
Ancestralidade e natureza: turismo afro-indígena promete movimentar economia baiana no pós-Covid
Atualizado em 29 de jun. de 2021 10h04
Publicado em 29 de jun. de 2021 10h00
Atualizado em 29 de jun. de 2021 10h04
Publicado em 29 de jun. de 2021 10h00
Crédito da foto: Elói Correa/GovBa
O setor turístico está de olho em um segmento que deve crescer com o avanço da vacinação contra a Covid-19 e a reabertura dos serviços nas cidades: o turismo étnico, afro e indígena, que está incluído dentro do guarda-chuva do ‘turismo de experiência’.
Esse nicho deve movimentar aldeias indígenas do Sul, Extremo Sul e Baixo Sul da Bahia na próxima temporada, entre os meses de agosto e dezembro, quando haverá o aumento da curva da retomada econômica após tanto tempo de medidas sanitárias anti-Covid.
Chapada Diamantina e Recôncavo Baiano também são localidades polos desse setor, por causa das comunidades quilombolas, alvo de grande busca pelos turistas que estão voltados mais para a natureza, por uma série de fatores que tenho ouvido de gente da área.
Especialistas do trade turístico apontam que esse segmento sempre foi potencial dentro do setor de serviços, mas a pandemia catapultou as procuras, já que as pessoas passaram a buscar experiências coletivas e integradas à natureza, ao fazer manual, às tradições.
E em natureza, coletividade, fazer manual e tradições, não tem para ninguém... a Bahia lidera com folga. Tem a Costa do Descobrimento, alcunha que os indígenas não simpatizam por motivos históricos óbvios, e as principais comunidades negras tradicionais do Brasil.
“Antes da pandemia, as pessoas estavam muito individualizadas, então já havia gente buscando viver em comunidades para fugir disso. Após a pandemia, essa necessidade aumentou mais ainda, por causa dos impactos do processo de isolamento”, explica Tâmara Azevedo, consultora em Gestão de Políticas Públicas de Turismo e diretora-executiva da agência Bahia Turismo e Arte, uma das empresas (uma das únicas) que estão apostando nesse ‘boom’ e oferecem pacotes diversos para esse tipo de turismo.
As pesquisas do setor indicam tanto potencial a ponto de municípios dessas regiões estarem contratando consultorias para aprender como explorar o segmento. Já há movimentações nesse sentido em Porto Seguro e Cabrália (no Sul do mapa da Bahia), Cachoeira e Santo Amaro (vizinhas do Recôncavo) e na badalada Itacaré.
Esse sentimento, de acordo com a consultora, já era detectado antes do isolamento social em uma faixa específica de turistas internacionais, principalmente de pesquisadores e acadêmicos. Mas agora ampliou, como ela disse, por causa da nova dinâmica pandêmica.
O foco desses visitantes é entrar na rotina dessas comunidades, como um “retorno à ancestralidade, aos conhecimentos ancestrais”. E nesse desejo entra também busca por cura, bem-estar espiritual, conexão com a natureza, além da interação com produção artesanal, produção de farinha, dendê in natura, plantas comestíveis não tradicionais e seus milagres, grupos de samba, grupos de capoeira… As possibilidades são infinitas.
Atualmente, o Parque Nacional Monte Pascoal, onde fica a Aldeia Pé do Monte, em Porto Seguro, já recebe mil visitantes por mês. Já a Aldeia Reserva da Jaqueira, no mesmo município marco do descobrimento, recebe diariamente 150 clientes somente da CVC, a agência mais conhecida do setor turístico localmente. Todo esse público é de gente que quer dançar o toré (espécie de ‘xirê’ indígena), jogar arco e flecha, cabo de guerra e outros jogos tradicionais. Ou se conectar com a história quilombola.
Em Itacaré, onde o ex-secretário de Turismo do Governo do Estado da Bahia, José Alves, comanda a gestão do setor há menos de um mês, esse nicho será um dos focos, segundo o próprio antecipou para a coluna do Aratu ON.
Será elaborado, inclusive, um planejamento transversal do turismo, com o objetivo de orientar essa guinada. “Uma das minhas missões é a valorização da cultura, no que diz respeito às pessoas entenderem a cidade, como ela foi criada, suas tradições”, explicou Alves, é ex-diretor da Associação Brasileira dos Agentes de Viagem.
A partir da estrada que tem, ele está organizando atividades para o treinamento dos guias turísticos e demais profissionais do município. Alves destaca que esse ‘boom’ do turismo étcnico se dá porque o turismo para natureza vai ser potencializado durante essa retomada econômica, já que estar ao ar livre também é um atenuador da transmissão do coronavírus.
Além de tudo, essa é uma versão sustentável de viagem. As comunidades não precisam mudar seu modo de viver para receber o visitante, porque a atividade que a comunidade já realiza é o interesse focal deles. Logo, problemas como descaracterização das tradições, folclorização e outros, comuns na interação entre o estrangeiro e o nativo, são evitados.
Um resumo em números?
Esse movimento vai levar as cidades envolvidas, que estavam tendo menos 40% de ocupação durante as restrições, para um patamar de 70% ou até 80% de movimentação.
Ainda não há dados exatos de quanto movimenta especificamente o turismo étnico afro e indígena. Mas o turismo movimenta 59 segmentos da economia, o que nos diz muito sobre o quanto essa “novidade” pode render para a Bahia no campo objetivo. Do lado simbólico, nos ajuda, no mínimo, a reafirmar a identidade nacional de um país afro-indígena.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.
Yuri Silva é Coordenador de Direitos Humanos do Instituto para Reforma das Relações entre Estado e Empresa (IREE). Graduado em Jornalismo pelo Centro Universitário Jorge Amado, também é coordenador nacional do Coletivo de Entidades Negras (CEN), editor-chefe do portal Mídia 4P, da Carta Capital, e consultor na área de comunicação, política e eleições. Colaborou com veículos como o jornal Estadão, o site The Intercept Brasila revista Piauí e o jornal A Tarde, de Salvador. Especializou-se na cobertura dos poderes Executivo e Legislativo e em pautas relacionadas à questão racial na sociedade de forma geral e na política.
Instagram: @yuurisilva