A ambígua relação entre a prática de esportes e a dor
Foto: Macris, jogadora da seleção brasileira de vôlei | reprodução/ESPN/Fox Sports
No ano de 2021 está acontecendo a Olimpíada de Tóquio, no Japão, a qual traz algumas reflexões acerca da importância da prática de esportes como elemento capaz de causar dor, mas também como elemento capaz de contribuir para o seu tratamento. Este fato é bastante interessante e representa um convite para ampliar o olhar e pesquisar um pouco mais sobre este tema.
O esporte é conceituado como uma atividade física praticada com finalidade recreativa, educativa, sociocultural, profissional ou como meio de melhorar a saúde. Independente do objetivo da sua prática, sabe-se que a dor faz parte da experiência esportiva. Para muitos atletas, sejam eles profissionais ou amadores, a dor é uma experiência cotidiana “normal” e o sucesso geralmente é alcançado apesar desta. No entanto, a dor precisa ser tratada, uma vez que pode restringir a capacidade de se concentrar no desempenho e tirar a oportunidade de competir.
Muitos atletas encerram suas carreiras esportivas em função da dor. Isto demonstra que a relação entre dor e esporte é repleta de desafios, tanto para os atletas como para os profissionais de saúde. O que se sabe é que o problema da dor no esporte tem se tornado gradualmente mais importante, não apenas devido a carga cada vez mais alta sobre os atletas em todas as disciplinas, como mostrado pelos sucessivos novos recordes mundiais, mas também pelo número crescente de atletas amadores e recreativos. Como esse grupo não está suficientemente preparado para o esforço, é muito suscetível a lesões. Apesar disto, é importante lembrar que a dor pode ter diferentes traduções, ela não representa apenas a presença de lesão. Muitas pessoas apresentam dor neste contexto, como um sinal de seu regime de treinamento e estilo de vida ou como um sinal de esforço extremo para alcançar a realização máxima.
O melhor conhecimento dos mecanismos de dor relacionados ao esporte pode ter aplicações práticas no processo de treinamento de atletas, bem como de pessoas que são fisicamente ativas durante a vida profissional e após a aposentadoria. Além disto, a compreensão de um fenômeno oposto, conhecido como analgesia induzida pelo exercício, pode ser considerado como um elemento terapêutico em pacientes já portadores de dor.
O fenômeno da analgesia induzida pelo exercício pode ser visto em todas as pessoas, mas tem sido observado com mais frequência em atletas. O primeiro a demonstrar esse fenômeno foi o médico Black, em 1979. Ele verificou que houve aumento no limiar de dor imediatamente após uma corrida de 40 minutos. Mais de quatro décadas após esse primeiro estudo, os mecanismos envolvidos ainda não estão completamente esclarecidos, embora aceite-se a ação analgésica do sistema opióide endógeno, do sistema nervoso autônomo e das vias inibitórias descendentes dos sintomas álgicos neste processo.
O exercício físico, sobretudo o aeróbico, atua como modulador do aspecto desagradável da dor em diferentes regiões do sistema nervoso central, inclusive por intermédio de estruturas corticais envolvidas com a motivação. Os neurotransmissores envolvidos com a modulação descendente inibitória da dor são os opioides endógenos, a dopamina, a noradrenalina e a serotonina. As respostas a estes neurotransmissores após a realização de exercícios e de treinamentos já foram adequadamente demonstradas. Isto reforça a idéia de que a elaboração de programas específicos direcionados aos atletas e aos pacientes portadores de dor aguda ou crônica podem impactar de forma positiva no desempenho e na evolução dos mesmos. Além disto, torna-se necessária a instituição de medidas educativos de prevenção e recorrência da dor pela atividade física, as quais devem ser direcionadas no sentido de desencadear conhecimentos, atitudes e comportamentos compatíveis com uma dinâmica social fisicamente ativa e desenvolvida no cotidiano de vida, ao longo da existência das pessoas.
*Este material não reflete, necessariamente, a opinião do Aratu On.