PARADA PARA O COCHILO: Ambulantes dormem 2 horas por dia, mas não abandonam o circuito da folia
PARADA PARA O COCHILO: Ambulantes dormem 2 horas por dia, mas não abandonam o circuito da folia
Segunda feira de Carnaval, em Salvador. O sol nasceu há mais ou menos duas horas. Um pouco mais cedo, os trios elétricos e as batucadas haviam se silenciado. Porém, uma turma insistente continua ocupando as margens dos circuitos da folia e garante que só arreda pé das ruas na Quarta-Feira de Cinzas. São eles ? vendedores ambulantes ? incansáveis guerreiros da subsistência e personagens indispensáveis na Festa de Momo.
No campo Grande, por volta das 7h, nossa reportagem flagrou alguns desses trabalhadores levantando de camas improvisadas ao lado de suas mercadorias, se preparando para encarar a batalha de um novo dia. Eles estão normalmente em grupos e, na maioria das vezes, entre familiares.
O cochilo é sempre muito rápido. Em média, são duas horas de ?descanso?. Alguns levam barracas de camping para o circuito, outros, como o pedreiro Edson Santos Lima, de 28 anos, se viram de forma mais rudimentar e utilizam papelões como colchões sobre as calçadas. Ele é de Feira de Santana e desde a abertura do Carnaval está na capital baiana vendendo cervejas.
?Deitei aqui era umas 5 horas da manhã e já tô de pé. É só mesmo para o corpo relaxar um pouco?. Edson tem dois filhos e está com mais ou menos 25 pessoas que vieram do interior do estado. Entre eles, a dona de casa Cristiane Ramos, 40 anos, mãe de três filhos e atualmente desempregada. ?Eu não sou dona dos produtos, Estou vendendo para ajudar uma amiga e ganhar também, é claro, um trocadinho?, relatou enquanto escovava os dentes.
A intenção é sempre ganhar um dinheiro para ajudar nas despesas das famílias, mas os ambulantes, sem estrutura para se manterem nas ruas, acabam usando parte do lucro, que segundo eles não é alto, para garantir a alimentação e uma condição básica de higiene. Um banho que pode ser tomado em algumas residências que disponibilizam o ambiente, custa em média R$ 3,00.
?A gente paga R$ 12,00 em uma quentinha e tem que dividir para duas pessoas, senão o prejuízo é grande?, disse Juliana Araújo Silva, 28 anos. Dificuldade semelhante foi apresentada por Janice Lima da Anunciação, 39 anos. A moradora do Pero Vaz tem 6 filhos e duas netas e está dormindo na rua há uma semana. ?Pago R$ 10,00 numa comida que cheira a azedo?, reclamou.
Apesar de toda dificuldade, a alegria também se faz presente entre os ambulantes. Enquanto tomavam um mingau ? a primeira e, talvez uma das poucas refeições do dia ? alguns deles brincavam e sorriam. ?Ô meu velho, que jeito? Se ficar triste é pior. Fazer o quê??, disse Sérgio Miranda, 31 anos.
Animado também estava Luís Carlos de 18 anos. Uma coxinha de frango e um copo de suco de acerola fizeram parte do seu cardápio matinal. ?Meu ponto é bem localizado e, graças a Deus está dando para vender direitinho?, comemorou o jovem ?estabelecido? na frente do Teatro Castro Alves, bem em frente aos camarotes oficiais da Festa, no Circuito Osmar.
CONTRAPONTO
Na manhã de hoje (08/2), a titular da Secretaria Municipal de Ordem Pública (Semop), Rosemma Maluf, disse em entrevista coletiva que a Prefeitura disponibilizou 3 contêineres, cada um com sete posições de chuveiros, para atender aos ambulantes.
Os equipamentos, no entanto, estão em números bastante insuficientes, considerando que a própria secretária revelou que, este ano, 16 mil pessoas estão envolvidas no comércio informal. Foram liberadas 4 mil licenças e a estimativa é de que 4 pessoas compõem um grupo de trabalho para cada permissão.
Na oportunidade, foi lembrado que é proibido a utilização de barracas e puxadinhos de lona para o abrigo dos vendedores em serviço no Carnaval. Rosemma disse, ainda, que há um Centro de Convivência criado para acolher os filhos dos ambulantes, já que não é permitida a presença de crianças nesses locais de trabalho. Segundo ela, psicólogos e outros profissionais especializados auxiliam no acolhimento.
“Não é atribuição dos fiscais da Semop retirar as crianças, nesta situação, dos circuitos, mas a gente sinaliza as ocorrências para o Juizado de Menor e o Conselho Tutelar, daí as providências são tomadas”, informou.