Polícia Militar e política, nunca escondeu sua opinião sobre a morte dos 12 jovens na Vila Moisés, no dia 6 de fevereiro de 2015.


Aquela data marcou a sociedade baiana e a vida de muita gente — como temos contado nesta série de reportagens. O Capitão Tadeu não foge à regra. Ele foi uma voz da corporação em meio aos bombardeios contra os militares envolvidos no caso.


A tese que nosso personagem sustenta desde aquela data ainda permanece a mesma um ano após a suposta troca de tiros. ?A minha opinião, que eu disse no momento e continuo dizendo agora, é que tinha de haver uma investigação isenta e quem daria a palavra final era um juiz. Quem não estava no momento, ou como vítima, ou como testemunha, in loco, testemunha visual, ou os próprios policiais, não pode emitir um juízo de valor, não pode dar uma opinião, por que não estava presente?, sustenta.


aratu online especial doze

Capitão Tadeu durante entrevista ao Aratu Online


A defesa dos policiais sempre foi uma bandeira recorrente no mandato do agora ex-deputado estadual. Sua carreira política começou em 1996, quando foi eleito pela primeira vez vereador de Salvador. A passagem pela Câmara Municipal serviu de trampolim para voos mais altos e, em 2003, assumiu pela primeira vez um assento na Assembleia Legislativa da Bahia.


Durante as duas últimas greves da polícia na Bahia, em 2012 e 2014, Capitão Tadeu se prontificou a ser porta-voz dos militares e intermediar uma negociação salarial com o governo.


Apoiado pelos PMs, conquistou uma votação expressiva nas última eleição de 2014. O número, porém, foi insuficiente para lhe reeleger. Foram 54.172 votos. Foi o 52º mais votado de um total de 63 vagas. Foi derrubado pelo coeficiente do seu partido, o PSB. Hoje aguarda uma vaga na suplência.


CRÍTICAS A DAVID GALLO


Sem papas na língua, Capitão Tadeu conta que desaprova a postura de Davi Gallo — o promotor do Ministério Público que sustenta a tese de execução sumária no “Caso Cabula”. ?Ele [Gallo] não acompanhou o inquérito, foi negligente na função de promotor. Ele tinha obrigação de acompanhar, mas preferiu ficar nas mídias, ficar na imprensa falando…?, dispara.


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Assembleia durante greve da Polícia Militar na Bahia, em 2014. Foto: Portal UOL


?Então, isso eu condenei nele, a irresponsabilidade em fazer críticas, fazer acusações e não acompanhar o inquérito. Eu também não acompanhei o inquérito pois não era minha obrigação e nem poderia legalmente. O promotor David Gallo tinha obrigação, foi convidado e não acompanhou. Então, ele não podia ter falado?, completa Tadeu.


JUSTIÇA


Em primeira instância, a Justiça decidiu que os PMs envolvidos no ?Caso Cabula? são inocentes. O Capitão Tadeu não comemora publicamente o parecer e orienta àqueles que não concordaram com a sentença. ?A juíza tomou a decisão, arquivando o processo, o que significa absolver os policiais. Quem acha que a juíza agiu errado tem a obrigação de recorrer. Recorra para que o Tribunal de Justiça tome uma decisão. O que eu não concordo é com pré-julgamento, condenar os policiais sem conhecer o que aconteceu. Da mesma forma que as pessoas que saíram em defesa sem saber o que aconteceu, também achei que era leviano. Então acho que o mais sensato era exigir uma investigação isenta?, comenta ele.



Questionado sobre sua opinião a respeito da legalidade da ação, Capitão Tadeu é cauteloso e, novamente, cita a decisão processual. ?A juíza diz que agiu dentro da lei, o inquérito diz que agiu dentro da lei, o Ministério Público diz que foi fora da lei. E a Justiça deu a palavra. Entre a palavra do Ministério Público e da polícia, a Justiça deu a palavra que os policiais agiram dentro da lei, então tenho que acreditar na palavra da Justiça?.


“O LIXO DA SOCIEDADE”


Pergunto ao entrevistado se ele já viu casos parecidos em sua carreira militar. A resposta vem de forma surpreendente. ?Já, muitos casos. A função policial é estar nas ruas lidando com o lixo da sociedade. Aquilo que a família não educou, que o Estado não educou, que o Estado não deu cidadania vira lixo da sociedade. Quem esta lá para limpar o lixo é o policial. Isso sempre ocorreu. O que nós queremos é que a polícia aja dentro da lei. Quando a polícia age dentro da lei eu defendo, quando a polícia age fora da lei eu não defendo. A lei deve ser respeitada?, argumenta Tadeu.


DESPEDIDA E…LEMBRANÇA


Depois de quase 30 minutos de entrevista, nossa conversa vai chegando ao fim. Nas considerações finais, como posso assim dizer, o Capitão Tadeu não perde a oportunidade de lembrar novamente o promotor Gallo.


?Repito, quem fez todo esse barulho foi o promotor David Gallo, mas ele como promotor tinha obrigação de acompanhar o inquérito. Ele não acompanhou o inquérito. Ele não acompanhou a oitiva das pessoas, ele não acompanhou a reconstituição, as perícias, e depois foi ficar na imprensa fazendo barulho. Acho que o papel do Ministério Público tem que ser mais responsável. Eu sou admirador do Ministério Público, agora, não gosto de promotor que gosta de aparecer mentindo para a sociedade?.


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Viatura da Polícia Militar da Bahia


Com essas nada amigáveis palavras Capitão Tadeu dá seu depoimento e, com certeza, reforça sua condição de mais um personagem intrinsecamente envolvido no ?Caso Cabula?.


Importante: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Aratu On.

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