Lutar por mudanças é um ato de fé no futuro
Todos nós sabemos que a infância e a adolescência são momentos da vida em que muitos aspectos da nossa visão de mundo são construídos. Nesse sentido, a experiência de viver em uma comunidade periférica nos coloca diante de inúmeros problemas crônicos, que parecem não ter solução, e cuja consequência é muito cruel: vários de nós cresceram e crescem pensando que a realidade posta é a única possível, que não existe a possibilidade de agirmos para transformá-la. Ou seja, a histórica ausência de políticas públicas em regiões como a nossa, muitas vezes, nos priva do direito a ter esperança. Trabalhando para mudar esse cenário, realizamos a segunda edição do projeto Eleições Mirins, que busca educar os nossos pequenos sobre cidadania e a importância de se interessar pelas discussões políticas.
Ao longo desses anos, percebi um aspecto muito bonito da participação política, que de algum modo se assemelha à arte: a luta por mudanças é, antes de tudo, um ato de fé depositada no futuro. Um ato que revela a nossa crença não naquilo que é, mas naquilo que pode vir a ser. Lembro, inclusive, de uma passagem do célebre Eduardo Galeano em que ele escreveu algo mais ou menos parecido: "A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar".
Ou seja, a esperança em um amanhã que pode ser melhor que o hoje é um elemento fundamental para que cada um de nós possa deixar a sua marca no mundo, para que não deixemos de caminhar. E a perversa realidade que nega esse direito às nossas crianças só terá fim quando nós, ativamente, as trazermos para o centro do processo democrático, de modo que elas aprendam sobre cidadania e política, podendo impactar positivamente as suas comunidades.
Precisamos ter em mente, ainda, que a democracia brasileira é muito recente do ponto de vista histórico. Passaram-se apenas 34 anos desde a primeira eleição direta para presidente, em 1989. Sou, portanto, da primeira geração que cresceu em um Brasil plenamente redemocratizado, e justamente por isso me faltaram referências locais de participação política. Durante a minha infância, por exemplo, eu achava que política se resumia aos candidatos que apareciam na nossa comunidade apenas em época de eleição, prometendo o mundo, e que depois sumiam.
Só pude adquirir outra visão sobre política, a visão que me permitiu lutar pelas pessoas, durante o meu ensino médio, quando participei do Parlamento Jovem Brasileiro como deputada jovem. Foi lá em Brasília, vivenciando a rotina de um parlamentar, que aprendi a importância de ocupar espaços como aquele para buscar as melhorias que a nossa comunidade tanto precisava. Aquele foi um momento de revelação, em que eu definitivamente tive a oportunidade de compreender que o futuro poderia ser diferente.
A nossa missão, agora, é garantir que outras crianças possam ter o mesmo tipo de aprendizado que eu tive quando fui para o PJB. Aqui na nossa comunidade, Campinas de Pirajá, estamos fazendo isso por meio das Eleições Mirins, iniciativa cuja segunda edição foi realizada no último sábado, 20 de maio, e terminou com a eleição da prefeita mirim Taiane e da vice-prefeita mirim Ana Carolina. Na segunda-feira, elas já tiveram a oportunidade de conhecer a Prefeitura de Salvador e conversar com o prefeito Bruno Reis. Também estiveram presentes Pablo e Gabriel, prefeito e vice-prefeito mirins que encerraram seus mandatos.
Além das meninas recém-eleitas e dos meninos em fim de mandato, as Eleições Mirins proporcionam momentos de aprendizado para todas as crianças da nossa comunidade. Elas passam por um curso de cidadania, aprendem sobre o funcionamento da democracia e como podem agir para transformar a realidade em que vivem. Me animo quando penso em como eles poderão estar no futuro, falando sobre as Eleições Mirins com o mesmo brilho nos olhos que eu tenho até hoje quando lembro da minha experiência como deputada jovem.
No fim das contas, a nossa luta é essa: pelo brilho nos olhos de cada criança e pelo direito de sonhar. E colocar as crianças no centro do processo democrático, mostrando-as que o futuro pode ser diferente, é parte fundamental disso. Para que elas nunca deixem de imaginar um futuro melhor e, consequentemente, nunca deixem de caminhar.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.