O que pode estar por trás de uma candidíase recorrente?
Crédito: Ilustrativa/Pexels
O tema de hoje é sobre uma patologia que não é rara, pelo contrário, é muito comum no consultório ginecológico e, quando acontece com a mulher, torna a vida dela social e sexual muito complicadas. É a candidíase recorrente. Vou explicar tudo sobre ela.
O que é a candidíase?
É uma inflamação por um fungo que vive normalmente na flora vaginal da mulher, de uma forma tranquila, sem demonstrar irritação ou trazer algum sintoma que a incomode. A gente costuma falar que é a flora comensal, que vive em harmonia na vagina da mulher. A maioria das infecções é causada pela Candida Albicans, mas em casos recorrentes, fazemos a cultura dessa infecção para identificar qual é o tipo de fungo, pois, muitas vezes, vem um fungo que não é da flora vaginal ou um fungo que é resistente ao tratamento convencional. Nesses casos, a gente precisa fazer o tratamento com um algum antifúngico específico.
Cerca de 75% das mulheres terão em algum momento da vida alguma crise de candidíase e, dessas, 9% vão manifestar a candidíase recorrente, quando a paciente tem três ou mais episódios em um único ano. Quando isso acontece, é necessário tratar de uma forma mais ativa, intensa e integral porque várias coisas estão envolvidas nesse tratamento. Trata-se de uma patologia multifatorial, onde envolve o padrão imunológico da paciente, então, vai acontecer uma mudança dessa flora vaginal, com diminuição dos lactobacilos, que são células de defesa dela.
Os fatores extra patológicos têm que ser sempre investigados: diabetes mellitus; uso de alguns remédios que diminuem naturalmente a imunidade; uso de antibióticos, que muitas vezes é o gatilho para o desenvolvimento de uma crise fúngica, em algumas mulheres especialmente; contraceptivos que atrofiam demais a mucosa ou o uso de alguns DIU’s podem também interferir na imunidade local e predisposição. Outra questão é o polimorfismo genético. Já é identificado que algumas mulheres têm geneticamente uma predisposição. E o último fator é o status inflamatório, se essa paciente está inflamada, como um todo, no seu corpo, tratar um processo inflamatório local dentro da vagina vai ficar mais difícil, então a gente tem que desinflamar essa mulher.
Os principais sintomas que essa mulher pode ter, além de três ou mais episódios por ano, são secreção vaginal espessa, parecendo leite coalhado, que pode vir associada com prurido intenso - que é a coceira, tanto internamente quanto externamente na vulva e pode se manifestar como uma reação alérgica, deixando a região genital irritada. O período pré-menstrual é um período que predispõe, pela mudança de pH e hormonal que essa paciente tem. É muito comum a paciente queixar que, quando está perto da menstruação chegar, ela desenvolve uma crise fúngica e depois da menstruação, tende a ter uma melhora.
Esse processo inflamatório dificulta, inclusive, ela ter relação sexual. É uma relação sexual dolorosa. Imagine que essa camada interna, a vagina, está toda inflamada e tem uma penetração do órgão fazendo atrito. Realmente é incomodo e o parceiro pode acabar tendo também alguma inflamação local peniana por conta dessa acidez que a crise fúngica predispõe.
Portanto, quando a paciente tem a crise fúngica recorrente, a gente tem sempre que buscar a causa. Muitas vezes não é fácil e está associada com o status psicológico dela, a um estresse muito grande, ansiedade e medo. Na pandemia, a gente viu muito o quanto as crises fúngicas recorrentes cresceram no consultório. Então, tratar a psique é muito importante e fazer a paciente identificar o que está lhe causando esse estresse que, quando ela não coloca para fora, de alguma forma vai se manifestar no corpo. Na somatologia, a gente vê isso bem claro, o corpo dela vai manifestar aquele estresse que ela está vivendo. E essa exteriorização, do ponto de vista genital, é um sinal de que a mulher tem que entender que alguma coisa ali está errada. Então, a gente investiga a psique, patologias prévias, uso de medicações que podem estar predispondo, hábitos de vida e hábitos alimentares. É preciso avaliar a mulher como um todo e tentar identificar a causa, porque, quando a gente trata somente com antifúngico simples, estamos tratando a consequência. Se a causa mantiver, a gente vai continuar tendo esse problema em outro mês, deixando a mulher predisposta a um processo inflamatório de candidíase recorrente.
Identificada a causa, a gente vai buscar tratá-la e, ao mesmo tempo, fazer o tratamento medicamentoso para a consequência. Muitas vezes são medicamentos a longo prazo, de três a seis meses de acompanhamento com uso de medicações para diminuir o microfilme do fungo e conseguir agir de uma forma mais intensa sobre aquela colônia de fungos. Usamos também artifícios tecnológicos que estão às nossas mãos hoje de forma mais fácil, como os LEDS vaginais, o laser vaginal e a ozonioterapia. Esses três como tratamentos off-label que estão à disposição e que, na nossa prática clínica, vemos uma melhora acentuada e diminuição das possibilidades do risco dela voltar a ter uma crise. Então, avaliando essa paciente como um todo, a gente faz um projeto nutricional com uma melhora da sua microbiota intestinal e vaginal, vê a saúde psíquica dessa mulher e a desinflama. Combinamos o tratamento medicamentoso local, oral e alternativo pra conseguir diminuir as possibilidades dessa recorrência.
Hoje, já temos em literatura médica, em estudo, algo que seria para o futuro. O uso de lactobacilos é uma realidade, mas não temos ainda catalogado todo os lactobacilos que seriam específicos para a flora vaginal em relação à candidíase, mas muita coisa já está adiantada neste sentido. A imunoterapia, as vacinas recombinantes protetoras contra a candidíase e, em último ponto, o transplante de microbiota vaginal saudável, que já se faz com as vaginoses e estamos em estudos para se fazer com a candidíase também.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.