QUE MANÉ GAME OF THRONES: O Dois de Julho é a verdadeira história de magia, heroísmo e bravura
QUE MANÉ GAME OF THRONES: O Dois de Julho é a verdadeira história de magia, heroísmo e bravura
Uma história épica, repleta de personagens marcantes, com doses de magia, heroísmo e bravura. Todos estes elementos poderiam fazer supor uma citação à série norte-americana Game of Thrones, sucesso mundial em sua sexta temporada de exibição.
Longe da quimera que envolve o fantasioso roteiro temos, pertinho de nós, uma história REAL com todos estes ingredientes. Nossa história teve seu episódio derradeiro em Dois de Julho de 1823, um ano após o grito do Ipiranga, no início do processo de independência do Brasil, dado pelo então Imperador Dom Pedro I.
Diferente do que aprendemos na escola, os portugueses não aceitaram a soberania brasileira assim de mão beijada. A Bahia foi um dos estados que foi à guerra pela consolidação da autonomia do país recém constituído. Negros escravos e libertos, caboclos e profissionais liberais empunharam armas em nome de um ideal.
Na famosa batalha de Pirajá, que decretou a vitória dos baianos, houve de tudo. Bravura, teatralidade, abnegação e improviso. Houve espaço também para o sobrenatural, transmutado através da força dos orixás, conduzindo os guerreiros baianos inteiros ao fim do conflito.
Se ligue! Depois que você conhecer essa história não vai querer MAIS saber de Game of Thrones. A história da independência da Bahia é muito, muito melhor.
Até porque, ora bem, é nossa.
1- A fábula da sorte do Corneteiro Lopes
A batalha já durava mais de quatro horas. As tropas portuguesas estavam em vantagem numérica e bem próximo de dominar o exército baiano. Mais algumas horas e fechariam o cerco sobre o movimento rebelde.
Prevendo a derrota, o Comandante Barros Falcão ordenou o toque de recolher aos soldados e passou o recado para o corneteiro Lopes, responsável por avisar a infantaria com os toque da sua corneta. Nesse momento não se sabe exatamente o que ocorreu.
Se por engano ou por estratégia, o fato é que, ao invés do toque de recuar, este curioso personagem deu o sinal para a cavalaria avançar. O exército baiano prontamente se dispôs em posição de ataque e, surpreendendo os portugueses, venceu a batalha.
2- A guerreira que se vestiu de homem para lutar
Esta é a história de uma verdadeira heroína nacional. Quando tinha apenas dez anos, Maria Quitéria ficou órfã de mãe e passou a cuidar do sítio dos pai, além dos dois irmãos mais novos.
Quando a Guerra pela Independência eclodiu, o Império recrutou soltados e Maria Quitéria se escalou para participar. Seu pai a proibiu mas, para não perder as batalhas, cortou o cabelo e usou trajes masculinos, assumindo a identidade de Soldado Medeiros.
Maria Quitéria passou a integrar o Batalhão dos Voluntários do Príncipe, também chamado de Batalhão dos Periquitos. Durante as batalhas teve sua identidade descoberta, no entanto, o major Silva e Castro não quis abrir mão da sua bravura e coragem e impediu que deixasse o batalhão.
Depois da vitória já consumada, nossa heroína recebeu das mãos do próprio Imperador a comenda “Cavaleiro da Ordem Imperial do Cruzeiro” — a mais alta do Império Brasileiro.
3 – A mulher que se sacrificou pela fé
A abadessa Joana Angélica, que hoje dá nome a uma das famosas ruas de Salvador, se sacrificou pelo seu povo. Quando os portugueses ocuparam a cidade, ainda em 1822, eles quiseram entrar no Convento da Lapa — que ainda existe no mesmo local, próximo à Estação da Lapa — à procura de soldados rebeldes.
Joana Angélica abriu os braços e tentou impedir a invasão.
“Para trás, bandidos. Respeitem a casa de Deus. Recuai, só penetrareis nesta casa passando por sobre o meu cadáver”, disse a abadessa, pouco antes de ser assassinada pelas baionetas inimigas.
4 – O mercenário que virou herói da pátria
Pedro Labatut, que mais tarde se tornou o General Labatut, foi um francês contratado a peso de ouro para comandar as tropas brasileiras na Guerra da Independência da Bahia. Ele rivalizou com o conceituado general português Madeira de Melo, famoso por ser um exímio estrategista de guerra.
Mesmo atuando por dinheiro, Labatut provou todo seu heroísmo mostrando competência militar e amor ao país. Ele venceu a Batalha de Pirajá derrotando Madeira de Melo e ajudando na expulsão definitiva dos portugueses.
O amor pelo Brasil foi tamanho que nunca mais voltou à França. Tanto que veio a morrer em Salvador em 1849, nos bairro dos Barris — em homenagem, a rua onde faleceu ganhou seu nome e hoje o local abriga a Biblioteca Central da cidade.
5 – Heroína do povo
Maria Felipa foi uma guerreira negra poderosa — hoje seria facilmente chamada de “empoderada”. Morando em Itaparica, organizou os populares da Ilha para formar uma trincheira com o intuito de destruir as embarcações portuguesas que, durante a Guerra, aportavam na Baía de Todos os Santos.
Na ausência de armas, Maria Felipa improvisou com peixeiras, espetos, cipó e galhos de cansanção para surrar os invasores e depois atear fogo nas embarcações. Seu exército particular era formado por cerca de 40 nativos — a maioria mulheres, casadas com soldados que estavam no front de batalha.
6 – O vilão
Como contado acima, Madeira de Melo era o grande vilão dos brasileiros à época. Astuto, estrategista renomado, lutou contra o exército brasileiro e começou arrasando as tropas adversárias, chegando, inclusive, a promover um cerco sobre a cidade de Salvador.
Parecia que venceria a guerra, mas, rivalizando com General Labatut, foi sofrendo derrotas sucessivas até ver seus homens isolados, sem receber alimentos e/ou munições.
Na derradeira Batalha de Pirajá, Madeira de Melo foi ferido e seus guerreiros, finalmente, expulsos.
7 – O Caboclo e a Cabocla
A Caboclo e a Cabocla são a representação do povo baiano que pegou em armas e morreu para lutar pela independência do Brasil. São também o arquétipo dos orixás protetores que serviram de escudo para que os portugueses não vencessem a guerra.
Eles estavam presentes em cada momento. A mais pura magia.
Trouxeram a inspiração necessária para que Corneteiro Lopes soprasse com maestria a corneta sinalizando “avançar cavalaria”. Deram a coragem suficiente a Maria Quitéria se transmutar em soldado e abdicar do conforto para ir à Guerra. Deram iluminação a Joana Angélica para abrir os braços e impedir o avanço dos lusos no Convento da Lapa. Concederam a Labatut uma razão, além do dinheiro, para qual guerrear. Formaram o caráter e a bravura de Maria Felipa para usar paus, espetos e peixeira para destruir os portugueses.
Eles estavam lá. O tempo todo, garantindo que nascesse o sol, a Dois de Julho.